COMPOSITOR, ESCRITOR E OSGÁFILO
Raimundo Floriano
Fred Monteiro: talento multifacetado
Em minha idade – 80 em julho passado –, é muito difícil engatar novas amizades, motivo pelo qual esforço-me ao máximo para conservar as que amealhei em todo esse tempo, principalmente diante fato de ser eu pessoa de não fácil coexistência. Para mantê-las, faço de tudo: engulo cobras, sapos e lagartos, finjo-me de mais mouco que o natural, relevo, perdoo quando perdão não me é solicitado, na certeza de que o tempo aplainará todas as asperezas e arestas deixadas em momentos de cabeça quente ou diálogo exaltado.
Como eu falava, fazer novas amizades é para mim barreira quase intransponível. Quer dizer, era, pois isso se modificou desde o surgimento do Jornal da Besta Fubana, do qual fui colunista desde a primeira hora em que ele se transformou com site, isso há quase 9 anos.
O JBF teve o condão de lançar-me no cenário internáutico, publicando meus textos e comentários, e fazer-me conhecido numa coletividade de intelectuais que hoje representa a nata da Cultura Brasileira. Com cerca de 500 matérias semanais postadas ininterruptamente, incorporei-me, até pela assiduidade e persistência, aos homens que hoje, na Literatura Nordestina e na Música Regional, com seus textos e composições, resgatam nossas mais legítimas tradições culturais.
Dentre eles, o escritor, poeta, compositor, músico e produtor alagoano Fred Monteiro. Começamos tirando nossas dúvidas, trocando figurinhas, complementando nossos acervos e, quando menos percebemos, já estávamos com a amizade sedimentada, mais grudada que nem catarro na parede, da qual só venho lucrando, como vocês verão a seguir.
Com minha postagem de Música Militar na Internet, Fred revelou-me ser autor do Dobrado General Lima Verde, no que foi contestado na hora, pois de há muito eu sei que o autor da peça é Paulo Roberto Pacífico. Fred, do outro lado, teimou, fincou pé, e eu lhe pedi que mandasse o áudio de sua autoria. No que ele não se fez de rogado, até mesmo para esfregar-me sua verdade na cara, enviando-me o CD No Tempo dos Coretos:
O CD não só tirou minha dúvida, pois o dobrado de Paulo Roberto Pacífico é General Júlio Lima Verde, como também se me revelou um compositor nordestino de peso, até então desconhecido para mim. Depois de ouvi-lo, só me restou a manifestação de um desejo: quero mais!
E Fred satisfez esse irrefreável anseio de colecionador, enviando-me sua obra completa neste CD, Formato MP3, sob o título Memória Musical - As Músicas de Fred Monteiro:
Com 71 faixas, o disco traz-nos amostra geral dos gêneros musicais que mais apreciamos: xote, arrasta-pé, baião, frevo-canção, frevo de bloco, frevo de rua, maracatu, ciranda, marcha de la ursa, maxixe, bolero, acalanto, choro, valsa, ragtime, balada, marcha americana, dobrado e, até, uma sinfonia. Madeira de dar em doido!
Fred Monteiro, desde cedo, inseriu-se na qualidade requerida de qualquer bom colecionador juramentado: o compartilhamento. Prova disso foi sua generosidade ao presentear-me com o livro Vida de Viajante, A Saga de Luiz Gonzaga, autografado pela autora, Dominique Dreyfus, que veio, com sua magnitude, enriquecer minhas estantes literomusicais:
Ditas estantes que, no ano passado, já se achavam sobremaneira valorizadas com as excelentes crônicas de Fred, enfeixadas no livro Caçador de Lagartixas:
São lembranças de infância, vividas por um menino presepeiro e aprontador. Mas quem não o foi? No capítulo-título do livro, Caçador de Lagartixas, ele conta como as capturava: usando laços com o talo de folha de coqueiro, da qual era retirada a parte verde, sobrando apenas o caniço central, em cuja ponta afinada fazia o laço. Mas Fred não matava as osguinhas. Laçava-as somente no intuito de com elas dialogar: – Lagartixa, você é uma bobona? E ela balançava a cabeça pra baixo e pra cima, em assentimento. Depois de obter todo o currículo da prisioneira, Fred a libertava, fazendo dela uma amiga, que talvez por ali aparecesse novamente para novo bate-papo.
Fred Monteiro não está sozinho em sua osgafilia – termo que ciei para definir a amizade com lagartixas –, conforme se depreende desta nota, publicada na Revista Veja de 13.3.13, na Seção Veja Esta:
Para terminar esta merecida chaleirada, e para confirmar a versatilidade deste grande amigo virtual, apresento-lhes uma coletânea demonstradora de como ele, como compositor e intérprete, nada de braçada em todos os gêneros da Música Popular Brasileira.
Vamos ouvi-lo e degustá-lo:
FORRÓ
Aperta o Nó, rojão, canta Irah Caldeira:
Barra do Dia, xote, canta Fred Monteiro:
Mais Amar, arrasta-pé, canta Fred Monteiro:
Minha Viola, baião, canta Fred Monteiro:
FREVO
Catabi, frevo de rua, com a Orquestra de Fred Monteiro:
Bloco da Felicidade, frevo de bloco, com Coral Meus Amores:
Coração Recifense, frevo-canção, canta Claudionor Germano:
MARACATU CIRANDA E LA URSA
Axé, Zumbi!, maracatu, canta Cylene Araújo:
Ciranda do Mar da Vida, ciranda, canta Fred Monteiro:
La Ursa da Antiga, la ursa, canta Coral Urso Traquino:
RITMOS E GÊNEROS DIVERSOS
Americando, maxixe, com A Bandinha do Fred:
Amor Antigo, bolero, canta Fernando Silva:
Canção Para Ninar Diogo, acalanto, canta Tatiana Monteiro:
De Pai Pra Filho, choro, canta Fred Monteiro:
Maria, valsa, canta Fred Monteiro:
Revelação, ragtime, cantam Edy Anselmo e Coro:
Sessenta Setembros, balada, canta Fred Monteiro:
Serenata Pernambucana, sinfonia, com o Quarteto de Cordas F Studio:
General Lima Verde, dobrado, Banda F. Studio:
Raimundo Floriano
Esse Abílio Neto, colunista daqui do JBF, é um sujeito instigante. Toda a vez que ele escreve sobre a Música Nordestina, eu descubro que pouca coisa conheço sobre o assunto em pauta, ou, se conheço, é só aos pedaços. E aí, eu me dano a pesquisar, agarrando-me a fragmentos guardados na minha memória, para ver se formulo uma idéia completa sobre o tema.
Assim foi no dia 30 de junho passado, quando discorreu sobre Severino Januário e mencionou o programa Os Sete Gonzagas, sucesso transmitido pela Rádio Tupi do Rio de Janeiro, em 1952, do qual eu não perdia uma edição, nele atuando o velho Januário José dos Santos e seis dos seus nove filhos, dentre eles os já famosos Luiz e Zé Gonzaga.
Vieram-me à memória aqueles bons tempos dos meus 16 anos. Foi em 1952, lá pro final do ano, que eu me encantei ao ouvir Zé Gonzaga, ao vivo, no Cine Teatro 4 de Setembro, em Teresina, Piauí, cantar o arrasta-pé Nós Era Sete, composição sua, tendo Antônio Maria como parceiro. Acho que a música foi feita como uma espécie de gozação pelo fato do programa ter-se acabado.
Aquela canção forrozeira entrou-me na cabeça, e até hoje eu sei-a de cor, embora nunca mais tivesse a oportunidade de ouvi-la novamente. Dizia assim:
Nós era sete
Fumo morrendo
Fumo morrendo
E só fiquemo eu
Não houve reza
Não houve nada
Fumo morrendo
E só fiquemo eu
José mais moderninho
Morreu de catapora
Tião endefluxado
Tossiu tanto, que morreu
Gumercino nem nasceu
Morreu fora de hora
Enfim, nós era sete
E só fiquemo eu
Mas, conforme eu declarei acima, esse Abílio Neto, lascaneta de mulesta, fez com que as minhas lombrigas não mais se aquietassem. E, aí eu me danei. Pequei meu cavalo, chamei-o nas esporas e me atirei na estrada, à procura da até então desconhecida gravação. Querem ver como é fácil? Pois tentem! Pesquisem no Google, no Brasil Vinil, na Wikpédia, na Globo.com, no Orkut.com, no Twitter.com, no Facebook.com, no Sonic.com, no Myspace.com, no Linkedin.com, no Escambau.com! Encontraram? Nem a pau, Juvenal.
