Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Literatura - Contos e Crônicas domingo, 23 de janeiro de 2022

O ELEFANTE (CONTO DO MARANHENSE HUMBERTO DE CAMPOS)

O ELEFANTE

Humberto de Campos

 

 

 

Abu-Beker, o mercador opulento que espantava Bagdá com os esplendores do seu luxo, encontrou, um dia, entre as suas quatrocentas mulheres, uma, de beleza excepcional, que lhe enchera do vinho do desejo a bilha de ouro do coração. Chamava-se Kiusa, e sua língua era doce como uma tâmara. Adorando-a até o desespero, uma dúvida o atormentava, dia e noite, na suntuosidade do seu palácio: a dúvida de que aquele corpo era seu, apenas, e de que ninguém lhe violava, subornando os eunucos, a honestidade do gineceu. E foi atormentado que, um dia, se dirigiu à mesquita, e pediu, com o rosto em terra, soluçando versículos do Alcorão:

 

— Alá, tu, que abranges o universo com teu poder, consente que seja minha, unicamente, a esposa do meu amor. Eu tenho pensado, nas minhas vigílias aflitas, no meio de conservá-la virgem de beijos alheios; e encontrei um remédio: arrebatá-la para as montanhas, para os desertos, para as florestas que marcam os limites do mar, onde não haja outros seres senão eu e ela. Transforma-me, pois, na tua misericórdia, em um elefante soberbo e poderoso, para que eu atravesse, puxando o seu carro, as regiões desertas da Arábia!

 

Instantes depois, graças a um sortilégio comum nas terras do Crescente, saía as portas de Bagdá um carro suntuoso, tauxiado de ouro e forrado de púrpura, puxado pesadamente por um elefante. E foi de coração sossegado que Abu-Beker penetrou, transformado no monstruoso plantígrado, as florestas da Índia, arrastando pacientemente o carro do seu amor.

 

Certo dia, após uma viagem penosa e longa, o elefante parou de repente, desatrelou-se com o auxílio da tromba, e, abandonando os varais, deu volta em torno do carro, cuja entrada era por trás. E soltou um rugido de dor e de espanto: dentro, nos coxins que a sua opulência amontoara, deitavam-se enlaçados, Kiusa, maravilhosa de formosura, e bêbada de desejo, e, ao seu lado, beijando-lhe os olhos, Ebn-Ali, mercador de Alexandria! Ele tinha vindo, desde Bagdá, a puxar o carro dos dois amantes, que, dentro, se enlaçavam amorosos, enquanto ele, confiado e sereno, feria as patas pelo caminho!

 

Um barrido de desespero marcou o fim daquele encantamento humilhante. E era tornado homem, com o seu manto de mercador despedaçado pelos espinhos da viagem, que Abu-Beker gemia, com o rosto no solo.

 

— Alá, bendito sejas tu, na tua gloriosa sabedoria! Debalde tentarão os homens, mesmo com o teu auxílio, forçar as mulheres à honestidade, quando dias querem traí-los!

 

E debulhava-se em lágrimas, quando ouviu, de súbito, uma voz poderosa, que lhe disse:

 

— Mortal, aprende, tu mesmo, à tua custa, esta grande verdade; nenhum homem poderá, jamais, subtrair a mulher à traição, quando ela o queira enganar. O insensato que, como tu, trouxer, por prevenção, o leito às costas, terá, ao fim da viagem, uma surpresa dolorosa: verá que arrastou pelos caminhos, sem o saber, a mulher e o amante!

 

Abu-Beker levantou-se, enxugou os olhos, e, para esquecer, começou a ler o Alcorão.

 


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