Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Leonardo Dantas - Esquina quinta, 15 de novembro de 2018

FRNS POST, O PRIMEIRO PINTOR...

 



Foi Frans Post o primeiro grande paisagista erudito europeu que trabalhou em terras da América, o primeiro pintor flamengo a documentar em cores a paisagem brasileira, registrando também algumas paisagens da África, deixando uma vasta obra da qual chegaram aos nossos dias pouco mais de 160 quadros pintados a óleo sobre tela ou sobre madeira.

 

Nasceu Frans Janszoon Post na cidade de Haarlem, Holanda, em 1612, sendo filho do pintor de vitrais Jan Janszoon Post e de sua mulher Francyntie Peters, cujo casamento aconteceu em 1604, sendo ambos naturais de Leiden.

Era Frans o terceiro filho do casal, que tinha por primogênito Pieter Post, nascido em Haarlem em 1608, seguindo-se de Anthoni, nascido em 1610, e Johana, a caçula nascida em 1614, pouco antes do falecimento do chefe da família: Jan Janzoon Post.

Órfão de pai aos dois anos, tendo sua mãe se casado com Harman van Warden em 1620, de quem logo depois se separa, o menino Frans tem no irmão Pieter o seu primeiro mestre.

Pouco se sabe de sua formação acadêmica, tão somente que cresceu na cidade de Haarlem, uma das mais prósperas da província de Flandres, célebre por suas corporações de artistas.

Pieter Post (1608-1669), o mais velho dos irmãos, vem a ser discípulo do grande Jacob Van Campen, um dos mais renomados arquitetos do seu tempo, responsável pela construção da Mauritshuis (Casa de Maurício), na Haia, e frequentador da corte do Príncipe Frederico Henrique. Através dele é o jovem Frans apresentado ao Conde de Nassau, recém-nomeado Governador do Brasil Holandês, que o convida para acompanhá-lo em sua nova missão.

No Brasil, o jovem Frans Post tornou-se a memória visual do governador, transformando-se numa espécie de cronista da paisagem. Para isso acompanhou o Conde de Nassau em todas as suas viagens e campanhas militares, chegando até a registrar incursões de esquadras enviadas do Recife para a tomada das cidades de São Jorge da Mina, Forte Nassau, São Paulo de Luanda e ilha de São Tomé, na África.

Ao contrário de Pieter Post, o seu irmão Frans Post é constante na documentação da época, chegando a privar da lista de comensais do Conde de Nassau, no Palácio de Friburgo, a exemplo de uma datada de 1º de abril de 1643. Segundo revela José Antônio Gonsalves de Mello: “da lista constava ao todo 46 pessoas das quais 19 com empregados. Entre elas: Frans Plante, o doutor Piso, três fidalgos não identificados, Albert Eckhout e Frans Post, ‘pintores, ambos com criados’, o cartógrafo Georg Marcgrave, também com criado, etc.”.

O objetivo principal de Frans Post seria a documentação de cidades, vilas, povoações, costumes, construções civis e militares, cenas de batalhas navais e terrestres, que viriam a ilustrar um grande relatório das atividades do Governo do Conde de Nassau em terras da América, escrito por Caspar van Baerle e publicado em 1647.

 

Enquanto Albert Eckhout tinha por tarefa a documentação de tipos humanos, da fauna e da flora, a Frans Post cabia o “registro da paisagem das áreas sob o controle holandês, assim como as batalhas e as principais edificações construídas ou conquistadas pelos holandeses”. Concluem Beatriz e Pedro Corrêa do Lago que “para Nassau, o trabalho de Post deveria ser sistemático: documentar em quadros a óleo as principais sedes holandesas no Nordeste, com o intuito não apenas do registro topográfico como provavelmente também com o objetivo mais imediato de decorar a residência do conde, que desejava ter sob seus olhos as vistas principais de seus domínios”.

José Roberto Teixeira Leite, em longo estudo dedicado ao jovem artista, faz as seguintes observações acerca desse período:

Pode-se aquilatar o impacto emocional por que terá passado Post, acostumado à disciplina dos campos holandeses, banhados em suave luminosidade, ao se defrontar de inopino com a áspera vegetação tropical, povoada de seres insólitos, tudo sob uma luz escandalosamente intensa. A força e o ineditismo de tal impacto têm como conseqüência estancar, no artista setentrional, toda a capacidade criadora, e por isso, nos Trópicos, os amadores sentem-se mais à vontade que os verdadeiros pintores. É que os Trópicos são mais pitorescos que pictóricos, demasiados ricos, demasiados exuberantes [….] Nos quadros executados no Brasil conseguiu Frans Post traduzir todo o pitoresco, sem deixar de ser pictórico; daí o seu valor. E embora se subordinasse fielmente à realidade soube evitar o excesso de detalhes meramente esdrúxulo, aquele acúmulo de elementos curiosos que sobrecarregariam o quadro, comprometendo-o irremediavelmente.