Até que um dia, entrei em contato com o saudoso colecionador Roberto Lapiccirella, de Camanducaia (MG), que me disponibilizou o tão procurado registro fonográfico da música.
Portanto, é com muito orgulho que faço aqui esta pequena homenagem ao grande Zé Gonzaga e seu parceiro Antônio Maria.
Na gravação, ao cantar o forró pela primeira vez, Zé Gonzaga se atrapalha e diz: José mais moderninho morreu fora de hora. O que é consertado no bis, que ficou assim: José mais moderninho morreu de catapora. Naquele tempo, eram mínimos os recursos tecnológicos, e a feitura de um disco constituía-se em tremendo desafio. Gravou errado, tamos conversados!
Orlando Silva também cometeu engano semelhante, em 1937, no samba Pela Primeira Vez, de Noel Rosa e Christóvão de Alencar – que faz parte do meu acervo da Velha Guarda –, referindo-se à namorada, que viajara num trem: “Até sumir numa esquina o lenço dela”. Na parte orquestral, algum dos músicos cochichou no seu ouvido: “Quem dobra esquina é bonde!” Orlando, então, corrigiu, no bis: “Até sumir numa curva o lenço dela”.
Para vocês, arrasta-pé Nós Era Sete, de Zé Gonzaga e Antônio Maria:
Raimundo Floriano
Manoel Serafim
(1941 – 2007)
Quando eu digo que tô famoso, ainda tem gente não acredita – ninguém é profeta em sua terra. Mas é só ver o que anda acontecendo no mundo para constatar essa grande novidade.
Tenho feito um bocado de armação, no cenário literomusical, nestes meus 74 anos de vida. Já nasci gritando: “óia, eu aqui!”.
Meu último livro, Do Jumento ao Parlamento, com tiragem de 2 mil exemplares, me concedeu certa notoriedade dentro do meu público-alvo: conterrâneos, camaradas da caserna, colegas do Parlamento, companheiros de malhação, hidro e fisioterapia, músicos, forrozeiros, batuqueiros, presepeiros, maranhenses, piauizeiros, amigos outros que amealhei nestes 50 anos, e, por que não dizer, até parentes, desses teimosos.
Mas o veículo que me projetou para o mundo, para o além-fronteiras, para o Universo Cultural, foi o Jornal da Besta Fubana, que me habilitou a publicar, semanalmente, matéria em A COLUNA DE RAIMUNDO FLORIANO. As solicitações que recebo constantemente, por meio do JBF ou pelo e-mail raimundofloriano@brturbo.com.br, dão a exata dimensão dessa notoriedade. E a todos venho atendendo, dentro destes três gêneros nos quais me considero forte: Dobrado, Carnaval e Forró.
Não posso deixar de mencionar aqui o Google, que se apodera de tudo o que o JBF publica, dando-lhe mais visibilidade. Duvida? Então vá lá, digite RAIMUNDO FLORIANO, dê um ENTER e pronto: tá feito o esparrame!
Até prefácio já me pediram pra fazer!
Há pouco tempo, uma forrozeira residente em Guarapari-ES, me procurou pedindo notícias de um primo seu o Manoel Serafim, do qual ela mais nada soube há mais de 30 anos. Indagava se ainda existia e onde morava, se ainda atuava na vida artística.
Sanfoneira, chama-se Maria Madalena, nasceu em Boqueirão-PB e, casada com um advogado, nunca precisou exercer profissionalmente sua arte musical.
Agora, não por necessidade, mas apenas para realizar-se artisticamente, resolveu formar seu conjunto, o MARIA MADALENA E SUA BANDA FERA SHOW. Dentro em breve, espero, vocês ouvirão falar nesse pessoal. O Forró é inesgotável, a cada dia aparecem novos intérpretes, com suas infinitas possibilidades.
Vejam-na aqui:
Maria Madalena e Sua Sanfona
Pouco sei sobre Manoel Serafim, pois a literatura existente sobre ele é que consta das contracapas de seus discos, isso no tempo do LP. O que apreendi adicionalmente foi de oitiva, conversando com amigos que o conheceram pessoalmente. Por isso, já ia orientá-la a consultar o JBF onde, a 04.08.08, eu postara seu resumidíssimo perfil.
E, aí, surgiu o nó: tudo o que eu escrevera anteriormente aqui no JBF fora deletado, a pedido meu e de comum acordo com o Papa Berto I, devido a problemas surgidos numa fase gordurosa que não queremos relembrar.
Assim, repito aqui a matéria deletada.
Taí um Ilustre Desconhecido para a mídia. Forrozou por mais de 50 anos, porém jamais alguém ouviu falar em seu nome no sul-maravilha. Seu forró é lascado, encacetado, tarrabufado. Para mim, foi o grande cantor das coisas da Paraíba, depois de Jackson, conforme consta do seu vastíssimo repertório. O conjunto Manoel Serafim & Banda Cuscuz com Leite ocupou as paradas de sucesso das noites de João Pessoa e de toda a região.
Benedito Honório, atual Presidente da Ordem dos Músicos da Paraíba, reconheceu o valor desse cabra e sempre o apoiou, conseguindo-lhe trabalhos nos tempos das vacas magras. É do Honório e de João Bosco o engraçadíssimo xote, gravado por Serafim, denominado Sou Paraíba – Resposta ao Edmundo. O motivo da música é que o jogador de futebol Edmundo andou chamando um juiz nordestino de paraíba, de modo desrespeitoso e pejorativo. Por isso, a promessa:
– Mas Edmundo, já falei pro Chico Riba, se ficar na Paraíba, leva pisa de cipó!
Ao escrever estas maltraçadas, fico imaginando a canja que Manoel Serafim está dando no etéreo forró, junto a Marinês e Elino Julião, falecidos na mesma época, certamente cantando o rojão com o qual me foi apresentado, que marcou para sempre sua voz em minha memória, e que é a sua cara:
– Não chores não, Mané Chorão! Não chores não, Mané Chorão! Se teu caso é mulher, no forró tem de montão!
Com vocês, pequena amostra do trabalho esse grande e saudoso forrozeiro.
O Inventor do Forró, rojão de Manoel Serafim e de Buco do Pandeiro:
Sou Paraíba (Resposta a Edmundo), xote Benedito Honório e João Bosco da Silva:
Forró do Serafim, rojão de Manoel Serafim e Chico Nobre:
São João em Bananeiras, arrasta-pé de Manoel Serafim e Penha Serafim:
O Puxador de Saco, arrasta-pé de Zé Catraca:
Raimundo Floriano
Foto inédita e histórica, de 1954:
Zé Minhoca, Zé Gonzaga e Passinho
José Januário Gonzaga do Nascimento, sanfoneiro, cantor e compositor, nasceu a 15.01.1921, em Novo Exu (PE), e faleceu a 13.04.2002, aos 81 anos, na cidade do Rio de Janeiro (RJ). Era filho de Ana Batista dos Santos, a Santana, e de Januário dos Santos, o Velho Januário, braço forte na lavoura, que se distinguiu como animador de bailes, músico e consertador de foles de 8 baixos.
Há poucos registros escritos sobre sua vida. Por isso, transcrevo aqui trecho do livro Gonzagão e Gonzaguinha, de Regina Echeverria:
“Ainda em 1940, bateram na porta de Dona Tereza (pensão no Rio Janeiro onde Luiz se alojava) na Rua São Frederico, Morro de São Carlos, procurando por Luiz Gonzaga. Quem chamava era um rapaz de olhos azuis iguais aos da mãe Santana, e Gonzaga não demorou a reconhecer o irmão José Januário que, a exemplo dos mais velhos – Joca e Severino, que já moravam em São Paulo –, estava no Sul para fugir da seca que atingira inclemente até o privilegiado Araripe. Luiz não gostou muito da surpresa: ‘O que você veio fazer aqui, seu moleque safado, que eu não mandei chamar ninguém, que eu estou pior que vocês?’ Não teve jeito. Gonzaga comprou um colchão para acomodar José Januário e o nomeou seu ajudante, responsável por carregar a sanfona e correr o pires no Mangue. Ele adotou o nome de Zé Gonzaga e seria o único irmão a seguir carreira no rastro de Luiz Gonzaga”.
Rastro bem perseguido e assimilado. Anos mais tarde, Gonzagão proclamava, para quem o quisesse escutar, que Zé Gonzaga era o maior sanfoneiro do Brasil!
