Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Violante Pimentel - Cenas do Caminho sábado, 12 de setembro de 2020

A VILÃ (CONTO DA MADRE SUPERIORA VIOLANTE PIMENTEL, COLUNISTA DO ALMANAQUE RAIMUNDO FLORIANO)

 

 

A VILÃ

Maria Linhares, 69 anos, mulata, alta e um pouco gorda, era dona de uma vila de quartos de aluguel, no bairro da Ribeira, em Natal, década de 70 do século passado.

Muito moralista, com voz firme e forte, tinha suas regras. Alugava quartos somente a casais sem filhos. Às 22 horas, fechava o portão de ferro do “condomínio”, com um cadeado e ninguém mais entrava, salvo se arrodeasse e pulasse o muro.

De acordo com o seu regulamento, era proibido se tomar banho nos quartos, pois na vila só havia um pequeno banheiro coletivo, onde se levava água em um balde. Ali também havia um aparelho sanitário, feito de tijolos e coberto por uma tábua, onde circulavam baratas por dentro e por fora. Nos quartos, sempre apareciam escorpiões, prontos para atacar. Era um ambiente muito pobre e insalubre.

De pouca conversa, Maria Linhares vivia pensativa e triste, com os olhos fixos no nada, em que o destino a transformou. Quem a conhecesse nessa altura da vida, não poderia imaginar o passado criminoso que ela escondia.

Pois bem. Na mocidade, essa mulata bonita, descendente de angolanos, fora empregada doméstica e protagonista de amores e tragédias. Apaixonou-se por Daniel, o filho do seu patrão e os dois viveram uma aventura amorosa clandestina, que, somente para ela, foi um amor fatal. Meses depois, chegou-lhe aos ouvidos a notícia de que o rapaz estava noivo de uma jovem de nome Arlete, e o casamento já estava marcado.

Desesperada, a mulher passou a odiar a jovem Arlete e a paixão que sentia por Daniel tornou-se uma obsessão, mesmo o rapaz tendo posto um ponto final no caso.

Como cozinheira da casa dos pais de Daniel, Maria Linhares também foi encarregada de cuidar da casa nova, já mobiliada, onde ele e Arlete iriam morar depois de casados.

Arlete trabalhava numa loja do futuro sogro, na Rua Dr. Barata, no Bairro da Ribeira. Morava com os pais, irmãs e a tia Otília, jovem e solteira, sua amiga e confidente, no bairro da Cidade Alta. Levava uma vida tranquila e feliz, com o casamento já próximo.

Fingindo querer agradar, Maria Linhares sugeriu a Arlete que fosse até a casa nova, para ver a mobília comprada por Daniel e dar sua opinião sobre a arrumação.

Muito ingênua, a jovem prometeu que logo iria.até lá. Não imaginava que a empregada fosse apaixonada por seu noivo e já tivesse havido um caso entre eles.

A jovem, então, combinou com a tia Otília para, no sábado vindouro, na volta da praia, irem até à sua casa nova, para ver a mobília que Daniel havia comprado.

Na manhã do sábado, 24 de outubro de 1942, Arlete e a tia Otília, depois do banho de mar na Praia do Morcego, hoje Praia do meio, se dirigiram a pé à casa nova, na Av. Getúlio Vargas, esquina com a Rua Joaquim Fabrício, no alto do bairro de Petrópolis.

A empregada as esperava ansiosa, e expressou grande alegria ao vê-las. Arlete resolveu entrar no banheiro, para tomar um banho de água doce, e tirar do corpo o sal da água do mar.

Quando Arlete entrou no banheiro, imediatamente, Maria Linhares chamou Otília para ver a garagem. Lá, as aguardava um homem do tipo lombrosiano (tipo de pessoa com as características físicas definidas por Cesare Lombroso, como sendo as do criminoso nato) e aspecto apavorante. O homem agarrou Otília, enlaçando seu pescoço com um pano e apertando o laço, ajudado pela empregada, e sufocando a jovem, até matá-la por estrangulamento. Com a ajuda de Maria Linhares, o corpo de Otília foi, rapidamente, arrastado e jogado na vala que já estava cavada no fundo do quintal.

Depois de alguns minutos, Arlete saiu do banheiro e chamou pela tia. Maria Linhares respondeu, atraindo-a para a garagem e dizendo que ela e Otília estavam lá. E a jovem dirigiu-se à garagem. Logo à porta, o monstro avançou para ela, que deu um grito de pavor, ouvido pelos vizinhos. Mas, imediatamente, seu grito foi abafado com um pano enlaçado ao seu pescoço, que a sufocou. Novamente, com a ajuda de Maria Linhares, o laço foi apertado até matar Arlete estrangulada, como acontecera com a sua tia Otília.

O cúmplice de Maria Linhares, após o estrangulamento, despojou o cadáver de Arlete das joias que ela estava usando. Tirou-lhe os anéis, o relógio e, do pescoço, tirou um trancelim de ouro.

Era essa a sua paga, pela participação no crime de vingança, arquitetado por Maria Linhares, sua grande amiga.

Em seguida, os dois assassinos deram início à “cerimônia” do enterramento dos cadáveres. Ao pé do muro do quintal, já haviam cavado a areia frouxa do morro, e já estava feita a vala, que supunham ser a última morada das duas jovens, Otília e Arlete. Ao enterrarem o cadáver de Otília, deixaram, também, na cova, os óculos que ela usava.

Lançaram areia sobre os corpos, cobrindo-os completamente, e deixaram o quintal sem qualquer vestígio do enterramento.

A única testemunha desse duplo e bárbaro homicídio foi o cajueiro, de sombras amplas em todo o redor.

Os dois assassinos cuidaram de espalhar folhas do cajueiro sobre a cova. O caso estava consumado.

Depois de terminado o ritual macabro, o cúmplice se retirou, levando consigo as joias que embolsara. E Maria Linhares foi logo cuidar de lavar o chão da garagem e apagar as manchas de sangue que ficaram.

No dia seguinte, domingo, o cúmplice voltou a procurar Maria Linhares, para devolver as joias, pois, em todas estava gravado o nome de Arlete. Não poderiam ser vendidas. Em troca, ele exigiu da mulher um alto valor em dinheiro.

Tudo continuava em segredo, e os dois assassinos estavam certos de que, dentro de pouco tempo, o caso cairia no esquecimento. Achavam que a impunidade deles estaria garantida.

Mas o crime, cedo ou tarde, seria descoberto, pois os vizinhos da casa nova onde iriam morar Arlete e Daniel, viram a entrada das duas jovens, mas não viram a saída. Além disso, o grito de pavor de Arlete, ao ser atacada pelo monstro, foi ouvido por algumas pessoas.

Maria Linhares cumpriu a pena de 33 anos de reclusão, na Penitenciária de Natal. Confessou seus crimes, denunciou o cúmplice Felinto Saldanha, e inocentou Daniel, o noivo de Arlete.

Maria Linhares, no Rio Grande do Norte, foi a primeira condenada que cumpriu integralmente a pena que lhe foi aplicada pela Justiça.

Em Natal, naquela época, o nome “Maria Linhares” virou um dogma de maldade e perversidade satânica.


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