Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Coluna do Calixto - Onde Reminiscências, Viagens e Aventuras se Encontram domingo, 28 de janeiro de 2018

NÓS E O TEMPO

 

NÓS E O TEMPO

Robson José Calixto

 

 

Nossa percepção de tempo ocorre a partir da observação da evolução das formas. Contudo, não existe passado, não existe futuro, somente existe o presente. Assim, temos memórias, expectativas e o agora, este instante, nossa visão. O passado já passou, se escondeu, não existe mais, o futuro não existe, pois ainda está por ocorrer, procedendo do oculto, só o presente é que nos move. Isso não significa que não podemos evocar nossas memórias e, em diálogo mental, visualizá-las no presente. Também não significa que não possamos premeditar o futuro, com base nos sinais de nossas memórias e no que realizamos no presente, tão longo quanto à duração de um dia apenas.

Essas são as conclusões filosóficas e metafísicas de Santo Agostinho, Bispo de Hipona, que nasceu a 13 de novembro de 354, em Tagaste (atual Souk Ahras, na Argélia), Numídia, em um período que o poder romano e a fé católica já haviam se fundido.

Aurélio Agostinho era filho de Patrício, um pagão e africano romanizado, como o designam, quer dizer romano ou assimilado proveniente de uma porção da África, banhada pelo Mar Mediterrâneo, sob o domínio romano (Cartagena, Numídia, Mauritânias), que começou a 146 a.C.. Sua mãe, Mônica, que viria a se tornar Santa, era cristã e amava muito seu filho, se preocupando com seu futuro, pois ele tinha uma vida desregrada, libidinosa.

Pode-se se dizer, de maneira informal, que na juventude, Santo Agostinho era da "pá virada", um pecador. Com 18 anos, isto é, a no ano 372, século IV, torna-se Pai de Adeodato, filho de uma mulher que lhe era apaixonada, sem nunca casar com ela. Por volta dessa idade se interessa pela Astrologia, dá aula de gramática, só que acaba expulso de casa por Santa Mônica devido ao seu modo de viver, entre pensamentos não cristãos e libertinagem. Pela proteção de mecenas Romaniano, vez por outra Agostinho acerta seu caminha e lapida a forma consolidada que teria no futuro. Entre 32 e 33 anos sente uma vontade irresistível de voltar à fé de sua mãe e de se batizado, o que acontece com a benção de bispo Ambrósio e, a seguir, passando sete meses em retiro na Itália, com Adeodato, que também fora batizado em conjunto ao Pai.

Agostinho sofria de insônia, o que lhe permitiria meditar, refletir e escrever muito ao longo de sua vida. Em 388 Agostinho deixa Roma, na Itália, e se muda para Tagaste, na Numídia, fundando uma comunidade de oração e contemplação. Adeodato morre no ano seguinte. O bispo Valério precisa, em 391, de um padre que o ajudasse nos serviços da igreja. Agostinho é o escolhido. Quatro anos depois Agostinho é consagrado bispo e no ano seguinte (396) sucede Valério como bispo da diocese de Hipona (atual Annaba, Argélia). Santo Agostinho morre a 28 de agosto 430, século V, com 76 anos de idade. Foi canonizado e reconhecido como Doutor da Igreja, em 1292, pelo papa Bonifácio VIII.

Por suas análises alegóricas, filosóficas e metafísicas dos primeiros versículos do Livro do Gênesis sobre a Criação e o Tempo, incrível e extremamente profundas, relacionando-as com os primeiros versículos do Evangelho de São João, expressas na terceira parte do seu Livro Confissões, torna-se uma das principais colunas da Igreja Católica, sendo seus ensinamentos incorporados e ensinados em círculos de estudo mais fechados, por serem mais complexos, demandando imersão e meditação mais prolongada.

O que há tão especial nos escritos de Santo Agostinho? É que bem antes de Isaac Newton (séculos XVII-XVIII), Albert Einstein (séculos XIX-XX) e Stephen Hawking (séculos XX-XXI), sem equipamentos e sem desenvolvimento matemáticos, Agostinho lança luz e base sobre as relações hierárquicas que envolvem a matéria, os movimentos e o tempo, com o que percebemos fisicamente em nós mesmos, na natureza da Terra, no Universo e com o que nos supera, nos é superior. Inspirou muitos pensadores que viriam a seguir. Apesar das muitas facetas encontradas em seu livro “Confissões”, no presente artigo só abordarei a perspectiva do Tempo.