O que vou escrever daqui pra frente, não consta em qualquer banco de dados. Na maioria, é fruto das informações que me foram repassadas por Maria Auxiliadora, a Dona Sinhá, comadre de Zé Gonzaga, memória viva do forró – a quem devo a foto rara ilustrativa desta matéria –, viúva de Zé Minhoca/Miudinho, e também de minhas observações pessoais, um tanto falhas, desde 1951, quando tomei conhecimento desse grande astro da MPB, especialmente da Música Forrozeira.
No início dos anos 50, Zé Gonzaga arregimentou dois operários nordestinos que davam murro em ponta de faca na cidade de São Paulo. A um, servente de pedreiro, ensinou a tocar zabumba e botou-lhe o apelido de ZÉ MINHOCA; ao outro, capoteiro, ensinou a tocar triângulo e pôs-lhe o apelido de PASSINHO. Formado o conjunto, saíram a fazer sucesso pelo Brasil até o final da década, e pelo exterior, em projeto cultural de Assis Chateaubriand. Falarei, agora, um pouco desses dois exímios coadjuvantes, que também o secundavam na parte coral.
ZÉ MINHOCA - João Batista de Lima Filho nasceu em Fortaleza (CE), a 22.01.1931. Foi rebatizado no Rio de Janeiro com o nome de MIUDINHO, devido à sua baixa estatura, menos de 1,50m. Formou, com Dominguinhos e Zito Borborema, o primeiro Trio Nordestino assim conhecido – denominação dada por Luiz Gonzaga, por sugestão de Helena, sua mulher –, que teve pouca duração. Fez parte do elenco da Rádio Nacional, com o qual veio transferido para Brasília. Posteriormente, foi nomeado para o Senado Federal, onde se aposentou. Faleceu aqui em Brasília, a 24.03.2005.
PASSINHO - Francisco Ribeiro Ferreira nasceu no Recife a 23.06.1925. Fez jus ao apelido porque, devido a sua pequena estatura, caminhava com passadas muito curtas, picadinhas. No início dos anos 60, mudou-se para Brasília, onde se aposentou como Chefe da Capotaria da estatal Transportes Coletivos de Brasília - TCB. Aqui, faleceu a 30.10.1977.
Zé Gonzaga, ao contrário do que se pensa e até se apregoou, jamais se ressentiu da fama do irmão, embora tenham batalhado na mesma época e com estilos iguais. Prova disso é que um dos maiores sucesso do Rei do Baião, O Cheiro da Carolina, é do Zé, em parceria com Amorim Roxo.
Em 1951, Luiz Gonzaga sofreu grave desastre de automóvel, no qual viajava com seu conjunto, escapando todos com vida por milagre. Em agradecimento, subiu a escadaria da igreja de Nossa Senhora da Penha, no Rio, e lá cantou o Baião da Penha, composição de David Nasser e Guio de Morais. Zé Gonzaga, por sua vez, registrou o fato no baião Viva o Rei, dele e de José Amâncio, seu mais constante parceiro, onde conta detalhes do acidente, e que eu considero sua melhor composição.
É oportuno mencionar que Zé Gonzaga dominou no Carnaval, com músicas que ficaram para sempre incorporadas ao repertório momesco. Como o samba Bebida Não Mata Ninguém e as marchinhas Cabelo Couve-flor, Disco Voador, Tô Doido Que Chegue o Divórcio e a capciosa O Cadilac do Papai, constantes deste apanhado que ora lhes apresento.
Aqui, as músicas mais conhecidas de Zé Gonzaga:
A Fuga da Asa Branca - Arrasta-pé (Zé Gonzaga e Nélson Barbalho)
Ai, Ai, São João - Arrasta-pé (Átila Nunes e J. Mendonça)
Ai, Rosinha - Arrasta-pé (Zé Gonzaga e Silveira Lima)
Ai, Sanfona - Calango (Zé Gonzaga e Jeová Rodrigues Portela)
Alencarina Bonita - Baião (Zé Gonzaga e José Amâncio)
Baile da Tartaruga - Forró (Omar Safet, Augusto Mesquita e Jaime Florêncio)
Batendo Sola - Rancheira (Zé Gonzaga e J. Portela)
Bebida Não Mata Ninguém - Samba (Kid Pepe e Arlindo Caldas) 1951
Cabelo Couve-flor - Marcha (Diomedes Tavares, Pereira Matos e Airton Amorim) 1951
Camarão É Peixe Bom- Forró (Zé Gonzaga)
Chegou o Sanfoneiro - Arrasta-pé - sanfonado (Ruthnaldo e Alcebíades Nogueira)
Disco Voador - Marcha (Chacrinha e José Gonçalves) 1951
Encontro com Lampião - Baião (Zé Gonzaga e Zé Praxedes)
Este Ano Eu Vou Casar - Baião (Zé Gonzaga e José Amâncio)
Estrada Velha da Pavuna - Choro - sanfonado (Zé Gonzaga)
Frevo na Roça - Frevo - sanfonado (Zé Gonzaga e Zito Borborema)
Galope à Beira-mar - Galope (Zé Gonzaga e Zé Praxedes)
Januário Criou Fama - Baião (Zé Gonzaga e José Amâncio)
Moreninha do Sertão - Arrasta-pé (Ceci Viana J. Praxedes e Peter Bill)
No Casório de Irineu - Xote (Zé Gonzaga e José Amâncio)
O Cadilac do Papai - Marcha (Zé Dantas e Péricles) 1951
O Cheiro da Carolina - Xote (Zé Gonzaga e Amorim Roxo)
São João Não Gostou - Arrasta-pé (Augusto Mesquita)
Teimosinho - Baião - sanfonado (Claudionor Cruz e Mário Duarte)
Tô Doido Que Chegue o Divórcio - Marcha (Guio de Moraes) 1951
Vai Que É Mole - Arrasta-pé - sanfonado (Zé Gonzaga)
Vem Cá, Bichinha - Baião ligeiro (Zé Gonzaga e Humberto Teixeira)
Vida de Pobre - Arrasta-pé (Zé Gonzaga e J. Portela)
Viva o Rei - Baião (Zé Gonzaga e José Amâncio)
Xote Miudinho - Xote (Luiz Gonzaga e Zé Dantas)
Para o desfrute de nossos leitores, e relembrando minha adolescência, aqui vai o baião Viva o Rei, de Zé Gonzaga e Zé Dantas:
E mais:
Alencarina Bonita, baião de Zé Gonzaga e José Amâncio:
Baile da Tartaruga, rojão de Omar Safet, Augusto Mesquita e Jaime Florêncio:
Camarão É Peixe Bom, rojão de Zé Gonzaga:
O Cheiro da Carolina, xote de Zé Gonzaga e Amorim Roxo:
Nós Era Sete, arrasta-pé de Zé Gonzaga e Antônio Maria:
ATENDENDO A PEDIDO DE DO LEITOR CLAUDIO CANFILD:
Bebida Não Mata Ninguém, samba de Kid Pepe e Arlindo Caldas:
Cabelo de Couve-flor, marchinha de Diomedes Tavares, Pereira Matos e Airton Amorim:
ELINO JULIÃO E O RABO DO JUMENTO
Raimundo Floriano
Elino Julião
(13.11.1936 – 20.05.2006)
No dia 20 de maio de 2016, fez 10 anos que Elino Julião tomou suas últimas providências. Desarmou a rede, arrumou a trouxa, emalou a sanfona, jogou tudo na carroceria do caminhão, entrou na boléia, ligou a ignição e deu início à última jornada, à viagem sem volta, à viagem sem frito. No caminho, outros forrozeiros da década de 50 foram pegando carona. Caso de Manoel Serafim, há dois meses, e Marinês, no dia 14 último. Trio nordestino de calibre esse daí!
Lá, na outra dimensão, foram realizar majestoso festival, comandados pelos grandes criadores do Forró, essa música que incorpora e interpreta toda a alma e todo o sentimento do povo do nordeste brasileiro: Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, e Jackson do Pandeiro, o Rei do Ritmo.
Você, meu camarada, que vê televisão todos os dias, assistiu a algum noticiário em qualquer emissora dando conta da partida para a eternidade desses três personagens? Não assistiu? Nem o Penca, nem o Lenca! Para tentar amenizar tanto descaso, para reavivar suas memórias, aqui está o Jornal da Besta Fubana, que lhes dirá algo deles e mostrará pequena parcela do seu trabalho.
Já lhes falei de Manoel Serafim e de Marinês. Agora, chegou a vez de Elino Julião.
