Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Pedro Malta - Repentes, Motes e Glosas sábado, 02 de março de 2024

DOIS POEMAS DE CANCÃO (POSTAGEM COLUNISTA PEDRO MALTA)

 

João Batista de Siqueira, Cancão, São José do Egito-PE (1912-1982)

* * *

MEU LUGAREJO

Meu recanto pequenino
De planalto e de baixio
Onde eu brincava em menino
Pelos barrancos do rio
Gigantescos braunais,
Meus soberbos taquarais
Cheios de viço e vigor
Belas roseiras nevadas
Diariamente abanadas
Das asas do beija-flor

A terra da catingueira
Criada na penedia
Onde a ave prazenteira
Canta a chegada do dia
Planalto, ribeiro, prado
Onde até o próprio gado
Parece ter mais prazer
Terreno das andorinhas
Onde arrulham mil rolinhas
Quando começa a chover

A borboleta ligeira
Que desce do verde monte
Passa voando maneira
Roçando as águas da fonte
As aragens dos campestres
Pelas florzinhas silvestres
Atravessam sem alarde
Quando o sol se debruça
A Natureza soluça
Nas sombras do véu da tarde

Terreno em que os sabiás
Cantam com mais queixumes
Belas noites de cristais
Cravadas de vaga-lumes
Meus mangueirais magníficos
Por onde os ventos pacíficos
Atravessam mansamente
Verdes matas perfumadas
Nas lindas tardes toldadas
Das cinzas do sol poente

Esvoaçam, preguiçosas,
As abelhas pequeninas
Tirando néctar das rosas
Das regiões campesinas
Os colibris multicores
Pelos serenos verdores
Perpassam com sutileza
O orvalho cristalino
Lembra o pranto divino
Dos olhos da Natureza

Palmeiras que o rouxinol
Canta ainda horas inteiras
As auras do pôr-do-sol
Soluçam nas laranjeiras
A pelúcia aveludada
De muitas flores bordada
Desde o vale até o outeiro
Lugar em que cada planta
Soluça, sorri e canta
Pelos trovões de janeiro

Deslumbra a gente o encanto
Das borboletas douradas
Pousarem no róscio santo
Das manhãs cristalizadas
Fingem variadas fitas
De fato que são bonitas
Porém se fingem mais belas
Que a divina Natureza,
Por ter-lhes posto a beleza,
Deu mais vaidade a elas

Oh, noite de Lua cheia
De minha terra querida!
Lindas baixadas de areia
Princípios da minha vida
Lugares de despenhado
Onde gozei, descansado
Sombra, frescura e carinho
Bosque, vale, serrania
Lugares onde eu vivia
Em busca de passarinho

Os colibris delicados
Pelas manhãs de neblina
Passam voando vexados
Na vastidão da campina
Nos frondosos jiquiris
Dezenas de bem-te-vis
Elevam seus madrigais
Lugar que grita o carão
Olhando o santo clarão
Primeiro que o dia traz

As pequeninas ovelhas
Descem buscando o aprisco
Colhendo ainda as centelhas
Do sol ocultando o disco
Seguem pelas mesmas trilhas
Como que sejam as filhas
Dum pastor que lhes quer bem
Recebendo ainda as cores
Dos derradeiros rubores
Que o céu do oeste tem

Vivia sempre brincando
Fosse de noite ou de dia
Na alma se apresentando
Um mundo de poesia
Minhas queridas delícias
Aquelas santas primícias
Se passaram como um hino
Hoje só resta a lembrança
Do tempo em que fui criança
No meu torrão pequenino.

* * *

MINHA MENINICE

Foi-se meu tempo de flores
A data da inocência
Dos primeiros resplendores
Do sol da minha existência
Meu palacete dourado
Puramente bafejado
Das brisas celestiais
Felizes dias risonhos
Foram ilusões, foram sonhos
Que ao despertar não vi mais.

Estórias de belas vindas
De príncipes, reinos e fadas
Atrás de princesas lindas
Que ainda estão encantadas
Depois da hora da ceia
Ia saltar sobre a areia
Logo que a lua surgia
Sentia a má impressão
Olhando a sombra no chão
Fazendo o que eu fazia.

 

A fereza do chacal
Estórias da minha avó
As lendas de um animal
Que tinha uma perna só
De outras feras estranhas
Criadas lá nas montanhas
Que vinham sem paradeiro
Em tudo eu acreditava
E aquela noite passava
Sem sair mais no terreiro.

Ora com meu currupio
Ora empurrando meu carro
Seguia em busca do rio
Pra fazer bicho de barro
Na fronde dos ingazeiros
Passava dias inteiros
Em um balanço seguido
O meu pião de bom nome
Bastava só esse nome
Para ser mais garantido.

Vi as estrelas aos pares
Umas as outras unidas
Julgava ser luminares
De crianças falecidas
Pensava que os pirilampos
Fossem faíscas nos campos
Que vinham lá do penedo
Se a mãe-da-lua gritava
Eu muitas vezes ficava
Quase tremendo de medo.

As borboletas ligeiras
Que eu tanto perseguia
Nos ramos das goiabeiras
Todas manhãs que chovia
Com meu bodoque afamado
De canela de veado
Que um dia eu mesmo fiz
Me julgava o mais capaz
Debaixo dos braunais
Na caça dos bem-te-vis.

Estórias de um lobisomem
Que à noite vinha do mato
Na formatura de um homem
Tendo a cabeça de gato
Mais outro conto lendário
De um ancião solitário
Pai do Saci Pererê
Negrinho que foi criado
Correndo, espantando gado
Sem ninguém saber por quê.

O conto das açucenas
Que soluçavam na flora
O pastor que criou penas
Depois voou, foi embora
Outras lendas de um dragão
Que se criou no porão
De um oceano profundo
Um velho monge dizia
Que um dia ele saía
Pra devorar todo mundo.

Dizia um certo vizinho
Que tinha havido uma data
Ninguém andava sozinho
Por causa do pai-da-mata
Velho do corpo cascudo
Alto, seco e cabeludo
Com um só olho na testa
Á noite sempre saía
De manhã se recolhia
Num grotilhão da floresta.

Meus avós também diziam
Que em tempos de maré cheia
Os marinheiros ouviam
A canção de uma sereia
Era uma moça encantada
Fazia a sua morada
Em diversas regiões
Na hora em que cantava
Todo o mar se agitava
Sorvendo as embarcações.

Adeus, meu tempo ditoso
De amor, sorriso e meiguice
Das estórias de Trancoso
Dos dias da meninice
De meus tempos de criança
Hoje só resta a lembrança
Se acaso fizer estudo
Os tempos são soberanos
A marcha ingrata dos anos
Passa liquidando tudo.

O tempo em seu decorrer
Tudo desfaz e destrói
Depois, num mesmo poder
Tudo edifica e constrói
Em sua eterna pisada
Passando, deixa pra cada
Só o que for de razão
Não obedece a ninguém
Nos traz o mal e o bem
Só a meninice não.


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