Voltando, então, ao assunto do tempo, para Santo Agostinho os acontecimentos do presente são meras flutuações no âmbito de algo maior, mais estável, eterno, sem começo e sem fim, tendentes a serem corrigidos para se tornarem bem, mesmo que sejam acontecimentos ruins, pois "Deus contemplou toda a sua obra, e viu que tudo era muito bom" (Gênesis, 1). Nós seres humanos é que necessitamos inerentemente das noções de pouco e muito tempo, para tanto servem como referência os "luzeiros no firmamento dos céus para separar o dia da noite", servindo, também, de sinais e para a marcação do "tempo, os dias e os anos".

Para mim essa necessidade provém da nossa fragilidade, por sermos susceptíveis à morte. É estranho, quando somos jovens a noção de tempo não nos permeia muito, como se tivéssemos uma eternidade pela frente, que nunca chega, e quando nos tornamos mais velhos, e quanto mais antigos formos, temos a sensação que o tempo está se esgotando, a areia da ampulheta está se esvaindo, não teremos mais um futuro destinado a nós mesmos, nos transformaremos em passado, algo a ser evocado nas memórias dos outros. Santo Agostinho aborda assim essa passagem: “E quanto ao presente, se permanecesse sempre presente e não se tornasse passado, não seria mais tempo, mas eternidade”.

Por isso, é tão importante ter-se a esperança de que um dia uma força motriz renovadora nos fará ressurgir dos mortos e nos levar ao encontro do sem tempo, daquele que se estende no eterno, na estabilidade do ser daquele que é, cuja vontade sábia e criadora é sempre presente no presente, e por igual é presente do passado e presente no futuro.

Pela observação das formas das coisas, em suas etapas, é que temos a noção de tempo. Um óvulo maduro e um espermatozoide se juntam, e juntos não são vida, mas são pedaços potenciais de vida. Energia, fusão, fecundação, ativação. Do nada é criada a vida, ainda sem forma, entretanto, os dias e as noites passam marcando o tempo - passado, chega-se a algo ainda sem uma forma claramente definida do que virá a se tornar - futuro, um potencial de ser humano, um feto do tamanho da cabeça de um alfinete. A seguir, pela quarta semana de gravidez, temos um embrião de onde surgem órgãos que demandam desenvolvimento. Depois músculos, células sanguíneas e ósseas, todavia o coração não está pré-formado, o que só ocorre pela sexta semana de gravidez e já tem batimentos. Aparecem os braços e as pernas, mas as mãos e os pés ainda não têm forma, ainda não estão desenvolvidos. Na oitava semana de gravidez o feto começa a apresentar características do que será um bebê: ombros, braços, nariz, já tendo estômago e intestino fino. Ganha movimentos dentro da bolsa amniótica, cérebro cresce e a capacidade de audição se amplia. Na décima semana, no terceiro mês, o bebê se apresenta e ganha tamanho. Na décima primeira semana os órgão sexuais externos começam a ganhar forma, mas ainda não se sabe o sexo. Na décima quarta o bebê é capaz de chupar o dedo. Na décima oitava, quinto mês, já se pode saber o sexo. No sexto mês o bebê já tem completamente formados os lábios, as sobrancelhas e as pálpebras. Na vigésima oitava semana, sétimo mês, a visão do bebê se aguça e consegue identificar com mais eficiência a intensidade de luz do ambiente, processo que se completará no oitavo mês, quando também começará o processo de envelhecimento da placenta - futuro. No nono mês o bebê já é capaz de produzir uma espécie de fezes (mecônio). Quarenta semanas de gestação – passado - e a mãe fica na expectativa de surgirem as contrações que expulsarão, em parto natural, o bebê do corpo dela - futuro.

Assim, em linha com Santo Agostinho, ocorre com toda criação, a partir de um nada, de um princípio, sem forma e com potencial de ganhar forma, definir-se. Atrevo a dizer que surge partir de uma ideia-desejo, de um princípio com capacidade de dar potencial para a sua definição de forma mais adiante, sucessivamente em processo de mudança, progressivamente, até não ter mais futuro, valia, importância, destinado a perecer, só ficar na memória dos outros.

E se Deus nos deu luzeiros para nos auxiliar na marcação dos dias, semanas e meses, do nosso tempo, das nossas oscilações no todo estável e contínuo, é porque foi Ele quem criou o tempo, é o Senhor do Tempo, do nosso tempo, permanecendo o mesmo. Ou como disse Santo Agostinho: “Criaste todos os tempos e existe antes de todos os tempos. E não existia tempo quando não havia tempo. (...) E não há um tempo eterno contigo, porque tu és estável, e se o tempo fosse estável não seria tempo”.

