Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Leonardo Dantas - Esquina quarta, 12 de abril de 2017

OLIVEIRA LIMA, O HISTORIADOR POR EXCELÊNCIA

 



Em 1997, dirigia eu a Editora Massangana da Fundação Joaquim Nabuco quando, dentro da Série Descobrimentos, por mim dirigida, fiz entrega ao público ledor da terceira edição da primeira obra de Manuel de Oliveira Lima (1867-1928), Pernambuco seu desenvolvimento histórico, cujo primeira edição fora publicada em 1895 e a segunda em 1975…

Muito embora se tratando de um verdadeiro breviário da pernambucanidade, este primeiro livro de Oliveira Lima, escrito em Berlim e impresso em Leipzig em 1895, é apontado por bibliógrafos, do quilate de um Rubem Borba de Moraes, como texto básico e indispensável para o conhecimento da formação histórica do Norte do Brasil e muito especialmente para o entendimento daquilo que o autor denominou de “simpático caminhar” da gente de Pernambuco.

 

Nascido na cidade do Recife, em rua que hoje guarda o seu nome, a 25 de dezembro de 1867, Manoel de Oliveira Lima conviveu poucos anos em sua terra natal, pois, junto com seus genitores, se transfere em 1873 para Lisboa, onde vem a realizar os estudos que o levaram a optar pela carreira diplomática.

Apesar de distante, a paisagem pernambucana jamais lhe sairá da memória, como ele próprio, mais tarde, vem externar em suas Memórias (Rio de Janeiro: Recife, 1986):

De Pernambuco eu trazia recordações que em breve se fizeram vagas; um dia passado no engenho do meu cunhado Araújo Beltrão, onde eu passeara pela primeira vez a cavalo, montado na maçaneta e seguro por um escravo, porque até então a minha montaria fora um carneiro por nome Cadete; outro dia passado em Olinda, meu tio Quintino, que ali era juiz de direito e morreu presidente da Relação do Recife, à cabeceira da mesa servindo a sopa de uma grande terrina; a campina por trás de nossa casa, onde se erguiam coqueiros e por onde de quando em vez silvava a maxambomba. Na minha memória ficou porém gravada a figura de Dom Vital [1844-1878], com a sua bela barba negra de capuchinho que os seus adversários diziam lustrada à brilhantina, como diziam perfumadas a sabão de Houbigant as suas mãos aristocráticas. Era nosso vizinho, ficando-nos fronteiro o Palácio da Soledade e, quando saía a pé à tardinha, não raro entrava no nosso jardim e demorava-se a conversar com o meu pai, sentados os dois por trás do portão de ferro.

Pernambuco foi sempre a sua pátria primeira, aquela que, como um ferro em brasa, marca a alma e, para todo sempre, se transforma com o passar dos anos na ideia de céu que fustiga o inconsciente de cada um.

O meu gosto pelos assuntos históricos foi temporão. Fiz exame de história com 11 anos e meio e tão bem me saí que o presidente da mesa declarou que, se a lei previsse um prêmio em casos tais, este me caberia. Pelo desenho, pela música e pelo canto e porquanto exige talento manual nunca senti a menor aptidão e às matemáticas e ciências naturais fui sempre avesso que duas vezes fui reprovado em física com grande humilhação para meu pai, que não se queria capacitar da minha incompatibilidade congênita com a ótica, parte que num e noutro exame me caiu o ponto.

 

Para seu torrão natal foi dedicado o primeiro livro, um trabalho de juventude, publicado aos 28 anos, Pernambuco seu desenvolvimento histórico, editado em Leipzig, por F. Brockhaus datado de 1895, no qual se assina, “M. de Oliveira Lima, sócio correspondente do Instituto Archeologico e Geographico Pernambucano”, e faz a seguinte advertência ao referir-se à lista de escritores que compõem a bibliografia nele incluída:

Em todos procurei os fatos pernambucanos, dos quais tentei explicar a significação, relacionando-os com a marcha da civilização brasileira e prendendo-os com os acontecimentos do Velho Mundo, de que eles foram efeito ou reflexo. Em todo este trabalho animou-me sobretudo, e seja esta a sua recomendação, o amor à terra natal, pátria de tão generosos sentimentos, campo de tão dramáticas peripécias. Julgar-me-ei feliz se houver conseguido retratar lhe nas páginas que se seguem o simpático caminhar.

Berlim, 29 de junho de 1893.

