Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Leonardo Dantas - Esquina quarta, 02 de agosto de 2017

JOSÉ MINDLIN - UMA SAUDADE

De repente, ele deu adeus de mansinho e lá se foi do nosso convívio. Era domingo, 28 de fevereiro de 2010,  quando de Gustavo Krause recebi a notícia ainda em pleno almoço.

Em dezembro de 2000, quando do ingresso no século XXI, nós comentávamos com graça em encontro no Rio de Janeiro, que, a partir de então passaríamos a ter a mesma idade, “éramos homens e mulheres do século passado”…

De repente, no videoteipe da memória, uma amizade constante de pouco mais de três décadas passou a ser recordada nos seus momentos mais alegres e tocantes.

A minha amizade com José Mindlin é fruto desses encontros proporcionados pelo destino, ao longo de toda uma vida dedicada aos livros; afinidades que se encarregam de nos unir e tudo em volta passa a ter aquele gostinho de eternidade.

Os livros, no seu silêncio, possuem alma e estão sempre a procurar por seus donos e  a unir amigos, transformando vidas e aglutinando bibliófilos.

Assim foi com José Mindlin. Em 1977, havia eu editado o livro Diario de um soldado da Companhia das Índias Ocidentais 1630-1632 (¹) , escrito por Ambrosius Richshoffer no século XVII, dentro da primeira fase da Coleção Pernambucana, desenvolvida por mim no Departamento de Cultura da Secretaria de Educação e Cultura do Estado de Pernambuco, entre 1975 e 1979. Coincidiu que, neste mesmo ano, recebi a edição francesa deste mesmo livro, impressa numa reduzida tiragem de 250 exemplares, com ilustrações valiosas, sob a orientação e bom gosto de um descendente daquele autor.

A nova edição francesa logo despertou o interesse do bibliófilo José Mindlin que, sabedor de que eu possuía o nº 221, com uma simpática dedicatória assinada pelo editor Frédéric Richshoffer, apressou-se em pedir a um amigo comum a possibilidade de eu, desfazendo-me do meu exemplar, o repassasse para sua biblioteca.

Com bom humor, respondi ao nosso amigo que “a melhor coisa é dispor na nossa estante de um livro que José Mindlin deseja para sua biblioteca…”.

Com graça José Mindlin respondeu: “Pensei tratar-se de um editor, mas vejo que estou diante de um bibliófilo…”.

Assim consolidou-se a nossa amizade em torno dos livros; amizade esta que, em tudo, tinha o sabor da eternidade.

Tornou-se assim uma convivência constante, com longas conversas telefônicas nas manhãs dos sábados, trocas de livros, garimpagens em bibliotecas particulares, e encontros habituais no Recife e  em São Paulo.

Quando eu ia a São Paulo, hospedava-me em sua casa da Rua Princesa Isabel, e ele, por algumas vezes, esteve no Recife ficando comigo na “Pensão da Rua Marquês de Maricá”. De certa feita, em 26 de fevereiro de 1999, ele me trouxe um livro com a “Colleção completa de Máximas pensamentos e reflexões do Marquez de Maricá”, Mariano José Pereira da Fonseca (1773-1848), edição de Eduardo e Henrique Laemmert (Rio de Janeiro, 1850), trazendo um cartão com a seguinte dedicatória: “Leonardo, meu caro, aí vai a sabedoria do Marquez de Maricá, juntando-se à rua, o Recife terá uma nova Academia. Um abraço amigo do José”.

Era uma amizade alegre, cercada de bom humor, com conversas de grande conteúdo, registrando até um seu telefonema de Praga, numa chuvosa manhã de domingo, só para trocar idéias sobre elementos de arquitetura barroca existentes na capital da República Tcheca.

Foi ele, por algumas vezes, Grande nos seus gestos para com Pernambuco:

Em 1996, depois de tomar conhecimento de que a primeira edição do livro de José Antônio Gonsalves de Mello, Gente da Nação – Cristãos-novos e Judeus em Pernambuco – 1542-1654, publicada por mim através de subscrição popular em 1989 encontrava-se esgotada, ele conseguiu do banqueiro Joseph Safra os recursos necessários para uma segunda edição, com a sua apresentação. (²)

Quando lhe foi oferecida à compra da Biblioteca de José Antônio Gonsalves de Mello em 1999, ele ponderou afirmando que tal acervo deveria permanecer em Pernambuco, graças à importância dos seus títulos e anotações para a história local.

Devido a sua ponderação e recomendação do conteúdo, a biblioteca na sua totalidade veio a ser adquirida um ano depois pelo industrial Ricardo Coimbra de Almeida Brennand que a conserva, aberta aos pesquisadores, no seu instituto em terras da Várzea do Capibaribe.

Em 2004, ao adquirir toda a coleção das gazetas pernambucanas e outros jornais ao Instituto Ricardo Brennand, José Mindlin concordou com a microfilmagem de todos os exemplares originais. As cópias do microfilme de toda coleção encontram-se hoje no Instituto Ricardo Brennand (Recife), na Hemeroteca da Fundação Joaquim Nabuco,  restando ainda uma terceira para a Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Com essas cópias micro filmadas o acesso à informação fica facilitado a todos os pesquisadores interessados naqueles atribulados anos de nossa história política e social.

