Num passado não muito distante, aos secretários de redação dos jornais não bastava dominar os fundamentos da profissão. Era preciso ter vocação para carrasco. É lícito imaginar que, se eles pudessem, obrigariam repórteres e redatores novatos a colocar os joelhos sobre grãos de milho, por horas. Ou fariam, com satisfação, uso da palmatória. Eram (quase) todos eles adeptos da “pedagogia da porrada”. Ante a impossibilidade do castigo físico, partiam para a humilhação pública e verbal. Mandavam repórteres e redatores reescrever textos que rasgavam sem ao menos ter lido as primeiras linhas. E a justificativa era sempre a mesma: “Está um lixo”.
Nos anos 60, Ricardo Noblat era um jornalista em início de carreira. Época em que conviveu com o secretário de redação do Jornal do Commercio, no Recife. Segundo ele, Eugênio Coimbra Júnior “era um homem mau, muito mau”. Toda vez que ele convocava algum repórter ou redator à sua mesa de trabalho, a redação tremia. Humilhação à vista, grosseria na certa. Ninguém ria da desgraça alheia. Até porque muitos já haviam experimentado daquele fel. A historinha que segue foi extraída do livro “A Arte de Fazer um Jornal Diário”, de Noblat, editora Contexto.
Certo dia, Coimbra Júnior convocou um repórter:
– O senhor é casado? – quis saber o secretário de redação.
– Sou – respondeu o repórter, fazendo esforço medonho para se equilibrar sobre as pernas.
– O senhor tem certeza de que sua mulher o ama?
– Claro. Certeza absoluta. Nós nos damos muito bem.
– Tem certeza de que não é corno? – insistiu Coimbra Júnior, com a voz nas alturas, para que todos pudessem ouvi-lo.
– Minha mulher é honesta. Por que isso?
– É que o senhor começou o texto assim: “Pelo simples fato de ter encontrado sua mulher nos braços do amante, o comerciário a matou com três tiros…” Só um corno escreve uma coisa dessas. Pegar a mulher nos braços de outro lhe parece coisa pouca?
O pobre repórter tentou engatar uma justificativa:
– É que eu achei…
– O senhor não está aqui para achar nada, mas para narrar os fatos. Quando quiser sua opinião, eu lhe peço.
Coimbra Júnior, à sua maneira, passou a lição: não se mistura fato com opinião.