Nunca a História de Pernambuco foi contada em tão curto espaço, com precisão de datas, fatos e, particularmente, causas que geraram as mais diversas situações. Escrito com apurado bom gosto, procurando traçar um paralelo entre os acontecimentos da história mundial com o “simpático caminhar” de sua província, utilizando-se para isso de uma linguagem fácil e amena, Oliveira Lima conseguiu compor uma verdadeira síntese, um autêntico breviário cívico do povo pernambucano. Ontem, como hoje, este manual de pernambucanidade continua assim a sua missão, a de lembrar às gerações que se sucedem os bravos feitos destes filhos de Marte em cujas artérias “corre sangue de heróis, rubro veio”.

A hegemonia de Pernambuco, no Norte, pode-se dizer-se em todo Norte, porque ainda a Amazônia se não desenhava, estabeleceu-se neste fim do século XVI. Pernambuco, que já dera o seu contingente de homens e mantimentos para a expedição de Estácio de Sá contra os índios do Rio de Janeiro, colonizou a Paraíba e o Rio Grande do Norte à custa de sangue seu, libertando do gentio estes territórios, e vê-lo-emos prosseguir a sua marcha civilizadora até ao Ceará e Pará, emancipar o Maranhão de uma brilhante ocupação francesa, e sacudir de todo o Norte o arraigado domínio holandês.

Em um só parágrafo, quando da abertura do quarto capítulo, Oliveira Lima define, com o poder de síntese que caracteriza os seus escritos, a importância da primitiva Capitania Duartina no cenário da historiografia nacional. Das nascentes do São Francisco à conquista da Amazônia, a influência da gente pernambucana se fez presente fincando as raízes formadoras da nacionalidade brasileira.

Hoje tudo não passa de recordações de um velho editor, responsável que foi pela segunda e terceira edição do primeiro livro de M. de Oliveira Lima: Pernambuco seu desenvolvimento histórico; hoje raridade, só encontrado pela internet, com auxílio do Google, em Estante Virtual.

Reencontrei-me com Manuel de Oliveira Lima em 1986, quando da publicação da segunda edição de Memórias – Estas minhas reminiscências que veio a integrar, com o prefácio de Fernando da Cruz Gouvêa, a segunda fase da Coleção Pernambucana (v. XXIX), impressa naquele ano sob o patrocínio da Diretoria de Assuntos Culturais da FUNDARPE – Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico Pernambucano.

Deixando Pernambuco em 1873, vai Oliveira Lima residir em Lisboa (Rua da Glória nº 23), onde vem realizar dos os seus estudos e iniciar-se na vida literária. Doutorado em Filosofia de Letras, pela Faculdade de Letras de Lisboa (1888), vem abraçar a carreira diplomática, onde ingressa em 10 de dezembro de 1890 como adido de primeira classe junto à Secção do Brasil em Lisboa.

Em 15 de outubro de 1891 casa-se, por procuração, com a pernambucana Flora Cavalcanti de Albuquerque, que vem a ser não somente sua companheira, mas sua incentivadora em sua agitada vida de diplomata e escritor.

Pernambuco esteve sempre ligado à obra de Oliveira Lima, como se depreende de sua bibliografia organizada por Neusa Dias Macedo, revista e atualizada por Fernando da Cruz Gouvêa; in Oliveira Lima – Obra seleta. São Paulo, 1971. P. 1018-1033.

A sua obra mais festejada veio a ser Dom João VI no Brasil (Tipografia do Jornal do Comércio. Rio de Janeiro, 1908. 2 v.). Este livro contou com uma reedição em 1945 (3 v.) e uma terceira edição em 1996 da TopBooks – Rio de Janeiro; editada por José Mário Rodrigues prefácio de Wilson Martins.

Dom João VI no Brasil vem a ser consagrado como a maior produção intelectual do século XIX, lembrando Octávio Tarquino de Souza ser ele “uma dos maiores livros de nossa historiografia”, apontando Gilberto Freyre como “uma das obras mais importantes, de qualquer gênero, jamais produzidas no Brasil”.

Dom João VI no Brasil abriu as portas da Universidade da Sorbonne (Paris) para Oliveira Lima, que ali pronunciou uma série de conferências sobre a Formação Histórica da Nacionalidade Brasileira, depois reunidas em livro sob o título Formation Historique de la Nacionalité Brésilienne (Paris,1911), considerado por Gilberto Freyre como o seu segundo melhor trabalho literário:

São talvez os dois melhores trabalhos que Oliveira Lima nos deixou. Em Dom João VI no Brasil revela o historiador todas as virtudes do seu poder de análise, que era extraordinário; em Formation Historique de la Nacionalité Brésilienne nos surpreende com um poder de síntese igualmente raro. Dificilmente se imagina um resumo dos fatos da formação nacional do Brasil, mais rico dos traços essenciais dessa formação e escritos de forma mais capaz de iniciar o brasileiro ou o estrangeiro no conhecimento do passado luso americano.