A produção de Frans Post, durante sete anos no Brasil (1637-1644), particularmente em Pernambuco onde permaneceu a maior parte do tempo, prendia-se ao objetivo do Conde de Nassau de documentar a sua administração à frente do Governo do Brasil Holandês. Ele acompanhava todos os passos do governador, fazendo-se presente desde a tomada de Porto Calvo e andanças através da Ilha de Itamaracá (1637), seguindo-se da fundação do Forte Maurício, em Penedo (1638), da conquista do Rio Grande do Norte (1639), até o retorno ao Recife (1640). Cogita-se a sua presença nas expedições militares que saíram do Recife que foram conquistar povoações na costa da África Ocidental (Luanda, São Tomé e Gana ), em 1637, lembrando Sousa Leão que Frans Post poderia, também, ter visitado essas praças quando do seu retorno à Holanda, onde já se encontrava em maio de 1644.

A propósito dessa fase, conclui Erick Larsen, já ter se chamado Frans Post de “o Canaletto do Brasil” e também se escreveu que ele foi o primeiro paisagista ao ar livre deste país. É verdade, levando-se em consideração a qualidade artística de sua produção e excluindo-se a comparação com os cartógrafos ou outros artistas de menor competência”.

Paisagem da ilha de Antonio Vaz, segundo Frans Post (1641)

Concluídos os trabalhos de ilustração do livro de Gaspar Barlaeus, em 1645, Frans Post continuou produzindo em Haarlem, não mais voltando a trabalhar para o seu antigo patrono. Em 30 de novembro de 1644, ele já se intitulava “ex-pintor” (“gewesene Schilder”) de Johan Maurits, muito embora só venha ingressar como membro da Corporação de St. Lukasgilde de Haarlem, em 1646. Pondera, no entanto, Whitehead a necessidade de filiação de qualquer artista a uma dessas corporações; “era obrigatório para todos, exceto aos pintores da corte, de modo que ele talvez tenha permanecido por mais dois anos sob a proteção de Johan Maurits”.

Observa Sousa Leão, a transformação de Frans Post, após o seu ingresso na Lukasgilde, salientando:

A composição permanece a mesma, mas o do primeiro plano avoluma-se em tufos espessos, povoados de animais e salpicados de notas exóticas – pássaros ou gravatás – um arranjo de cenário, em que sobressai de um lado, a palmeira ou o mamoeiro, para acentuar a cor local e a autenticidade. Emprega uma gama variada de tons. Concentra a luz sobre o fundo da paisagem. As figuras, em escala menor, perdem a rigidez contrafeita, espalhando-se pelo quadro, indicadas com pinceladas rápidas e nervosas, como os perfis das palmeiras que se esfumam contra horizontes mais luminosos. O que sua obra perde em originalidade e força, ao amaneirar-se deste modo, ganha em mestria e virtuosismo.

Na Lukasgilde, corporação onde já atuava o seu irmão Pieter Post desde 1623, Frans Post vem a ser um dos membros atuantes, tendo ocupado a função de Procurador (vinder), 1656-57, e Tesoureiro, entre 1658-59. Em 1645 foi seu irmão, Pieter, nomeado arquiteto da corte, passando a trabalhar para o Príncipe Guilherme II de Orange. Também para esse príncipe trabalhou Frans, que, em 7 de setembro de 1650, “recebeu 300 florins por um quadro representando várias cidades de Sua Alteza, na Borgonha”. No catálogo de 1764 do Castelo de Honsholredijk, estão relacionados sete trabalhos por ele assinados, três dos quais vistas do Brasil.

Casando-se em 27 de março de 1650, na igreja de Sandvoort, com Janneteye Bogaert, veio a ser pai de três filhos: Anthoni, nascido a 10 de janeiro de 1655; Jan, a 12 de março de 1656, e Rachel, a 4 de janeiro de 1660. Sua mulher, também natural de Haarlem, onde residia na Koninckstraat, era filha do Prof. Salomon Bogaert. O casamento durou apenas 14 anos, pois em 7 de agosto de 1664 já se encontrava viúvo.

As cores do Brasil

Fiel ao que aprendera com seus mestres holandeses, “o sentimento do espaço e a preponderância do céu”, Post vem a ser dominado pela paisagem dos trópicos, particularmente pela luz que incidia diretamente na orquestração cromática, do tipo verde – azul/verde – azul, do formulário flamengo. Ao voltar para a Holanda, em 1644, jamais se desapegou da paisagem brasileira e, graças aos esboços que pôde elaborar nos seus sete anos de Brasil (1637–1644), ele compõe os seus quadros cheios de cores e elementos tropicais. Os esboços da paisagem e de detalhes outros, produzidos anteriormente para o Conde de Nassau, foram decisivos na criação dos seus novos quadros, com temas brasileiros, pintados entre 1647 e 1669. Sem o antigo compromisso do documentarista, a produção desse período reúne um documentário iconográfico da maior importância, registrando a arquitetura civil e religiosa, como também a militar, a fauna e a flora, tipos humanos e elementos outros da maior importância para o conhecimento da paisagem seiscentista do Nordeste brasileiro, merecendo de Joaquim de Souza Leão a observação:

Post pintava com pinceladas ligeiras. Só as folhas das árvores destacam-se recortadas com um pouco mais de empasto. Irradiam em todas as direções, subtraídas à ação do vento. É certo que ele preferia representar no primeiro plano as ramagens duras da flora da caatinga. As folhas do mamoeiro são as que melhor lhe saem: empastadas, reluzentes, em relevo sobre o resto da vegetação.

