Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Coluna do Calixto - Onde Reminiscências, Viagens e Aventuras se Encontram domingo, 19 de fevereiro de 2017

DESCAMINHOS DAS ÍNDIAS - PARTE IV

DESCAMINHOS DAS ÍNDIAS - PARTE IV

(Mumbai – a Primeira Amostra da Índia)

Robson José Calixto

 

 

            E a “carruagem fantasma” partiu do aeroporto para mergulhar na antiga Bombaim dos ingleses, Mumbai. Vai para cá, vai para lá, curva para cá e curva para lá e nada chegar no Hotel que a companhia aérea o destinou para pernoitar até o dia seguinte, partindo cedo de volta para o aeroporto e retomar a viagem até Goa, destino final.

 

            Mas Mumbai não é qualquer cidadezinha da Índia, tem hoje cerca de 15 milhões de habitantes, sendo a maior e mais importante do país. Então há muita gente por lá, muita... e a “carruagem fantasma” o levou a conhecer seus detalhes.

 

            Pelas janelas sem vidro ou quebradas ele observou as pessoas, quer dizer multidões, caminhando pelas ruas num sentido e no outro. Pessoas sentadas em cadeiras na calçada, cortando cabelo e fazendo a barba. Outras agachadas no meio-fio, fazendo suas necessidades fisiológicas, comendo entre tendinhas ou panelões assentados sobre fogareiros. O aroma de especiarias tão comum na índia no ar.

 

            Numa praça ou algo sobro dela, dezenas de hindus sentados, ou melhor, empoleirados, olhando na direção da rua... do horizonte? Para os carros? Para o quê olhavam? O olhar fixo, às vezes parecendo baço, não, semivivo.

 

             A “carruagem fantasma” seguiu por aquele trânsito caótico, com veículos precisando de manutenção, com vidros quebrados, lanternas quebradas, alguns bambas, carregando um montão de coisas, com peso em excesso.

 

            Prédios antigos, parecendo com blocos de algum tipo de conjunto habitacional, só que depauperados, com lascas de tinta soltando, sujos. Alguns mais mantidos que outros, mas todos precisando de manutenção, um reviver. Ele questionou em sua mente se seriam ainda resquícios da colonização inglesa.

 

            As centenas de transeuntes circulavam pelas ruas. Mulheres de tom de pele mais carbonado carregavam sobre a cabeça, em uma espécie de travessa na forma de pequenas bacias de vime ou juta trançada, pedras no tamanho de pequenos paralelepípedos, levados para compor o refazimento de meios-fios, ou coisa assim, próximo ao que restava de calçadas. Sob um sol forte trabalhavam e suavam, independente disso seus cabelos negros lisos brilhavam e seus saris eram lindíssimos, delicados, arrumados.

 

            Outras varriam as ruas, meio curvadas, levantando ao ar, a terra o pó acumulado nas caçadas, nas ruas, utilizando-se de uma vassoura bem diferente das conhecidas no Brasil, quase um espanador em aba grande, de cabo mais curto, formado pela junção de fios vegetais amarrados. Essas vassouras são utensílios tipicamente femininos, associadas à veneração da Deusa Shitala, a das transições suaves e prosperidade.

 

Fonte: https://pt.dreamstime.com/. 

            De repente um barraco coberto por telhas de zinco, meio arriado. Em cima dele dezenas de vasilhames empilhados, em altura, talvez, duas vezes o tamanho da habitação. Ele reconheceu os vasilhames como aqueles utilizados no Brasil para transporte e aplicação de agrotóxicos. Sentiu um frio, um temor. Será que aqueles vasilhames teriam sido higienizados? Senão seriam um perigo para qualquer ser humano ter contato com seus resíduos internos. Lançados em corpo d'água... veneno.

          

 Deusa Shitala. Fonte: http://gaatha.com/brooms-of-india/.

             E o tempo passava e nada de chegar ao Hotel. Então, em inglês, lançou aos seus dois acompanhantes a pergunta: “- Quanto tempo leva para chegar ao hotel?”. Os dois olharam para ele. O condutor da “carruagem fantasma” olho para o garoto, que balbuciou: “- don't speak English”. Carácoles, ele estava viajando num ônibus todo ferrado, vendo cenas chocantes pela rua, longe do seu destino final, numa cidade desconhecida, indo para um Hotel que ele não sabia onde e com duas pessoas que não falavam inglês. Se algo lhe acontecesse ele é que estaria ferrado. Tentou controlar os nervos e ter paciência.

 

            Após mais uma curva, volta, ele chegou a um prédio grande, que parecia um Hotel. Por fora não estava muito ruim. Esperava que pudesse descansar, comer algo.

 

            Ele não tomou nota do nome do hotel. Perguntou ao recepcionista no balcão se se estava tudo incluído a ser pago pela companhia aérea. O recepcionista disse que sim. Foi conduzido ao quarto do prédio de vários andares. Tudo era atapetado. Sentiu mais forte o cheiro das especiarias indianas na instalação. O office boy entrou com as bagagens e parecia esperar alguma gorjeta, contudo, ele não tinha uma nota em moeda local. Tinha viajado com travellers cheques e algumas notas de dólar.

 

            Despediu-se e entrou no quarto. A cama era grande, os lençóis com uma cor acinzentada. A luz não era forte. Da janela não via muita coisa. Quando chegara viu, perto da entrada, alguns itens para visitantes à venda. Resolveu descer, pois precisava de algo para saber mais sobre a cidade de Mumbai, sobre costumes e aspectos culturais, sobre Goa e Índia, afinal, tudo o que se passava era deveras inesperado.

 

            Ao sair no corredor percebeu que estava sendo observador. Atrás de uma pilastra havia alguém. Notou que era um dos trabalhadores do Hotel. Voltou ao quarto e checou se estava tudo bem fechado. Voltou ao corredor. Seu observador mudara de posição, mas continuava por lá, firme e forte como as especiarias que dominavam a instalação.

 

            No local de venda achou um livro de viagem sobre a Índia em inglês. Resolveu comprá-lo. Dirigiu-se à recepção. Não aceitava dólar, somente a moeda local, rúpias. Então teve que realizar câmbio para adquirir o livro. Sobraram rúpias. Foi alertado que na saída do país deveria prestar contas sobre o câmbio e que deveria guardar o recibo da transação – Opa, algo a se tomar cuidado!

 

            Voltou ao quarto e percebeu que o observador estava próximo à porta do seu quarto. Cumprimentou-o. Entrou e verificando se tinha algo faltando. Não, deixara tudo trancado nas malas e nada por cima da cama ou criado-mudo etc.

 

            Leu o livro, que muito lhe seria útil adiante, em sua viagem. Mais tarde desceu para comer algo no restaurante. Viu o chapati e correu dele. As comidas disponíveis tinham aroma forte das especiarias. Tentou um arroz e algo que se aproximasse com a comida ocidental. Não quis se arriscar muito. Subiu para dormir, descansar, preparando-se para a viagem de volta até o aeroporto em sua “carruagem fantasma”. 

 

       Fim da Parte IV.

 

       Nota: Este não é um texto de ficção, mas baseado inteiramente em fatos reais, para uma realidade de janeiro de 2002.

 

 


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