Vale observar que a vida já existia no Planeta Terra há bilhões de anos sem que o ser humano existisse e viesse habitá-la, portanto, o que já existia era muito antes de nós. Ademais, o Eterno já existia muito antes da matéria Planeta Terra ter sido criada, em forma não definida e imersa na escuridão. Daí, nossa projeção temporal, entre anos que vão e vem até virem todos, que se lança na esperança de um futuro, todavia será só um lapso, um quase nada, diante do espaço-tempo contínuo.

Mas o que é o presente? É o instante, é agora, nesta fração de momento, neste intervalo de micro de microssegundos, não o que passou, que já existe mais, nem o que virá, pois não existe ainda. Santo Agostinho assim o definiu: “Se pudermos conceber um intervalo de tempo que não seja suscetível de ser dividido em minúsculas partes de momentos, só a este podemos chamar de tempo presente”. Portanto, é um intervalo, algo tão infinitamente pequeno, que não teria extensão. Daí ele concluí que tempo é um tipo de extensão ou, nas palavras e entendimentos atuais, uma das dimensões. Se for extensão, então, nós poderíamos estendê-lo e viajar ao seu longo ou através dele, onde fosse permeável, mas só em sentido futuro, já que o passado não existe. Combinando essa possibilidade com a Teoria da Relatividade de Einstein e as Teorias de Stephen Hawking, se conseguíssemos viajar na velocidade da luz, daríamos “saltos” no tempo que estaria por vir, pois a cada dia viajando nessa velocidade corresponderia a um ano da Terra.

Porém, se Santo Agostinho concluí que tempo é um tipo de extensão, também conclui que não é o movimento dos corpos, estando em repouso ou não, pois referenciamos sua posição, fisicamente, a partir de um referencial estacionário (mecânica de Euler) ou vinculada ao corpo (mecânica de Euler), em relação tempo, por conseguinte não é tempo. Pode-se medir o tempo por meio de relógio ou a posição dos astros (“os luzeiros”), mas o que se mede fato?

Para Santo Agostinho os acontecimentos “vêm e passam”, não existem mais, tornam-se passado, e ressoam em nossas mentes, gravada na memória, prolongando-se. Algo instável, uma oscilação no contínuo, uma perturbação no eterno. Para Santo Agostinho o tempo se realiza em nossas mentes, é um produto de nossas almas, que estão vinculadas aos nossos corpos. Quando perdemos esse vínculo, acaba nosso tempo, pois somos passado e sem ecos, sem reverberações que nos prolonguem. Não há mais o que ser processado em nossas mentes, não há mais futuro que se torne passado. Ou seja: “O esforço presente transforma o futuro em passado, o passado cresce com a diminuição do futuro, até o momento em que tudo será passado, quando se consumar o futuro”.

Santo Agostinho interpreta que quando alguém diz que “vê” o futuro, não o faz, pois não se pode ver “acontecimentos ainda inexistentes”, “(...) mas sim as causas ou sinais precursores que já existem”, podemos “(...) predizê-los mediante os fatos presentes, que existem e que vemos”, quer dizer um futuro futurível. Em tese Santo Agostinho está bem certo, entretanto ele não explica como em sonhos algumas pessoas – que até conheço – são capazes de ver imagens mentais sobre situações imprevisíveis, acontecimentos inesperados, até mesmo diálogos a serem travados em futuro não muito distante. Santo Agostinho se diz incapaz de entender como isso acontece. Para mim é porque, quando isso acontece em sonho ou em premonição, estamos em alta conexão com nosso Anjo da Guarda, ou de outro Anjo enviado por Deus, como no caso dos Profetas.

Deus é o Senhor dos Tempos, criou o Tempo, sendo estável e eterno, mas Santo Agostinho igualmente reconhece que existem outras personalidades ou entes que participam da eternidade e imutabilidade de Deus, não são co-ternos com Ele, sendo mutáveis e não mudam, sendo superiores ao Tempo, estando fora do Tempo, que são os Anjos.

Com base nas conclusões metafísicas de Santo Agostinho, ratifico que a imaginação e o tempo corrigem a vida, nossas oscilações, porque tudo no Universo-Eterno ruma para o que é bom, estável, contínuo.

Brasília, 27 de janeiro de 2018

Este artigo foi escrito com base em:

- Santo Agostinho. Confissões. Paulus, 1984.
- Gravidez Semana a Semana – Tudo que você precisa saber sobre o Ciclo da Gestação
http://tudoparagravida.com.br/ciclo-da-gestacao/…. Acesso em 26 de janeiro de 2018.


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