As coleções desses jornais, parte deles do período anterior à Independência do Brasil (1822), foram adquiridas pelo Instituto Ricardo Brennand (Recife), em novembro de 2003, juntamente com outros impressos dos séculos XVIII e XIX, que os repassou para a Biblioteca de Guita e José Mindlin no ano seguinte. O acervo é originário da hemeroteca do historiador pernambucano Alfredo de Carvalho (1870-1916), autor da obra Annaes da Imprensa Periódica Pernambucana de 1821-1908 (Recife 1908), e encontrava-se preservado com carinho pela família do contabilista Leopoldo Luís dos Santos por quase um século.

Na coleção se encontram quinze exemplares avulsos do primeiro jornal a circular em Pernambuco, o Aurora Pernambucana, iniciado em 27 de março de 1821, tendo por redator o escritor português Rodrigo da Fonseca Magalhães (1787-1858); este casado em Pernambuco com Inácia Cândida do Rego Barreto, filha do governador Luís do Rego Barreto (1817-1821).

Além dos primeiros números desse jornal, o acervo em questão possui ainda às coleções dos seguintes periódicos: Segarrega, iniciado em dezembro de 1821, 24 edições; Relator Verdadeiro, 1821, reunindo seis edições; Gazeta do Governo Provisório [instituído quando do rompimento de Pernambuco com Portugal], um único número, 1822; Gazeta Pernambucana, 1822, reunindo dezoito edições; O Escudo da Liberdade, 1823, duas edições; O Marimbondo, 1822, coleção completa com cinco edições; Gazeta Extraordinária do Governo, 1822, dois exemplares; Diario da Junta do Governo, 1823, oito edições; Diario de Pernambuco, a partir de 1829, reunindo seis edições; Bússola da Liberdade, 1832, seis edições; O Velho Pernambucano, 1833, reunindo sete edições; A Cotidiana Fidedigna, 1834, reunindo 6 edições; O Azorrague, 1845, reunindo 49 edições.

Trata-se da mais rara coleção de jornais pernambucanos já reunida por um particular, com direito a capitulo especial no primeiro volume da obra Destaques da Biblioteca InDisciplinada de Guita e José Mindlin, organizada pelo próprio José Mindlin em 2005. Vários daqueles jornais, aqui relacionados, são únicos. Não se sabendo da existência de alguns desses originais nem na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, Arquivo Nacional e muito menos no Arquivo Público do Estado de Pernambuco, sendo vários deles desconhecidos até pelos que se dedicaram à  História da Imprensa no Brasil.

Além das gazetas pernambucanas, a coleção em questão possui também jornais de outras partes: A Gazeta do Rio de Janeiro (n. 104/1822); Jornal do Commercio  do Rio de Janeiro (n. 1 e n. 8/ 1827); Cidade do Rio, n. 221, 1889; Jornal de Princesa, Paraíba, número único 11 de junho de 1930; Gazeta de Lisboa, n. 221 de 18 de setembro de 1819; Cabichui, jornal paraguaio de 1867 narrando a vitória de Solano Lopes contra as forças imperiais brasileiras.

Pernambuco não lhe faltou em vida. Um gesto apenas, originário da Direção Regional do SESC, demonstrou a José Mindlin a nossa gratidão, por sua simpatia e dedicação aos nossos interesses culturais. Na Praia da Piedade, em município fronteiro ao Recife, Jaboatão dos Guararapes, uma biblioteca tem hoje o seu nome: Biblioteca José E. Mindlin. Inaugurada em 22 de março de 2002, com o seu retrato, pensamentos e algumas de suas obras, ela lá está a lembrar às novas gerações a importância deste que foi por toda vida “um amigo dos livros”.

Durante toda sua existência, ele cumpriu à risca o ensinamento de Michel de Montaigne (1533-1592) – Não faço nada sem alegria -, daí ter escolhido tal pensamento para o selo do seu Ex Libris e assim contagiar os seus amigos com o vírus da bibliofilia.

Ele se foi com a sua alegria, nos deixando órfãos de sua presença e de seu constante incentivo, frustados com a perda daquele sentimento de eternidade que nós pensávamos que nos iria acompanhar até o fim dos nossos dias.

____________

1) RICHSHOFFER,  Ambrósio.  Diário  de  um  soldado  da   Companhia  das Índias Ocidentais 1629-1632. Tradução de Alfredo de Carvalho. Apresentação de Leonardo Dantas Silva. Prefácio de Ricardo José Costa Pinto. Recife: SEC, Departamento de Cultura, 1977. 210 p. il. (Coleção  pernambucana;  1ª  fase,  v. 11 a). Fac-símile da. ed. Recife: Typographia a vapor de Laemmert  & Comp., 1897.

2) MELLO, José Antônio Gonsalves de. Gente da Nação: Cristãos-novos e judeus em Pernambuco, 1542-1654. Apresentação de José E. Mindlin. 2.  ed. Recife: FJN, Ed. Massangana, 1996. 552 p. (Descobrimentos, n. 6). 


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