A grande mídia sempre passou batida para Elino. Compositor com peças gravadas pelos principais forrozeiros pés-de-serra do Brasil, a começar por Gonzagão e Jackson, passando por Elba Ramalho e outros jovens cantores, nunca teve suas obras relacionadas à sua pessoa, mas sim ao nome dos intérpretes.
Mulher de Verdade, é a meu ver, é verdadeiro hino de amor da mulher que sabe perdoar seu homem. Madre Superiora Neide, da Igreja Sertaneja, adoooora este rojão:
Minha mulher gostava quando eu lhe batia
E quanto mais ela apanhava, mais ela dizia
Bata nêgo, pode bater
Bata com força, que eu não sinto doer
Pode bater com as duas mãos nessa nêga que é sua
Começa dentro de casa e termina no meio da rua
Se alguém vier reclamar não dê atenção
Bata com força, nêgo do meu coração
Bata nêgo, pode bater
Bata com força que eu não sinto doer
Não se incomode que a vizinha lhe chame de biriteiro
E que você não dá dinheiro pra comprar o pão
Tenho satisfação, sou mulher de verdade
Nêgo, por caridade, deixe de bater não
Aquela bendita rede deu o que falar. Namorador inveterado, não podia ver um rabo-de-saia, que ficava peneirando no ar e caindo em cima feito gavião faminto. Mas sua rede exigia respeito. Era a garota trastejar, e ele sentenciava:
– Na minha rede, não! Arranje outra rede, ou vá dormir no chão!
Seu hipotético caminhão servia-lhe apenas de pretexto à paquera:
– Não há quem resista, ser motorista sem ter um amor. Me falte gasolina, mas não me falte uma menina, que eu morro de dor!
Pelo visto, lá um dia, achou a forma do pé:
– O pai da Grabriela tem razão. Eu vou casar com ela, é minha obrigação!
Tomei conhecimento de Elino Julião em 1976, ao ouvir pela primeira vez Rabo do Jumento, xote que me transportou imediatamente a meu sertão. Sei que todos já o ouviram, mas sei também que é bom recordar.
Para vocês pequena amostra de seu trabalho.
Rabo do Jumento, xote de Elino e Dilson Dória, participação especial de Lenine:
Mulher de Verdade, rojão de Elino e Severino Ramos:
Tem Amor Demais, baião de Elino e Zezinho Silva:
Tamarineira, arrasta-pé de Elino e João Machado:
O Pai de Gabriela, rojão de Elino e José Jesus, na voz de Jackson do Pandeiro:
Raimundo Floriano
Detalhe da capa do DVD
Chegou o período junino, e eu me valho do ensejo para comentar, com grande atraso, mas com satisfação, o DVD Cristina Amaral - A Vida É Um Circo, lançado em setembro de 2010, na Passa Disco, cujo dono, nosso amigo Fábio Cabral, me enviou de presente um exemplar.
De cara, o espetáculo me levou a minha juventude, no Circo Cometa do Norte, em Teresina (PI), onde o escada Socó – este que vos fala –, e o palhaço Jatobá, de quem eu era ajudante, faziam suas patuscadas, gaiatices e presepadas, com piadas, cançonetas, paródias, charadas e gestos picantes em torno da esfuziante Rumbeira. Para quem não sabe, Rumbeira, em qualquer circo de antigamente, era aquela gostosona que, com requebros eróticos, maliciosos e enfeitiçantes, dançava ao ritmo de baiões, sambas, mambos, maxixes e até rumbas.
Como prefácio deste seu trabalho, Cristina Amaral assim se expressa:
“Respeitável Público! ‘Eu queria mesmo era ser artista’. Assim dizia o Mestre Luiz Gonzaga que, na infância, tive o prazer de vê-lo cantar em um circo na minha cidade: Sertânia/Pernambuco. O Circo me trouxe esse sonho: trazer sorrisos, o palhaço; representar, o teatro; cantar, o show; ser ‘rumbeira’, a dançarina; fazer malabarismo, a vida. O meu desejo era estar nos grandes picadeiros. Hoje, divido o picadeiro do meu circo com todos vocês. A vida é um circo e todos nós somos palhaços. (a) Cristina Amaral.”
Ao colocarem o disco em seus equipamentos e acionarem a tecla play, vocês se depararão com um majestoso e riquíssimo picadeiro, repleto de músicos, dançarinos, vocalistas e imenso elenco de coadjuvantes a secundarem a artista principal, a atração maior do espetáculo, nada menos que Cristina Amaral, a Rumbeira que, com inexcedível talento, graça, beleza e simpatia, empenha toda sua arte para extasiar o respeitabilíssimo público.
Cristina faz um competente passeio em torno dos ritmos que tanto curtimos: toada, xote, coco, embolada, baião, xaxado, rojão, rumba, e, para furar o chão do picadeiro, um quentíssimo arrasta-pé.
Os compositores dessas joias musicais estão dentre o que de melhor existe hoje no cenário nordestino: Petrúcio Amorim, Walmar, Bráulio de Castro, Flávio Leandro, Maciel Melo, Assisão, Nogueira, Pinto do Acordeom, Rogério Rangel, Marrom Brasileiro, Zeca Pinheiro, Xico Bizerra, Toinho Alves, Luiz Fidélis, Wilson Freire, César Amaral, Anchieta Dali, Carlos Fernando, Geraldo Azevedo, Nando Cordel, Dominguinhos, Djavan, Accioly Neto, João Silva e, reverenciando a Velha Guarda Forrozeira, os saudosos Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira.
Cristina soube muito bem dosar seu espetáculo, convidando estrelas consagradas da constelação nordestina: Maciel Melo, Petrúcio Amorim, César Amaral, Geraldo Azevedo, Cezinha e uma trupe de moças e rapazes a enfeitaram e enriqueceram o picadeiro com suas vozes e coreografias. O clima é linear, no píncaro, no cume, do início ao fim. Mas há participações especiais que não me saem da lembrança.
Uma foi a de Elba Ramalho, minha Patrona na Academia Passa Disco da Música Nordestina. Cristina é um clone de Elba. E isso ela faz questão de demonstrar. Conheci-a quando de minha posse na Academia, e quase me confundi: o vestidinho brejeiro, bastos cabelos em penteado esvoaçante, as botinhas cano longo, tudo nela era Elba Ramalho, que a chamou ao palco, para consigo interagir no grande show daquela noite. Agora, neste DVD, Cristina é quem chama Elba ao picadeiro para cantarem Espumas ao Vento e O Chineleiro, demonstrando que é uma seguidora e também continuadora da Escola Elbiana. É tesão em dose dupla!
Outra foi a de Santana “O Cantador”, em Flor do Mamulengo. Santana pareceu-me estar na profissão errada. Devia ter enveredado pelo mundo circense, tal é a versatilidade com que se comporta no palco, fazendo um mamulengo perfeito. Não me canso de teclar replay, para rever a cena.
Em Mamãe, Quero Ser Rumbeira, Cristina se apresenta caracterizada da própria, exibindo uma lapa de par de coxas que a gente de antemão já imaginava e estava doida para conferir. Nesse quadro, relembrei meus tempos, no Circo Cometa do Norte, quando eu, escada Socó, e o Palhaço Jatobá, ao vermos a Rumbeira se desmontar no remelexo rebolativo, triscávamos – apenas triscávamos – em suas cadeiras, viravamo-nos para o galinheiro – arquibancada – e lambíamos os dedos. Quase que o circo vinha abaixo, de tanto aplauso e gritaria da patuleia!
Cristina Amaral é minha amiga no Fecebook. Naquela noite de minha posse, adquiri na Passa Disco seus CDs então disponíveis: Anjo Azul, Dois Rubis, Eu Sou o Forró e Pérola Nordestina.
Numa pequena amostra desse maravilhoso DVD, disponibilizo-lhes, de Petrúcio Amorim e Bráulio de Castro, o áudio do rojão Eu Sou o Forró.
E, também, este youtube, onde ela interpreta Mamãe, Eu Quero Ser Rumbeira, rojão de Wilson Freire e César Amaral:
Raimundo Floriano
25.09.1913 - Viana (MA) – 24.04.2000 - Rio de janeiro (RJ)
Quando cheguei a Teresina (PI) para estudar, em fevereiro de 1950, era grande a boba rivalidade entre os adolescentes maranhenses e piauienses, estes cheios de convencimento por morarem numa capital tão evoluída, enquanto que nós, os forasteiros, só tínhamos mesmo para mostrar, assim à mão, a cidade de Timom, do outro lado do Rio Parnaíba, à época um dos municípios mais atrasados do Brasil. Para chegar-se lá, só de canoa, em travessia muito perigosa.