A preparação da madeira era feita com pincel fino e a camada preliminar nem sempre branca, o que concorreu para escurecer com o tempo muito quadro. Alguns parecem pintados diretamente sobre a madeira, tão ligeira era essa camada, que lhe deixa ver os veios. Tal foi, aliás, a maneira de pintar do tempo – o apogeu da arte holandesa – que assegurava a regularidade da superfície, uma das exigências acadêmicas.

Criou, assim, seu próprio estilo. Os seus anos no Brasil, em contato direto com a natureza primitiva, longe dos estúdios e da paisagem européia, lhe transformaram num artista singular, à margem dos grandes holandeses do seu tempo – Segher, Ruidael, van Goyen – que, vivendo ao redor de Rembrandt, copiavam sua técnica e eram influenciados pela mesma temática. As pinturas de Frans Post mais se assemelhavam com as de Koninck, particularmente pelas planícies verdes flutuando no horizonte, e com as de van der Hagen, “de quem terá imitado a concatenação das ondulações do terreno e das matas, de modo a formar a alternância regular de manchas claras e escuras, características de sua obra final”.

Conclui José Roberto Teixeira Leite:

Resumindo a evolução artística de Frans Post, podemos afirmar que, superada a fase documental dos quadros realizados no Brasil, vencida a preocupação pelo exótico e pelo pitoresco dos produzidos imediatamente após o retorno à Holanda, conseguiu o pintor afinal harmonia entre forma e cor e a equivalência entre o conteúdo e seu equivalente clássico, para evocar a paisagem brasileira, da qual seria o intérprete primeiro, num clima de intenso lirismo. O artista leva de vencida o artesão, a sensibilidade impõe-se ao virtuosismo, o repórter cede lugar ao poeta.

No final da vida, porém, Frans Post tornou-se alcoólatra. A solidão, com a morte da mulher e o afastamento dos amigos, em muito contribuiu para o abreviamento dos seus dias. Os excessos do vício minaram sua capacidade criadora, contribuindo para a decadência e mediocridade de seus trabalhos. Foi o álcool que o impediu de assistir à entrega dos seus próprios quadros, em 1679, a Luís XIV, Rei de França, negociados que foram pelo Príncipe João Maurício de Nassau.

Em carta datada de 9 de janeiro de 1679, o agente financeiro de Johan Maurits, Jacob Cohen, é taxativo: “o velho Post, que ainda vive, seria a pessoa mais indicada, mas está de tal modo desmoralizado e degradado pela bebida, e tão trêmulo, que seus amigos o consideram inapresentável ao Rei”.

Morreu Frans Post em Haarlem, a 18 de fevereiro de 1680 e foi enterrado na Groote-Kerk daquela cidade. Cinco dias após o seu passamento, o Curador de Órfãos dá poderes a Bastiaen Wendels, tio, e Johannes Post, primo, para na qualidade de testamenteiros venderem os bens do falecido a fim de pagar as suas dívidas e “fazer tudo o que mais coubesse em benefício da filha menor, Greetie [Rachel?] Post.”.

Frans Post mereceu a honra de ser um dos pintores de sua época retratados por Frans Hals (c.1581-85 – 1666), um dos importantes retratistas do seu tempo, ao lado de Rembrandt e Vermeer. O retrato seria reproduzido em gravura por J. Suyderhoef, pintado entre 1650 e 1660, veio a ser considerado uma obra-prima, “um chiaro-oscuro à maneira sutil de Rembrandt.”

Em gravura originada do retrato de Frans Hals, gravada por J. Suyderhoef, existente no Albertinum de Viena, na margem inferior, encontra-se escrito em tinta dourada, em grafia da época: “François Post peinctre de prince Mauriti Gouverneur des Indes Occidentales.”

Na sua biografia de Frans Post, o embaixador Joaquim de Souza Leão encontra no quadro de Hals a descrição da própria personalidade do retratado:

Um quarentão de espessa face bonachona e cabeleira hirsuta, o olhar penetrante e bem humorado, sob o negro feltro de copa afunilada. Pelo esmero no trajar – a mão enluvada denotando trato social e boas maneiras – diríamos um bom burguês endinheirado. Mas as sobrancelhas arqueadas, os olhos bem separados, de quem sabe ver, explicam o artista delicado e minucioso que na obra revelou-se. Se é pouco o que se sabe do seu curriculum vitae, resta-nos, por sorte, a imagem física e psicológica do homem, captada pelo mágico retratista da Holanda social.


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