Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Marcos Mairton - Contos, Crônicas e Cordéis domingo, 01 de janeiro de 2023

AINDA O VÍRUS (CRÔNICA DE MARCOS MAIRTON, COLUNISTA DO ALMANAQUE RAIMUNDO FLORIANO)

 

AINDA O VÍRUS

Marcos Mairton

 

Escrevo no dia 9 de novembro de 2020. Quase oito meses atrás, publiquei uma crônica na qual falei do modo de vida que havia adotado após a chegada da pandemia do coronavírus ao Brasil.

Na época, diante dos fatos noticiados na imprensa a respeito do assunto, anunciei as metas que norteariam a minha conduta. A meta principal: não contrair a doença. A meta alternativa: contraindo-a, não a transmitir a ninguém.

Também comentei, na referida crônica, o quão diferente havia se tornado uma simples ida ao supermercado. Falei de luvas, álcool em gel e cuidados com a desinfecção dos produtos adquiridos. Práticas que repentinamente haviam sido incluídas no meu cotidiano.

Não falei de máscaras, porque estas apenas se incorporariam ao nosso vestuário semanas depois. Menos pelas tentativas de imposição dos governos, e mais pela nossa crença nas opiniões dos especialistas, divulgadas a toda hora nos meios de comunicação.

Aqui no Brasil, somente em julho entraria em vigor a Lei Federal 14.019/2020, tornando obrigatório o seu uso, mas a depender de regulamentação a ser estabelecida pelo Poder Executivo federal.

Desconheço se houve tal regulamentação. Sei que, mesmo antes da publicação da Lei 14.019/2020, já se tinha notícia da edição de decretos estaduais e municipais estabelecendo punições a quem circulasse sem máscara em espaços públicos. Tenho dúvidas quanto ao valor jurídico desses decretos, ante o disposto no art. 5º, II, da Constituição Federal:

II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

Mas meu objetivo aqui não é fazer uma análise jurídica da suposta obrigatoriedade do uso de máscara no Brasil. Talvez faça isso em um futuro breve, mas não hoje. Hoje, minhas reflexões não estão no dever-ser das normas jurídicas, e sim no ser-e-acontecer do dia a dia.

Porque na semana passada fiz algo que há meses não fazia: fui almoçar em um restaurante. E ainda me é estranho ver mesas deliberadamente deixadas vazias, para que os comensais mantenham-se distanciados; observar pessoas usando máscara enquanto caminham entre as mesas; ter a temperatura do corpo medida na chegada ao estabelecimento.

Medidas que talvez estejam funcionando. Afinal, nos últimos três meses, apesar da reabertura de inúmeros estabelecimentos comerciais, há uma nítida tendência de queda na quantidade de novos casos e novos óbitos confirmados no Brasil por COVID-19.

Fonte: G1

Por outro lado, pode não ser nada disso. Pode ser que esses números estejam caindo simplesmente porque muita gente já foi contaminada e muita gente já morreu. A tal imunização de rebanho. Quem sabe? Embora reconheça a minha imensa ignorância na área, cada vez que tento ler sobre o assunto, encontro informações desencontradas e até contraditórias.

Então, o que me resta é observar o que acontece ao meu redor.

Olhar as pessoas em volta e imaginar quem entre nós carrega consigo o corona vírus. Nas mãos, nas roupas, na sola dos sapatos, nas entranhas… Quem de nós é seu hospedeiro? Quem de nós já o teve em suas células e hoje ostenta a tão sonhada imunidade? Talvez permanente, talvez temporária…

No restaurante, semana passada, ficamos certos de que a nossa mesa estava livre dessa presença non grata, porque a jovem que nos atendeu teve o cuidado de espalhar álcool na superfície de madeira. Mas como saber se eu mesmo não levei o vírus comigo, na minha própria roupa ou no meu telefone celular?

O fato é que ele pode ter grudado no meu tênis da última vez que saí para passear com meu cachorro – ou no cachorro mesmo – e estar atualmente no tapete da minha sala. Ou no sofá, ao meu lado, enquanto vejo um jogo de futebol na TV.

O leitor que chegou até este ponto tem motivo para pensar que, se até aqui escapei do vírus, não consegui me defender de uma psicose. E agora ando por aí assustado, sentindo pavor de um inimigo invisível, que me espreita a cada passo.

Curiosamente, isso não acontece. Depois de sete meses dessa nova realidade que o vírus nos impôs, entristeço-me com as centenas de milhares de famílias que perderam seus entes queridos, mas me sinto bem mais sereno em relação ao risco de contrair a doença e sofrer os seus tão variados efeitos.

Continuo mantendo os cuidados com a lavagem das mãos e o uso do álcool nas compras do supermercado, mas sem a tensão dos primeiros meses. O trabalho em regime de home office continua me permitindo sair de casa apenas quando necessário, mas essas saídas já não causam tanto estresse.

Como se o novo corona vírus fosse (e parece que é) apenas mais um ser que compartilha conosco a vida na superfície do nosso planetinha azul. Um ser que tem antecipado a morte de muitos da nossa espécie, e dá sinais de que pode continuar a fazer isso por um tempo cuja duração ainda se desconhece. Mas sobre o qual estamos a cada dia aprendendo mais.

Pode ser que em breve tenhamos uma vacina. As notícias mais recentes apontam para isso, nos enchendo de esperança. Mas também pode ser que demore. Pode ser até que nenhuma das que estão sendo testadas funcione satisfatoriamente.

Independentemente de alguma dessas possibilidades se tornar realidade, o que me parece cada vez mais claro é que a suspensão de atividades econômicas vai se tornando uma providência cada vez menos viável. E de eficácia duvidosa. Se nos primeiros meses da pandemia o “fique em casa” fez sentido, o fato de o número de óbitos vir decrescendo após a reabertura do comércio pode indicar o contrário.

Quem pode afirmar essas coisas com certeza?

Imagino que, para quem teve alguém da família morto pela COVID-19, deve ser bem tenso entrar em um trem ou ônibus, para se deslocar para o trabalho ou voltar para casa. E tantas outras coisas que já foram simples, mas hoje envolvem risco para a saúde e até para a vida.

Mas as pessoas precisam ganhar o seu sustento, e nem todos têm a possibilidade, de trabalhar em casa (como eu). Assim, cada vez mais as pessoas estão nas ruas. Não apenas no Brasil, mas no mundo todo. Jornais noticiam uma segunda onda do vírus na Europa, mas já não é tão fácil convencer as pessoas a se isolarem em casa.

No fim das contas, a espécie humana há de seguir o seu caminho. O vírus também.


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