Os teresinenses deitavam e rolavam com o progresso de sua terra: dois grandes cinemas, três imponentes igrejas, colégios, Faculdade de Direito, quartéis da Polícia e do Exército, Estação Ferroviária, Escola Industrial, calçamento de paralelepípedo, ponte metálica, seminário, convento, prédio com elevador. Nós, principalmente os sul-maranhenses, que nada tínhamos para contra-argumentar, valiamo-nos dos valores culturais de nosso Estado, citando seus famosos escritores e poetas, dentre eles: Aluízio de Azevedo, Artur de Azevedo, Gonçalves Dias, Viriato Correia, Graça Aranha, Coelho Neto, Humberto de Campos, Bandeira Tribuzi, Odilo Costa Filho, Susândrade, Raimundo Correia, Catulo da Paixão Cearense e, para arrolhar a boca de qualquer piauizeiro mais entusiasmado, nosso trunfo artístico maior: a compositora, cantora e sanfoneira Dilu Melo!
Num cenário em que todo o Brasil era dominado pelas vozes de Chico Alves, Emilinha Borba, Silvio Caldas, Marlene, Nélson Gonçalves, Aracy de Almeida, Orlando Silva, Vicente Celestino e outros, Dilu Melo disputava a fama e a popularidade pau a pau com eles. Tanto no rádio, quanto no mercado fonográfico.
Maria de Lourdes Argolo Oiver, a Dilu, nasceu em Viana (MA), a 25.09.1913, e faleceu no Rio de Janeiro (RJ) a 24.04.2000.
Criada em Porto Alegre (RS), aos 13 anos ganhou medalha de ouro num concurso de piano, atuando depois em algumas rádios.
Casou-se em 1930 com o Engenheiro Carlos Rodrigues de Melo, união que durou pouco mais de dois anos.
Em 1938, foi para o Rio de Janeiro (RJ), estreando na Rádio Cruzeiro do Sul e, no ano seguinte, compunha, em parceria com Ovídio Chaves, a toada Fiz a Cama na Varanda, por ela gravada em 1941, na Continental, com enorme sucesso.
Essa música foi relançada mais tarde por Inezita Barroso, Dóris Monteiro, Nara Leão, Cantores de Ébano, diversos conjuntos de rock e regravada na França, em versão.
Por influência de Antenógenes Silva, começou a tocar acordeom recebendo da imprensa a denominação de Rainha do Acordeom, título a que logo abdicou, ao compor, tocar e cantar músicas que valorizavam o nome da sanfona, instrumento que ajudou a popularizar lançar, de sua autoria e de J. Portela, o xote Qual o Valor da Sanfona? e o baião Os Dez Mandamentos do Sanfoneiro.
Naquele tempo, o instrumento era chamado concertina ou acordeom. Seus grandes intérpretes da época, como Pedro Raimundo, em Santa Catarina e Rio Grande do Sul, Antenógenes Silva, em Minas Gerais, Mário Mascarenhas e Sua Escola, em Minas Gerais e Adelaide Chiozzo, em São Paulo, tocavam acordeom. Contrapondo-se a eles, havia os sanfoneiros Luiz Gonzaga, seu irmão Zé Gonzaga, Sivuca – no início da carreira chamado de sanfonista – e Dilu Melo que, com Qual o Valor da Sanfona?, sacramentou esse nome por todo o Brasil.
Em 1944, registrou em disco a valsinha brejeira Lá na Serra, de Capiba, que se tornou sucesso nacional.
Pesquisadora do folclore brasileiro, além de pianista, violonista e harpista, viajou por todo o Brasil, divulgando seu repertório. Afastou-se da vida artística depois de 25 anos de carreira, mas ainda gravou um LP na Odeon e outro na Som.
Criou uma empresa teatral que produzia peças infantis e tornou-se professora na Escola de Música Sá Pereira, no Rio de Janeiro, ensinando dicção, impostação, danças folclóricas e História da Música.
São de sua autoria, além das já citadas, Dilu compôs Alecrim, toada gaúcha, Coco Babaçu, coco, Engenho D’Água, embolada, com S. Meira, Maravia, baião, com Jairo José, Saudades do Maranhão, valsa, com Roberto Martins, Telegrama, samba, Acalentando São Luís, toada, Meu Cariri, baião, com Rosil Cavalcanti, Balada do Pranto e da Chuva, toada, com Rose Gama, Quando Durmo de Pé Sujo, arrasta-pé, Nas Águas do Mearim, toada, Viana, Cidade Magia, valsa, Coisas Erradas do Mundo, rojão, com Mardokeo Nacre, Tristeza de Juriti, toada, Cabocla, baião, com Argolio de Sá, Candelabro, valsa, Coisas do Rio Grande, polca, Meia Canha, polca, com Ovídio Chaves, Meninos dos Olhos Tristes, xote, com Ovídio Chaves, Meu Barraco, choro, Redinha de Algodão, baião, Sapo Cururu, baião, e Vida de Artista, samba-canção.
Dentre muitas músicas que gravou de autores diversos, destaca-se o motivo folclórico com arranjo de Antônio Almeida, Serenô – Serenô, eu caio, eu caio – valsinha brejeira que até hoje é cantada em todo o universo seresteiro.
Aqui vai uma pequena amostra de seu trabalho:
Qual o Valor da Sanfona?, xote de Dilu e J. Portela:
Fiz a Cama na Varanda, toada de Dilu e Olívio Chaves:
Lá na Serra, valsa de Capiba:
Serenô, motivo folclórico, arranjo de Antônio Almeida:
Saudades do Maranhão, valsa de Dilu e Roberto Martins
Raimundo Floriano
Zito Borborema
Eram três cabras danados, forrozeiros de talento que, depois de baterem cabeça e darem muito murro em ponta de faca por aí, desembarcaram no Rio de Janeiro em busca de um lugar ao sol na cidade maravilhosa. Seus nomes de batismo não ajudavam nada no cenário artístico: José Domingos de Morais, sanfoneiro, João Batista de Lima Filho, zabumbeiro, e Manoel Valdivino de Souza, vocalista, triangueiro e pandeirista. Por isso, ostentavam pseudônimos pelos quais passaram a ser conhecidos dali pra frente: Dominguinhos, Zé Minhoca – depois, Miudinho – e Zito Borborema.
Como não poderia deixar de ser, acoitaram-se na proteção de Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, que os acolheu e os abençoou. Deu-lhes a mão e, com peso de seu prestígio, arranjou serviço para os três.
Tocando nos forrós cariocas, ora isoladamente, ora reunidos, vez em quando com o próprio Gonzagão, foram se afirmando no meio musical e desenvolveram trabalhos que os projetaram para o sucesso.
Foto histórica e inédita, de 1956:
Luiz Gonzaga, Miudinho e Zito Borborema
No começo do ano de 1957, Luiz Gonzaga, reuniu os três e organizou um conjunto a que deu o nome pioneiro de Trio Nordestino, inspirado por Helena, sua mulher. O grupo durou apenas dois anos com sua formação original. Mais tarde, o título, que não detinha patente oficial, foi disputado pelos trios Baiano, formado por Lindu Cobrinha e Coroné, e Paulista, formado por Xavier, Heleno e Toninho.
Depois de desfeito o Trio Nordestino inicial, cada qual seguiu rumos diferentes, cada um com sua história, que pretendo aqui apresentar de forma resumida.
Foto histórica e inédita, de 1957:
Miudinho, Zito Borborema e Dominguinhos
DOMINGUINHOS nasceu em Garanhuns, Pernambuco, a 12.02.1941. Aos seis anos, com seus irmãos, já tocava sanfona de oito baixos nas portas dos hotéis e nas feiras de sua cidade natal, de Caruaru e de municípios vizinhos. Aos sete anos, foi ouvido por Luiz Gonzaga, que lhe deu seu endereço no Rio de Janeiro.
Seis anos depois, ainda conhecido como Neném, indo morar com o pai e o irmão mais velho no subúrbio carioca de Nilópolis, onde participava de forrós nos finais de semana, resolveu procurar Luiz Gonzaga, que lhe presenteou com uma sanfona. Daí pra frete, sua carreira deslanchou.
Depois da morte de Luiz Gonzaga, em 1989, passou a ser considerado o seu substituto no cenário forrozeiro, assim como o maior sanfoneiro do País.
