PRECIPÚCIO
Raimundo Floriano
Tubaroa do Mestre Túlio, na visão das quengas
Precipício é sinônimo de grave perigo. Prepúcio é a pele que cobre a glande do pênis, ou seja, o popular couro de p*c@. Precipúcio, neologismo que acabo de inventar, vem a ser a empreitada em que o sujeito corre grande risco de ficar sem o prepúcio ou, até mesmo, de perder a própria p*c@, conforme adiante relatarei.
Aconteceu em meados dos Anos 50, em Teresina, Meu Xodó, terra de moças bonitas e piauizeiros cheios de presepadas.
Naquela época, havia por lá um mestre de obras muito caprichoso e requisitado, o Mestre Túlio, mulato manemolente, famoso na ZBM - Zona do Baixo Meretrício pelo desproporcional tamanho de seu possuído. Nos cabarés da Rua Paissandu e adjacências, era disputado a tapa pelas meninas que ali exerciam sua alegre profissão e enfeitavam as mil e uma noites da doce vida teresinense. Sua fama de bem-dotado correu mundo, inspirando os calemburistas a fazerem este trocadilho: não confundam a obra do mestre Picasso, com a p*c@ de aço do mestre de obras!
Fugindo um pouco do tema a que ora me proponho, contarei engraçado lance em que ele foi personagem. Havia na ZBM um gayzinho assumido, o Valbino, que prestava serviços no Quitandinha, na Raimundinha Leite e no Sete Tabacos, cabarés afamados. Sua figura não o ajudava. Feio, baixinho, corcunda, em muito se assemelhava ao famoso Quasímodo, o de Notre Dame. Um dia, ao defrontar-se com Mestre Túlio, falou:
– Vem cá, moreno, deita-te comigo, e eu te darei uma maravilhosa noite de amor!
Mestre Túlio se enfezou!
– Tu é besta, cabra safado, vê lá se eu me rebaixo a comer viado!
E o pobre do Valbino, humilde, entristecido, ficou a lamentar-se:
– Infeliz da mulher que tem a b*ceta nas costas!
Mas voltemos ao que interessa.
Chegou à capital piauiense a notícia de um negão etíope que estava fazendo furor em todas as cidades brasileiras por onde passava. Empautado com o capeta – assim diziam, ou o próprio tinhoso, como supunham alguns –, o negão, conhecido por Kudiferro, vinha desfiando todos os homens tidos como ajumentados a tentarem penetrar-lhe rabo adentro, no que ganhava muito dinheiro com as apostas, pois permanecia virgem como nascera. Ninguém jamais o conseguira!
Era inevitável que Kudiferro, com sua fama de cabaçudo, e Metre Túlio, com a de rompedor, não tardassem a cruza os bigodes para protagonizarem memorável tira-teima.
Isso aconteceu no Salão Cairu, ali na Rua da Glória – atual Lisandro Nogueira –, a um quarteirão do Mercado Municipal, administrado por João Molinho, que marcava o tempo no jogo de sinuca e tirava o barato – porcentagem ou parte das apostas que fica para o estabelecimento, no caso da sinuca, o dinheiro depositado na caçapa de 4 em 4 jogos.
Esse apelido era bem apropriado. João Molinho era um negro manhoso, andava maneiro, quase arrastando os pés, sempre com um cigarro no bico, com um detalhe: não tragava, e o cigarro permanecia com a cinza íntegra, queimando até o fim, sem ela cair, por artes de certa mágica que ele não ensinava por dinheiro algum.
O Salão Cairu ficou abarrotado de torcedores. O prêmio para o vencedor era o apurado nos ingressos, depois de retirado o barato, e também o apostado pelos contendores. João Molinho foi o juiz.
Começou o embate, os dois lutadores completamente pelados, com Kudiferro de quatro e, logo atrás dele, ajoelhado, Mestre Túlio, com a maçaroca envernizada, quase triscando no anel de couro do etíope. João Molinho, então, com toda a autoridade, comandou:
– Atenção, Mestre Túlio! Empurre o fumo!
Silêncio sepulcral!
Mestre Túlio cuspiu na mão, lubrificou a cabeça da mandureba e procedeu à estocada. O cacete envergou, mas não entrou. Mestre Túlio tentou novamente, com mais força, concentrado, e o resultado foi o mesmo. Cada tentativa chegava quase a produzir faísca, sem sucesso algum. Decorrida meia hora, Mestre Túlio suava às bicas, com a vara toda assada de tanto resvalar.
Foi quando João Molinho, o juiz, falou pro etíope:
– Seu Kudiferro, dê um peido na cabeça do cacete do Mestre Túlio, que é pra humilhar!
Kudiferro assim procedeu! E foi sua desgraça! No exato momento em que o peido estourou, Mestre Túlio agarrou-o pelas virilhas e enfiou o porrete! Entrou até a mata dos pentelhos, só ficando de fora os quibas! Kudiferro deu um berro tão estrondoso, que foi ouvido do Oiapoque ao Chuí. E gritou pra Mestre Túlio:
– Tira! Tira! Tira!
Mestre Túlio fez foi arrolhar mais ainda, ao que o negão ameaçou:
– Tira, senão eu me dano a botar fogo por tudo quanto é de buraco!
Ao que Mestre Túlio, vitorioso, retrucou:
– Você pode botar fogo pelos ouvidos, pelos olhos, pelo nariz, pela boca, pela piroca, mas aqui pelo c* não sai nem fumaça!
Mesmo assim, o empautado não se deu por vencido e exclamou, vingativo:
– Piauizeiro desgraçado, tu ganhou a aposta, mas perdeu o pau!
E arrochou o esfíncter!
O urro de Mestre Túlio reboou das Barrancas do Rio Parnaíba até os Mares do Caribe! Kudiferro acabara de decepar seu porrete, torando-o bem na marca da pentelhada! Acabou-se a disputa! Foi preciso um saca-rolha para extrair a p*c@ de mestre Túlio do fiofó de Kudiferro.
Depois disso, Mestre Túlio passou a urinar agachado. Quando o fazia em pé, era com o auxílio de um canudinho, pra não mijar nas calças.
Quanto a Kudiferro, sabe-se que voltou para a África e que, depois de deflorado, descabaçado no Piauí, e tendo gostado da coisa, passou a travestir-se e a atender vasta clientela na ZBM de lá, onde ficou conhecido por sua nova alcunha: Kudiouro!