O livro em questão foi traduzido para o português por Aurélio Domingues, recebendo o título de Formação Histórica da Nacionalidade Brasileira, publicado com prefácio de Gilberto Freyre, M.E. Martinenche e José Veríssimo, pela Companhia de Leitura (Rio de Janeiro, 1944).

Um nova edição veio acontecer, em 1997, publicada sob a coordenação de José Mário Pereira (Rio de Janeiro, TopBooks), trazendo em sua abertura textos dos prefaciadores da primeira edição.

A narrativa contida do Dom João VI no Brasil vem ter sua continuidade no livro O Movimento da Independência – Aspectos da história e da cultura do Brasil que, publicado pela primeira vez em 1923, reaparece em sua sexta edição com prefácio de Evaldo Cabral de Mello (Rio de Janeiro: TopBooks, 1997. 493 p.), da qual faz a seguinte observação:

Graças as esse traquejo de história portuguesa, de história das Américas e dos arquivos diplomáticos, Oliveira Lima pôde abrir o janelão que arejou a história da nossa independência, até então à camarinha da visão estreita fluminense e imperial da emancipação brasileira. […] É significativo que dessa atmosfera ideológica que a descoberta de Tiradentes e da Inconfidência Mineira tenha sido basicamente criação da República Velha. Só com o regime de 1889 os mineiros sentiram-se à vontade para se impingirem como precursores da República após o século de boca de siri que fizeram sobre o seu ilustre protomártir, não fosse a relação comprometer ambições políticas da província, que se achavam, em última análise, na dependência de um risco sumário do lápis vigilante do bisneto de D. Maria I. É provável que sem a atmosfera descontraída da Regência, monsenhor Muniz Tavares não tivesse escrito sua história da revolução pernambucana de 1817, que aparece precisamente no umbral (1840) do Segundo Reinado para ser reeditada por Oliveira Lima quando das celebrações do centenário do movimento.

A reedição referida por Evaldo Cabral de Mello surgiu quando dos preparativos para as comemorações do primeiro centenário da Revolução de 1817, pelo Instituto Arqueológico e Geográfico Pernambucano. Inicialmente os comentários e anotações à nova edição foram entregues ao escritor Alfredo de Carvalho, mas adoecendo este gravemente vem falecer em 23 de julho de 1916, quatro dias antes de completar 46 anos, transferindo-se a tarefa para o diplomata M. de Oliveira Lima, que concorda com tal empreitada na sessão de 13 de julho de 1916 daquela instituição.

Surge assim a História da Revolução de Pernambuco em 1817, pelo Doutor Francisco Muniz Tavares, Terceira Edição, comemorativa ao Centenário do 1º Centenário – Revista e anotada por Oliveira Lima, 700 p. il. – Recife: Instituto Arqueológico e Geográfico Pernambucano, Imprensa Industrial, 1917.

A esta edição seguiu-se a de 1969, editada pelo jornalista Paulo Fernando Craveiro, para a Casa Civil do Governo do Estado de Pernambuco, com prefácio do escritor José da Costa Porto, porém ficou faltando uma publicação definitiva, com todas as anotações constantes da edição de 1917.

Historiador e diplomata brasileiro, Manuel de Oliveira Lima foi membro fundador da Academia Brasileira de Letras (1906), sócio correspondente do Instituto Arqueológico e Histórico Pernambucano, residindo em Washington (DC) desde 1918, onde exercia as funções de professor na Universidade Católica e para a qual doou depois sua biblioteca particular. São cerca de 55 mil volumes, além de mapas, manuscritos e objetos de arte. Contribuiu para o aprimoramento dos estudos históricos no Brasil, inclusive preocupando-se com a reedição de obras raras e com a pesquisa de várias fontes da história brasileira.

Manuel de Oliveira Lima vem a falecer nos Estados Unidos, em 24 de março de 1928, estando o seu corpo sepultado no Cemitério Mont Olivet (Washington) em um túmulo assinalado com a inscrição: Aqui jaz um Amigo dos Livros.

 

 

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