Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

José Domingos Brito - Memorial quarta, 09 de junho de 2021

AS BRASILEIRAS: MARIA DA CRUZ

 

AS BRASILEIRAS: Maria da Cruz

 

 

 

 

Maria da Cruz Porto Carreiro nasceu em Penedo, comarca de Alagoas, na época pertencente ao bispado de Pernambuco, em princípios do século 18. Sabe-se que era filha do capitão-mor de Sergipe del Rei, Pedro Gomes de Abreu, e ficou viúva do paulista Salvador Cardoso de Oliveira, em 1734, quando passou a administrar a grande propriedade da família no sertão de Minas Gerais, local hoje uma cidade que leva seu nome: Pedras de Maria da Cruz. Foi uma mulher que não consta na lista das heroínas brasileiras, mas liderou uma revolta -“Sedição de 1736”-, conhecida na historiografia como “Motins do Sertão” contra os impostos de Portugal, que durou 5 meses e abalou o sertão daquelas plagas.

 

Sua história confunde-se com o mito criado em seu entorno, tornando-a uma figura emblemática na História do Brasil. Porém conta com dados obtidos em registros cartoriais e arquivos históricos que asseguram certa veracidade. Foi citada por Guimarães Rosa, numa passagem do romance Grande Sertão: veredas:  “Mas, dali por diante, eu queria encostar direto com as ordens de Titão Passos -Ele é meu amigo... Diadorim no meu ouvido falou- Ele é bisneto de Pedro Cardoso, transneto de Maria da Cruz”. Os primeiros dados biográficos encontram-se no livro História média de Minas Gerais, escrito em 1918 por Diogo de Vasconcelos e publicado pela Imprensa Oficial, apresentando-a como uma mulher independente, culta, corajosa e benemérita junto aos seus criados.

 

Tais dados são confrontados com outras histórias apresentando-a como “Maria da Cruz da Perversidade”, dado o rigor no trato com seus empregados e escravos. Estes dois retratos receberam um tratamento histórico mais apurado com a pesquisa realizada pelas historiadoras Angela Vianna Botelho e Carla Anastasia, que resultou no livro D. Maria da Cruz e a sedição de 1736, publicado em 2012 pela Editora Autêntica. Assim, é possível traçar um esboço biográfico mais condizente com a realidade. Na época Portugal intensificou os impostos cobrados dos garimpeiros nas “minas gerais”. Já havia imposto o “quinto dos infernos”, 20% da riqueza obtida na região e que resultou na “Revolta de Vila Rica”, comandada por Felipe dos Santos, em 1720.

 

Tal imposto não se aplicava ao sertão, que cobrava apenas 10% da produção local. Em 1735, a coroa portuguesa decidiu amentar os impostos no sertão, mas encontrou resistência na disposição de Maria da Cruz, que não admitiu a cobrança e liderou a “Sedição de 1736”.  O primeiro motim eclodiu em março no Arraial de Capela das Almas. O segundo se deu em maio no sítio de Montes Claros. Em agosto deu-se a batalha final com 900 homens, a pé e a cavalo, e 500 índios cativos armados com arco e flecha, que entraram no Arraial de São Romão, onde se deu o embate. Após 4 meses de lutas e muitas mortes, foi presa junto com o filho Pedro Cardoso, um dos líderes da revolta. Foram levados para Vila Rica e pouco depois para uma fortaleza no Rio de Janeiro, devido a importância dos presos e da revolta causada.

 

Aí ficaram presos mais de um ano e foram transferidos para uma fortaleza mais segura em Salvador, em 1738. Mãe e filho foram julgados pelo Tribunal da Relação da Bahia. Todos os bens da família foram confiscados e a penalidade do filho foi o degredo para a África, em Moçambique, onde reconstruiu a vida como rico minerador e tornou-se capitão-mor do Zimbábue. A mãe foi condenada a pagar uma multa de 100 mil réis e 6 anos de desterro na África. No entanto, pelo fato de ser mulher, viúva e já ter sofrido a perda dos bens, além das prisões em Vila Rica, Rio de Janeiro e Salvador, foi realizado um movimento em sua defesa com uma carta de clemência enviada ao Rei Dom João V. A pena foi comutada e  ela pode retornar ao povoado em 1739.

 

Mas o perdão real não impediu que seus bens permanecessem confiscados. No entanto, devido talvez à sua origem nobre e a intercessão de amigos e parentes distantes, a carta de perdão citava a possibilidade de reaver suas posses, assinalando que na "restituição às suas fazendas, use dos meios ordinários". Assim, anos depois, foi contemplada com uma “carta de sesmaria”, em 1745, medindo “três léguas e meia em quadra”. Ou seja, se uma légua equivale a 6 km., sua propriedade passou a conter “apenas”  21 km². Naquela época ainda era um sítio de bom tamanho e aí passou a viver com os 6 filhos restantes: 4 homens e duas mulheres, até 23/6/1760, quando veio a falecer.   

 

No livro de Diogo de Vasconcelos, ela é descrita como uma mulher bonita, alta e corajosa.  Em sua descrição, o autor caprichou na letra e criou uma obra literária cativante: “O tranquilo esquecimento apagou seu nome conservado apenas no velho e obscuro arraial, à beira do grande rio”. Ao descrever a pessoa, também não deixou por menos: “têmpera varonil não lhe tirava a natural doçura, e as maneiras de seu trato, realçadas pela posição, atraíam-lhe o afeto dos parentes e o respeito de todos”. Ao descrever o ato da prisão, produziu um texto comovente. Saiu de casa ao som do "alarido e pranto das mulheres, e da consternação de todos, imperturbável, com passo firme, contendo a dor que a enlouquecia, dirigiu-se ao porto pela mão do filho e saltou a barca... jamais traiu a própria dignidade, recolheu-se, porém, ao baldaquim, cerrou as cortinas e só aí se desfez em pranto".

 

Está visto que o autor, entre fatos colhidos e o mito criado, fez um retrato literário de dona Maria da Cruz, em 1918. Já o citado livro publicado em 2012, restabeleceu alguns pontos nebulosos da história clareando os fatos. Certamente este livro teve como fonte relevante a dissertação de mestrado, realizada por Alexandre Rodrigues de Souza, em 2011: “A dona do sertão: mulher, rebelião e discurso político em Minas Gerais no século XVIII”, apresentada na UFF-Universidade Federal Fluminense. A dissertação foi transformada em artigo - A rebelde do sertão. Maria da Cruz e o motim de 1736-, publicado na revista “Varia História”, vol. 29, nº 50, de agosto de 2013, e pode ser consultado no link https://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0104-87752013000200005


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