Com a cantora e compositora Anastácia, manteve durante certo tempo parceria musical e amorosa e lançou, em 1973, um xote que foi o maior sucesso da dupla, tocado em todas as casas de forró do Brasil e também, em ritmo de marchinha, no Carnaval daquele ano, permanecendo até hoje como uma das mais pedidas no reinado momesco: Eu Só Quero Um Xodó!
Dominguinhos, mercê de Deus, ainda não é passado. Tem a agenda lotada de shows e seus discos continuam à disposição nas boas discotecas, com vendagem compensadora.
MIUDINHO foi o único zabumbeiro de que eu tenho notícia a se dar bem na vida! Esse apelido lhe foi botado por Luiz Gonzaga, devido à sua pequena estatura: pouco mais de 1,50m! No dizer de Dominguinhos, foi o maior – na acepção de melhor – zabumbeiro do velho Lua!
Nascido em Fortaleza, Ceará, em 22.01.1931, encontrava-se em São Paulo, no início dos anos 50, trabalhando como servente de pedreiro, quando conheceu o sanfoneiro Zé Gonzaga, irmão do Rei, que lhe ensinou a arte da zabumbagem e lhe deu o nome artístico de Zé Minhoca, e com quem passou a tocar nos forrós da pauliceia, num trio sem nome formado pelos dois e pelo triangueiro Passinho.
Mudando-se para o Rio, militou no ambiente musical e forrozeiro até o final de 1959, quando o Trio Nordestino se desfez. Naquele ano, transferiu-se para Brasília, integrando o elenco da Rádio Nacional como percussionista.
Aqui, ao lado do trombonista Tio João, do saxofonista Tio Nilo, de Bide da Flauta, do violonista Alencar Sete Cordas, da flautista Odeth Ernest Dias e de Pernambuco do Pandeiro, foi presença constante nas rodas de choro comandadas pelo citarista Avena de Castro, fundador e presidente do Clube do Choro. Em 1961, passou a funcionário do Senado Federal, onde se aposentou.
Conheci-o em 2004, um ano antes de sua morte a 24.03.2005, aos 74 anos de idade vítima de enfarte. Era casado com Maria Auxiliadora, a Dona Sinhá, num enlace harmonioso que durou quase 51 anos. Residia em bela casa no Guará II, aonde tenho ido constantemente aperrear Dona Sinhá na busca de informações.
Muitos dos fatos que aqui narro, desconhecidos até agora, e as fotos históricas e inéditas acima estampadas me foram gentilmente repassados por ela, a quem sou imensamente grato e a quem estarei persistentemente recorrendo em minhas pesquisas.
Dona Sinhá é a memória viva do Forró. Marinês jamais deixou de ir a sua casa quando vinha apresentar-se em Brasília. Assim como Anastácia, Guadalupe, Dominguinhos e outros que, estando por aqui, sempre arranjam jeito de dar uma chegadinha lá, para lhe pedir sua bênção.
ZITO BORBOREMA nasceu na cidade de Taperoá, Paraíba, em data incerta e não sabida. Pouco se conhece de sua biografia. Consta que foi casado com Chiquinha do Acordeom e é pai de Perpétuo Borborema, integrante do atual Trio Pé-de-serra. É muito pouco, é quase nada.
Com voz aguda e excelente ritmo, não só na divisão vocálica, mas também no triângulo e no pandeiro, viveu grandes momentos na música nordestina.
Fez sua estreia em disco no ano de 1956, apresentando-se como Zito Borborema e Seus Cabras da Peste. São seus maiores sucessos e até hoje continuam pedidos nas rodas forrozeiras: Mata-Sete, Padre Cícero, Alegria da Festa, Gente da Gente, Bebendo nos Botequins, Corinthiano de Coração, O Mestre Não Quer, e Zé da Onça, este com a participação de Chiquinha.
Conheci-o nos Anos 1980, quando ele já morava em Brasília. Certa vez, num boteco de sua propriedade em Taguatinga, acompanhei-o em animada forrozada, ele na voz e no pandeiro, e eu dando vigorosas palhetadas no meu enjoadinho banjo. Muitas vezes o encontrei com seu conjunto, nas manhãs de sábado, fazendo propaganda em portas de lojas como Ponto Frio, Casas Nordeste, Lojas Riachuelo e Fofi.
Já faz mais de 20 anos que ele faleceu, segundo Dona Sinhá. A última vez em que estive com ele foi em 1984, no quintal do poeta e escritor Orlando Tejo, no casamento de nossos amigos Maurício Melo e Yara, do qual foi padrinho o Papa Berto I. Nesse dia, ele ainda tinha um grupo organizado no esquema tradicional: vocal, sanfona, zabumba e triângulo. Depois disso, perdi o contato.
Estas são as músicas de Zito que possuo em meu acervo:
Em singela homenagem, e pela grande admiração que sempre tive por sua marcante voz, suas inspiradas composições e seu agradável repertório, aqui vai pequena amostra do que nos deixou:
Zé da Onça, baião de João do Vale e Abdias, com a participação de Chiquinha do Acordeom:
Bebendo nos Botequins, samba de José Pereira:
Gente da Gente, samba de Antônio Brasil, Nilza Brasil e Haidée Santos:
Mata-Sete, rojão de Venâncio e Corumba:
Oito de Dezembro, samba de Kozó:
Sigo Meu Destino, baião de Zito e Antônio Cunha:
Raimundo Floriano
Marinês
(16.11.1935 – 14.05.2007)
Mulher corajosa! Mulher talentosa! Mulher pioneira no Forró!
Com seu aparecimento, ainda na década de 50, deu início à era feminina na atividade forrozeira, saindo dos palcos e dos estúdios e ganhando as ruas, as estradas, o planeta. Muito contribui para isso seu casamento com o sanfoneiro e compositor Abdias Filho. Formando o conjunto Marinês e Sua Gente, percorreu todo o Brasil, encantando, maravilhando, extasiando com aquela nova roupagem que dava a um ritmo até então quase que exclusivo do sexo masculino, onde dominavam o machismo e o preconceito.
Atuou com todos os medalhões da época, como Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Zito Borborema e Miudinho. Vocês já ouviram falar de Zito e Miudinho? Não? São os dois, que juntamente com o sanfoneiro Dominguinhos, formaram o primeiro Trio Nordestino, com Zito no vocal e no triângulo e Miudinho no zabumba.
Com Marinês, surgiu a malícia no forró. Peba na Pimenta, de João do Vale, José Batista e Adelino Rivera, trouxe esse tempero especial que, daí pra frente, floresceu e se consolidou. A multidão ia à loucura nas praças quando, após sua interpretação do Peba, berrava, perguntando em uníssono:
– Ardeu, Benta?
Marinês respondia, lá do palco, ao microfone:
– Ardeeeeeu!
Novamente a turba:
– Mas tu gostou?
E ela:
– Gosteeeeei!
Marinês Caetano de Oliveira nasceu em São Vicente Férrer (PE), a 16.11.1935 e faleceu no Recife (PE), a 14.05.2007.
Seu vasto repertório ficou na memória de todos os curtidores do Forró, como, além de Peba na Pimenta, Balanceiro da Usina, arrasta-pé de João do Vale e Abdias, Quatro Cravos na Lapela, rojão, de Jarbas Maria e Cátia França, Siriri, Sirirá, arrasta-pé, de Onildo Almeida, Jeito Manhoso, rojão, de Nando Cordel, Chamego na Farinha, rojão, de Cecéu, Siu, Siu, Siu, arrasta-pé, de Onildo Almeida, Forró Pé-de-chinelo, rojão, de Cecéu, Ora, Viva São João, arrasta-pé, de Antônio Barros, Forrobodiado, rojão, de Onildo Almeida, dentre outros.
Pesquisando em todas as Comunidades orkutianas relacionadas com o forró e no site 4Shared, cheguei à conclusão de que a música do repertório de Marinês mais pedida em todos os tempos é Siriri, Sirirá, que tenho o prazer de disponibilizar-lhes, para sua audição e deleite:
E mais estas faixas que a fizeram bem conhecida em todo o Brasil:
Peba na Pimenta, xote de João do Vale, José Batista e Adelino Rivera:
Jeito Manhoso, rojão de Nando Cordel, com Marinês e participação de Jorge de Altinho:
Bate, Coração, xote de Cecéu, depois gravado por Elba Ramalho:
Raimundo Floriano
Dois momentos de Anastácia
Anastácia, batizada Lucinete Ferreira, nasceu no Recife, PE, a 30.05.1941. O pseudônimo foi-lhe dado pelo sertanejo Palmeira, da dupla Palmeira & Biá.
