O missionário jesuíta Gabriel Malagrida, mártir da fé em Portugal, tem sua presença ligada à vida religiosa da primitiva Vila de Igarassu quando, na primeira metade do século XVIII, ajudou o padre Miguel Rodrigues Sepúlveda na construção do Convento do Sagrado Coração de Jesus, casa matriz da Ordem do Sagrado Coração no Brasil.
A Igreja do Sagrado Coração de Jesus de Igarassu e seu convento anexo são frutos da inspiração e esforço do padre Miguel Rodrigues Sepúlveda, sacerdote de origem abastada, nascido na nessa vila por volta de 1699.
Na execução do seu projeto de apostolado da fé, o padre Miguel Rodrigues Sepúlveda recebeu influência do padre Antônio Fialho, vindo em 1735 iniciar a construção de uma espécie de retiro dedicado à vida religiosa masculina.
Cinco anos depois, inspirado no seu exemplo, um grupo de mulheres da vila de Igarassu passa a sonhar com a construção de outro recolhimento, desta feita destinado ao sexo feminino. Neste último seriam reunidas viúvas, moças solteiras e mesmo prostitutas arrependidas que se obrigassem a viver sob os rigores da clausura.
Por essa época visitava Igarassu o jesuíta Gabriel Malagrida, cuja missão apostólica visava à construção de recolhimentos religiosos para homens e mulheres em diversas cidades brasileiras. Contando com a inestimável ajuda desse missionário, o padre Manuel Rodrigues Sepúlveda iniciou, com aquele jesuíta, uma grande peregrinação pelo interior das capitanias de Pernambuco e da Paraíba em busca de doações visando à construção do recolhimento feminino de Igarassu. Após um ano de suas andanças, volta o padre Sepúlveda e logo inicia a construção do convento cuja primeira parte estava concluída em 1º de março de 1742, quando as vinte primeiras noviças entram na posse do novo prédio.
Por sua vez, o padre Gabriel Malagrida veio a ter participação destacada na vida religiosa do Brasil, particularmente como responsável pela fundação de várias casas, como o Seminário de São Luís do Maranhão (1753), o Seminário de Nossa Senhora das Missões de Belém (1753), o Convento de Nossa Senhora da Piedade de Salvador (1741) e o Seminário de Salvador (1747).
Regressando à Lisboa, Gabriel Malagrida entrou em conflito com o Marquês do Pombal, por ocasião do grande terremoto de 1º de novembro de 1755, época em que publicou um opúsculo – “Juízo da verdadeira causa do terramoto de Lisboa” –, onde atribuía às culpas morais e ao Estado a responsabilidade daquele terrível sismo que veio a arrasar toda a cidade.
Preso em Setúbal (1756), por ordem do Marquês do Pombal, então secretário de Estado do Reino, foi denunciado à Inquisição, por crime de sedição, heresia e sacrilégio. Condenado à fogueira pelo Tribunal do Santo Ofício, foi executado no largo do Rossio, quando do último auto-de-fé promovido em Portugal, em data de 20 de setembro de 1761, transformando-se em mais um mártir da fé.¹
Em Igarassu, o pequeno recolhimento que ele ajudara a levantar, logo se tornou insuficiente para abrigar o grande número de noviças que para ele afluía.
Inconformado com o prédio do recolhimento, o padre Manuel Sepúlveda inicia a construção de um templo anexo destinado aos serviços religiosos das noviças que, para tal, não precisariam ausentar-se da clausura.
Reunindo recursos das mais diversas fontes, notadamente das esmolas que recolhia, deu início às obras da Igreja do Sagrado Coração de Jesus, cuja pedra fundamental vem a ser assentada pelo bispo Luiz de Santa Tereza no ano de 1747, prolongando-se a construção até 30 de janeiro de 1758, quando da solene sagração pelo bispo diocesano Francisco Xavier Aranha.
Até o ano do seu falecimento, em 1768, o padre Miguel Rodrigues Sepúlveda dedica todos os seus esforços e patrimônio à orientação espiritual e provimento do recolhimento do Sagrado Coração de Jesus de Igarassu. Com o seu desaparecimento, o convento entra em decadência e, em 1850, como fruto desse abandono, toda a parte fronteira ao claustro e respectivo teto vêm a desabar. A restauração do prédio arruinado veio a ser efetivada pelo missionário capuchinho frei Caetano de Messina que, com a ajuda da população, reergueu a frente do claustro em vinte dias. E com o dinheiro arrecadado entre os fiéis e partes das loterias, autorizadas pela lei provincial de 16 de abril de 1854, providenciou grandes reparos em todo o edifício conventual que foram concluídos no ano seguinte.
Atualmente, o prédio do convento possui dois pavimentos, na parte da frente, com janelas com vergas ligeiramente curvas no pavimento superior e abaixo porta ladeada por duas janelinhas, óculos ao longo da parede e mais adiante, caminhando-se em sentido oposto à igreja, encontra-se o portão do antigo colégio com frontão arqueado, monograma e pináculos.
A Igreja do Sagrado Coração de Jesus apresenta frontispício, dividido em três seções. A seção central com as três portas almofadadas que dão acesso à nave, sendo a porta do meio mais alta e larga que as suas laterais e têm frontão trabalhado acima das vergas curvas na altura das três janelas rasgadas por inteiro com sacadas de ferro. Acima da cimalha o frontão central, com cornija formada por curvas e contracurvas, traz o monograma da ordem, pináculos e cruz. Em 1855 deu-se início à construção da torre sineira, que fica à direita do observador. A segunda nunca foi concluída e é coroada por um frontão simples e pináculos. Tanto as janelas como as portas da torre e meia torre apresentam as mesmas características das janelas e portas da seção central.²
O conjunto encontra-se inscrito como Monumento Nacional no livro das Belas Artes v. 1, sob o n.º 400, 25 de maio de 1951; Histórico v.1, n.º 287, em 25 de maio de 1951 (Processo 359-T/45).
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¹ RUBERT, Arlindo. A igreja no Brasil. v. 3. Santa Maria (RS): Pallotti, 1988. p. 216.
² CARRAZONI, Maria Elisa. Op. cit.