Começou a interessar-se por música aos sete anos, quando costumava acompanhar um cantador de coco do bairro de Macaxeira, onde morava.
Já como profissional de, 1954 a 1960, cantou na Rádio Jornal do Comércio de Pernambuco, indo depois para São Paulo.
Participou de shows no interior paulista, primeiro com a Caravana do Peru Que Fala, chefiada por Silvio Santos, e, em seguida, com Venâncio e Corumba.
Contratada pela Chantecler, em 1960, gravou seu primeiro compacto duplo com as músicas Noivado Longo, de Max Nunes, Chuleado, A Dica do Deca e Forrofiá, estas de Venâncio e Corumba. Sua primeira composição gravada foi Conselho de Amigo, parceria com Italúcia, interpretada pelo cantor Noite Ilustrada, em 1963.
Nos anos seguintes, gravou 4 elepês pela Continental, com boa aceitação no Nordeste.
Em 1968, ao participar do programa Noite Impecável, de Luiz Gonzaga, na TV Continental, do Rio de Janeiro, conheceu o sanfoneiro Dominguinhos, com quem formou parceria musical e amorosa. Inicialmente, com Um Canto de Amor, concorreram ao Festival de Música Regional Nordestina, em 1969, promovido pela TV Bandeirantes, de São Paulo, e ainda De Amor Não Morrerei, que tirou o segundo lugar, ambas interpretadas por Marinês.
O maior sucesso da dupla foi Eu Só Quero Um Xodó que, executado e cantado em ritmo de marchinha, estourou no Carnaval de 1973, consagrando-se nos seguintes. Gravado em ritmo de toada por inúmeros cantores, dominou as paradas e se tornou item obrigatório em qualquer antologia forrozeira. Também merecem destaque suas composições com Liane, a mais recente e constante parceira.
Anastácia continua cantando, gravando e fazendo shows por todo o Brasil, com agenda lotada, e seus discos podem ser encontrados nas lojas do ramo ou nos sites de venda na Internet, como ameriacanas.com, submarino.com e videolar.com.
No ano passado, lançou, em parceria com a escritora Leda Dias (leda65@hotmail.com), o livro Eu Sou Anastácia, precioso documento sobre sua vida e o cenário forrozeiro em que vive. Ilustrado, com 376 páginas, é item imprescindível na estante de qualquer pesquisador da MPB.
Para vocês, um pouco de seu trabalho:
Eu Só Quero Um Xodó, toda de Anastácia e Dominguinhos, na interpretação de dela e de Gilberto Gil:
Forró do Xenhenhém, rojão de Anastácia:
Arrasta-pé da Alegria, arrasta-pé Anastácia e Oscar Barbosa:
Eu Quero Você, Neném, xote de Anastácia e Liane:
Tenho Sede, toada de Anastácia e Dominguinhos, interpretada pelos dois:
Raimundo Floriano
Mocó, Torres do Rojão e Djaci
José da Silva Torres, o Torres do Rojão, vocalista, triangueiro e compositor, nasceu em Campina Grande (PB), no dia 14.06.1944.
Começou cantando em Caruaru (PE), onde fazia bicos para sobreviver. Ainda adolescente, mudou-se para o Rio de Janeiro (RJ), sempre perseguindo seu ideal de se firmar na carreira de cantor. Lá, empregou-se como operário na empresa CIB - Companhia de Carrocerias Brasileira e, nos finais de semana, cantava numa casa noturna chamada Flamenguinho, de onde tirava mirrado adjutório para seu sustento.
Bateu cabeça por São Paulo (SP) e, em 1962, aportou em Brasília (DF), de onde nunca mais saiu, trabalhando, inicialmente, na indústria gráfica.
No transcorrer da carreira, atuou com célebres nomes da música forrozeira: Jacinto Silva, Oswaldinho, Camarão, Téo do Baião, Sivuca, Jackson do Pandeiro, Joci Batista, Marinês, Dominguinhos, Anastácia, Elba Ramalho, Luiz Gonzaga, Zé Gonzaga, Abdias, Miudinho, Manoel Serafim, Elino Julião e tantos outros.
Nos anos de 1963 e 1964, aqui se engrenou com o Nino, vocalista e ritmista, líder de um conjunto famosíssimo na época, o Trio Paranoá, pioneiro do forró nordestino no Distrito Federal, não só pelo Trio, mas também pela casa noturna de sua propriedade, o Forró do Nino, na cidade-satélite de Taguatinga. O Trio Paranoá também mantinha um programa da Rádio Nacional de Brasília, nas manhãs de domingo, o Brasília Canta Para o Brasil. Torres dava canja por lá.
A 12 de junho de 1972, Torres fundou o Trio Siridó. E já se vão quase 40 anos! Era esta a formação inicial, que foi a mais duradoura: Torres do Rojão, vocalista e triangueiro, Mocó, zabumbeiro, e Djaci, sanfoneiro. É o conjunto que domina a maioria dos arraiais forrozeiros no Planalto Central durante o período junino. No restante do ano, vira-se como pode. Apresenta-se em bares, boates, restaurantes, churrascarias e em shows de artistas de fora que visitam Brasília. Como, aliás, aconteceu em 5 de julho de 1982, no último espetáculo de Jackson do Pandeiro que, vítima de enfarte no dia seguinte, já no Aeroporto para retornar ao Rio de Janeiro, faleceu no Hospital Santa Lúcia no dia 10. Podemos afirmar, sem medo de erro, que este conjunto é filhote do Trio Paranoá e seu sucessor na Capital da República, sem rival que se lhe emparelhe.
No tempo do vinil, o Trio Siridó gravou 7 elepês, todos com boa vendagem nas casas do ramo: Progresso da Mandioca, Que Nem Sapo na Lagoa, Até o dia Amainsá, Eu Sou de Lá, Flor Mulher, Forró em Maceió e Quero Te Balançar. Na era do CD, a coisa se complicou. Seus discos passaram a produção independente, e a gravação de cada álbum é um parto com muita dor, só possível com a colaboração de seus amigos mais chegados, que nos quotizamos em vaquinha para a consecução da empreitada. Em meu acervo, possuo todo o repertório desses elepês.
Luiz Berto em muito contribuiu para essa história da sobrevivência do Trio. Em 1984, empresariou show dançante a que deu o título de Forró Pisa na Fulô, onde, semanalmente, se apresentava uma atração forrozeira nacional e global, com o Trio Siridó fazendo a prata da casa e carregando o piano.
Ainda nos Anos 1980, Luiz Berto, como Diretor Social da ASCADE - Associação dos Servidores da Câmara dos Deputados, deu uma sacudida naquele então vetusto clube, promovendo forrós semanais com a animação do Trio Siridó. Foram noites memoráveis, que se acabaram tão logo Luiz Berto deixou o cargo. Fez história e deixou saudades!
Em 1992, no quintal de Luiz Berto, na Asa Norte, num dos nossos domingos forrozeiros, que duravam por todo o dia, o Torres, a toda hora, mencionava bela senhorita, chamada Socorro, ali presente, que lhe dera a mão e outras coisinhas mais, em momento de muita atribulação financeira. Surgiu, então, o desafio de que fosse composta uma música, no ato, com o seguinte tema: Na hora da precisão, Socorro me socorreu. Foi trabalho a 8 mãos. Quase entrei na parceria, mas não me pediram a revisão gramatical. Nem precisava. No final, saiu o excelente xote Anjo da Guarda, destes inspirados gênios: Torres, Luiz Berto, Giba e Kalango.
Dois vinis do Trio Siridó à venda em mercados virtuais
A história da autoria de Anjo da Guarda já foi melhor contada por um de seus protagonistas, o Papa Berto I, a seu modo, em duas ocasiões: no dia 05.11.08, sob o título De Como Me Tornei Compositor, e no dia 08.03.09, sob o título Conversa de Domingo, desta vez com o Trio Siridó interpretando-a.
O conjunto não se ateve só às glórias do passado. Soube adaptar-se aos novos tempos, à tecnologia, enfim, ao Século XXI. Com o atual esquema Trio Siridó e Banda, imprimiu nova roupagem ao som e à cozinha rítmica, sem, no entanto, perder a autenticidade, a pureza e a fidelidade às suas raízes nordestinas, ao legítimo forró pé-de-serra. Esta é sua composição atual: Torres do Rojão, Dico na Sanfona, Cipó na zabumba e Taciva e Valdinei nos vocais, além de outros no teclado, nas cordas e na percussão.
Detalhe do Trio Siridó e Banda
Este é o repertório mais conhecido do Trio Siridó:
Para vocês, pequena amostra do trabalho do Trio e Banda:
Lembrando o Nordeste, rojão de Torres do Rojão, Mocó e Djaci, com o Trio Siridó em sua formação original.
Eu Sou de Lá, rojão de Cecéu:
O Forrozeiro, arrasta-pé de Cecéu:
Flor Mulher, xote de Djaci, Degas Muniz e Cid Maciel:
Recordando o Nordeste, rojão de Djaci, Luiz de Lima e Geny:
Plano Piloto, rojão de Alceu Valença e Carlos Fernando:
Raimundo Floriano
Trio Paranoá: Miudinho na zabumba e Nino ao centro
Foto inédita - Acervo de Dona Sinhá, viúva do Miudinho
O Trio Paranoá foi o primeiro conjunto forrozeiro da Capital da República. Sem medo de errar, afirmo que foi o segundo a surgir no Brasil, depois do Trio Nordestino, formado por Dominguinhos, Zito Borborema e Miudinho, que durou do começo de 1957 até meados de 1959.
O Trio Paranoá formou-se no ano de 1958, na Cidade Livre – atual Núcleo Bandeirante –, que foi criada antes da construção de Brasília, como parte das obras de infra-estrutura necessárias à concretização do grande sonho de JK. A Companhia Urbanizadora da Nova Capital - Novacap abriu, no fim de 1956, as principais avenidas da Cidade Livre que, devido não contar com habitação para todos os que para cá acorriam, foi sofrendo invasões e, em 1960, já contava com 12.000 habitantes. Eram, principalmente, os pioneiros candangos que trabalhavam na construção da cidade, em sua maioria nordestinos.
E foi num parque de diversões da Cidade Livre que os componentes do Trio se conheceram e decidiram formar o conjunto. Na verdade, eram 4 os integrantes, com a denominação de Nino e Seu Trio Paranoá. Por isso, em sua homenagem, o Trio gravou o samba Cidade-Mãe, composição de Vira-Vira e Antônio Soares.
Esta era a formação do conjunto: Nino Braçanã, de Monteiro (PB), no vocal, Antônio Veles da Silva, o Seu Antônio, de Campina Grande (PB), na zabumba, Edinho Maia na sanfona e Zé do Xaxado no triângulo.
O Trio Siridó, conjunto forrozeiro mais duradouro de Brasília, do qual aqui falei no dia 9 deste mês, é filhote dileto do Trio Paranoá.
Durante os tempos pioneiros, o Trio Paranoá atuava num programa na Rádio Nacional, nas manhãs de domingo, denominado Brasília Canta para o Brasil, que, naquele período de precariedade nas comunicações, não só apresentava músicas, como enviava notícias dos candangos para todos os cantos do País.
Inicialmente, o Trio Paranoá gravou dois compactos simples, com apenas duas faixas, uma de cada lado. O primeiro trazia Baião de Cartola, baião de José Vieira, e Pirão Gostoso, rancheira de Eronides de Souza e Luiz Diana; o segundo, Quero Voltar, toada de João Alves de Oliveira Sobrinho, e O Casamento da Carolina, xote de Antônio Livino.
Embora a gravação dessas faixas tenha saído posteriormente, elas já faziam parte do repertório do Trio Paranoá desde os primeiros programas. O Casamento da Carolina era seu cavalo de batalha, tocado em todas as edições de Brasília Canta Para o Brasil. E, por isso mesmo, selecionei-a para levar ao conhecimento da Comunidade Fubânica.
Tempos depois, o conjunto gravou seu primeiro LP, Brasília Canta Para o Brasil, com estas 12 faixas:
01 - Orgulho de Uma Nação, de Ortêncio Aguiar e Teixeira Filho
02 - Meu Sonho Lindo, de João de Oliveira e Arlindo Vieira
03 - Maria Rosa, de Miudinho e Walter Pinheiro
04 - Aprendi na Capitá, de Sesse Souza e Nuninho Santos
05 - Nós Três e Meu Cavalo, de Venâncio e Zé do Baião
06 - Rosa Bonita, de Poerame de Lima e Romeu de Lima
07 - O Casamento da Carolina, de Antônio Livino
08 - Duas Flores, de João Oliveira e Arlindo Vieira
09 - Sargento Benedito, de Barra Limpa e Chico Gil
10 - Visitando o Canindé, de Antônio Livino e Joaquim Lins
11 - Tudo É Meu, de Luiz Salvador e Joaquim Lins
12 - Na Sombra do Boi, de João Thomé
Capa repaginada do primeiro LP
Em maio de 1968, o Trio Paranoá gravaria seu segundo LP, Foguete Baiano, hoje ainda encontrável no merca do virtual, cujas 12 faixas aí vão:
01 - Foguete Baiano, rojão de Aurino Sant’Ana das Neves, o Tira-Teima
02 - Sombra do Cajueiro, coco de Nino Braçanã e Antônio Bispo
03 - A Volta do Mata-Sete, xote de Fernando Silva e Cosme do Amaral
04 - Saudades de Belém, rojão de Fernando silva
‘ 05 - Mariazinha, coco de Paulo Gitirana, Josilima e Pechincha
06 - Terreiro de Fulô, arrasta-pé de Paulo Gitirana e Josilima
07 - Zé Modesto, baião de Miudinho
08 - Progresso da Bahia, coco de Raimundo Dantas
09 - Noite de São João, marcha de Bruno Linhares
10 - Cidade-Mãe, samba de Vira-Vira e Antônio Soares
11 - Uma Prece Para os Homens Sem Deus, rojão de Gordurinha
12 - Pagode Alagoano - baião de Venâncio e Januário
Capa original do LP Foguete Baiano
Paralelamente a sua atuação na Rádio Nacional, Nino inaugurou e manteve por muitos anos primeiro espaço forrozeiro noturno do Distrito Federal, o Forró do Nino, na cidade-satélite de Taguatinga. Era ali que se congregavam todos os curtidores do Forró, com danças, espetáculos, apresentação de conjuntos e cantadores nordestinos, verdadeira curtição para uma região com poucas opções de lazer.
Permitam-me contar lance acontecido no Forró do Nino. No início dos Anos 70, em certa noitada, presentes o amigo e escritor Luiz Berto – que ainda não era Papa – e eu, casa lotada, começou tremendo bafafá, com dois brabos do pedaço se pegando, um corre-corre danado. Mas não havia perigo de facada nem de bala perdida. Os cabras usavam para se agredirem armamento do mais inusitado: uma porta! E era portada num, portado noutro, até que chegou o Freitas, cearense baixinho, forte e invocado, segurança competentíssimo, que não quis nem ouvir conversa: lascou sonora chapuletada no pé do ouvido de cada um dos contendores, os quais desembestaram na carreira, acabando-se o rebu. Com o Freitas era assim: primeiro a porrada, depois, a apuração dos fatos.
Trio Paranoá em festa na Granja do Torto
Foto inédita - Acervo de Dona Sinhá, viúva do Miudinho
Hoje, o Trio Paranoá é saudade. Assim como Forró do Nino, que não sobreviveu á onda avassaladora que varreu cenário artístico brasileiro, com o rock, a jovem guarda e a TV comandando tudo isso.
A música que lhe apresento aqui, O Casamento da Carolina, não é a mais bonita do repertório do Trio Paranoá. Foguete Baiano, por exemplo, de nosso amigo Tira-Teima e já disponibilizada aqui pelo Papa Berto, seu compadre, é gostosa interpretação. Mas o xote O Casamento da Carolina, além de caracterizar o início da vida candanga, é peça raríssima, só disponível mesmo aqui, a partir dagora, neste furo de reportagem. É uma citação. Veio no rastro de O Cheiro da Carolina, xote de Zé Gonzaga e Amorim Roxo, gravação de Luiz Gonzaga, o Rei do Baião, no ano de 1956. Ouçam-no, com outros sucessos do Trio:
O Casamento da Carolina, xote de Zé Gonzaga e Amorim Roxo:
A Volta do Mata-Sete, xote de Fernando Silva e Cosme do Amaral:
Foguete Baiano, rojão de Arino Sant’Ana das Neves, o Tira-Teima:
Noite de São João, arrasta-pé de Paranoá Bruno Linhares:
Quero Voltar, toada de João Alves e Oliveira Sobrinho:
Sombra do Cajueiro, coco de Nino de Braçanã e Antônio Bispo: