Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

José Domingos Brito - Memorial segunda, 02 de novembro de 2020

OS BRASILEIROS: DARCY RIBEIRO - II (CRÔNICA DE JOSÉ DOMINGOS BRITO, COLUNISTA DO ALMANAQUE RAIMUNDO FLORIANO)

 

OS BRASILEIROS: Darcy Ribeiro II

Foi autorizado pelo Governo a entrar no Brasil para extrair um pulmão, não para morar. Assim, foi recebido pelas autoridades no aeroporto; foi escoltado até a residência onde ficou e passou a ser vigiado pelo DOPS o tempo todo, onde quer que fosse. Pouco depois da cirurgia, o escritor João Antônio, na condição de repórter, foi entrevistá-lo e quase acabou sendo entrevistado. A matéria, publicada no jornal “Ex”, (nº 15, de out./1975), mostrou Darcy recuperado, exultante e perambulando pelo Rio sempre vigiado de perto por dois policiais à paisana. Passou 6 meses nessa rotina já acostumado com os vigias, mas sofrendo pressões políticas. O Governo Militar deixou que fosse operado aqui, achando que ele ia morrer. Como ficou mais vivo ainda, as pressões aumentaram e ele teve que voltar ao Peru para completar seu 3º exílio.

 

 

Ao chegar em Lima, em 1975, encontrou o presidente Alvarado enfermo, vitimado por um aneurisma e sem poder governar. Todo seu trabalho estava sendo desmontado e todos seus amigos e equipe de auxiliares haviam sido trocados. Passou uns meses vendo o que fazer, desmontou o Centro de Estudos da Participação Popular e retornou ao Brasil no ano seguinte. Mas, permaneceu pouco por aqui, ficou viajando pelo mundo “consertando” ou planejando universidades: México, Argélia, Costa Rica etc. e tornou-se romancista com o lançamento de Maíra (1976), seu primeiro romance, traduzido em diversos idiomas. Em 1977 participou da 29ª Reunião da SBPC, em São Paulo, e proferiu uma de suas melhores palestras: “Sobre o óbvio”, tratando do ensino público e que abre seu livro Ensaios insólitos, publicado em 1979. Entre as viagens realizadas, foi ao México, em 1978, a convite da UNAM-Universidad Autónoma de México, para gravar um disco “Voz Viva de América Latina”, Trata-se de um projeto de memória e fixação da voz de grandes personalidades da região. O disco nunca foi divulgado no Brasil, mas o Parlamento Latino-Americano conseguiu uma transcrição do depoimento, traduziu e publicou no livreto “Darcy Ribeiro: América Latina Nação”, em 1998. Na época eu trabalhava lá e tive o prazer coordenar a edição do livreto.

Decretada a Anistia, em 1979, foi reintegrado ao Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ e participou do “Tribunal Bertrand Russel”, em 1980 na Holanda, sobre crimes cometidos contra os índios na América Latina. Passando por Paris, recebeu o título de “doutor honoris causa” da Universidade de Sorbonne. Em seguida, uniu-se a Brizola na organização do PDT-Partido Democrático Trabalhista (PDT) e foi eleito vice-governador do Rio de Janeiro, em 1982. Acumulou o cargo com o de secretário de Ciência e Cultura e ficou encarregado de coordenar o Programa Especial de Educação, cujo objetivo era implantar 500 Centros Integrados de Educação Pública (CIEPs), uma escola em período integral para crianças e adolescentes e foi copiado em outros estados. Para isso, criou uma “Fábrica de Escolas” pré-montadas e ao final de 4 anos conseguiu implantar “apenas” 127 CIEPs. Em sua gestão foram criadas a Biblioteca Pública Estadual, Casa de Cultura Laura Alvim, Centro Infantil de Cultura de Ipanema. e o “Sambódromo”, a passarela das escolas de samba, que hoje leva seu nome, e abriga escolas de 1º e 2º grau.

Nas eleições de 1986 foi candidato à sucessão de Brizola no governo do Rio. Mas foi vencido por Moreira Franco numa ampla coligação partidária. Na ocasião o PDT foi acusado de ser conivente com o “jogo do bicho” e, por tabela com o crime organizado. A polarização esquerda x direita foi acirrada, culminando com sua derrota. Em seguida (maio de 1987) foi convidado pelo governador de Minas Gerais, Newton Cardoso (PMDB), para assumir a Secretaria de Desenvolvimento Social, com a promessa de criar mil CIEPs em todo o Estado. Porém, abandonou o cargo em setembro quando viu que o governador não levava a sério seu projeto. No ano seguinte retomou um sonho antigo: criar em Brasília o Memorial dos Povos Indígenas. Seu amigo Oscar Niemeyer projetou o edifício e o museu-centro cultural e de pesquisa da cultura indígena foi inaugurado no eixo monumental. Com se vê, Darcy foi também um grande museólogo em suas “horas vagas”. Ainda em 1987 foi convidado pelo governador de São Paulo, Orestes Quércia (PMDB), para ajudar Oscar Niemeyer na parte cultural do Memorial da América Latina, inaugurado em 1989. Mais um museu foi criado: O “Pavilhão da Criatividade” lá instalado leva seu nome.

Na primeira eleição presidencial por via direta, em 1989, após o Golpe de 1964, Brizola foi candidato e Darcy percorreu o Pais organizando grupos de intelectuais, sindicalistas e professores para elaborar o programa de governo. Novamente deu-se uma acirrada polarização ideológica entre Lula (PT) e Collor (PRN) e Brizola apoiou o PT no 2º turno das eleições. O bom senso eleitoral não prevaleceu e Collor foi eleito presidente. Nas eleições de 1990 Brizola foi reconduzido ao governo do Rio e Darcy ao senado federal, seu primeiro e único mandato legislativo. No senado priorizou a educação e conseguiu aprovar a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, lei 9394/96). A nova concede autonomia escolar em todos os níveis e diploma universitário para todos os professores, incluindo os do curso primário. Entre seus tantos projetos de lei, consta uma que se fosse aprovada, estaria resolvido o problema da falta de órgãos para transplantes nos hospitais. A Lei tornava possível usar os órgãos dos mortos para salvar os vivos. A pessoa que não quisesse doar seus órgãos deveria deixar esse desejo manifesto por escrito. Outra proposta defendia uma lei de trânsito mais favorável aos pedestres contra a selvageria dos motoristas. Preocupado com o ambiente e a memória, conseguiu o tombamento de 98 km. de belas praias e encostas, além de mais de mil casas e sobrados do Rio antigo.

Em setembro de 1991 licenciou-se do mandato para assumir a Secretaria Extraordinária de Programas Especiais do Rio de Janeiro, com a finalidade de retomar a implantação dos CIEPS e coordenar a criação da UENF-Universidade Estadual do Norte Fluminense, em Campos, concebida como um centro gerador de tecnologia avançada. Retornou ao Senado em 1992 e no ano seguinte foi conduzido à Academia Brasileira de Letras. Vaidoso assumido, discursou: “Estou certo de que alguém, neste resto de século, falará de mim, lendo uma página, página e meia. Os seguintes menos e menos. Só espero que nenhum falte ao sacro dever de enunciar meu nome. Nisto consistirá minha imortalidade”. Nas eleições presidenciais de 1994, o PDT lançou novamente a candidatura de Brizola, tendo Darcy como vice. Foi combinado entre os dois, caso vencessem as eleições, que Darcy assumiria o Ministério da Educação para implantar os CIEPs em todo o País. A disputa presidencial se deu entre Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Lula (PT), onde o primeiro venceu já no 1º turno. Em dezembro do mesmo ano, foi surpreendido com outro câncer na próstata e ficou internado por um mês no Hospital Samaritano, no Rio. Novos e mais graves perrengues lhe atormentam e planeja uma fuga do hospital com ajuda de um amigo. Foi para sua casa em Maricá e justificou a fuga pela necessidade de concluir seu livro O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil (1995), encerrando a série “Estudos de Antropologia da Civilização”. Trata-se de seu livro mais conhecido e visto como sua obra prima.

Em 1995, ao fazer 73 anos, foi surpreendido com uma grande festa num casarão do Jardim Botânico, promovida por 60 mulheres “ex-esposas, ex-namoradas, ex-amantes e amigas”. O aniversariante ficou à vontade: “Foi a festa mais bonita da minha vida. Foi uma beijação só!”. As ex-esposas Berta Ribeiro e Claudia Zarvos ficaram mais próximas. “As outras todas ficaram ao redor, mas sem ciúme. Foi uma coisa linda!”. Depois foi agraciado com uma desejada comenda: o “Prêmio Anísio Teixeira”, concedida pela Presidência da República à pessoas destacadas na área educacional. Premiações e homenagens foram constantes nessa época. No mesmo ano recebeu o “Prêmio Interamericano de Educação Andrés Bello, concedido pela OEA-Organização dos Estados Americanos. Em seguida recebeu da Biblioteca Nacional o “Prêmio Sergio Buarque de Holanda” pela publicação do livro Diários índios (1996). Em janeiro de 1997 recebeu a comenda “Homem de Ideias”, concedida pelo Jornal do Brasil. Esta foi sua última homenagem em vida, cujo título define o agraciado: um homem de ideias e ideais, falecido no mês seguinte, em 17/2/1997. Conforme seu pedido, o corpo foi encomendado pelo teólogo Leonardo Boff, padre proscrito pelo Vaticano, devido a ligações com a “Teologia da Libertação”, e seu amigo pessoal.

Darcy conviveu quase 30 anos com a morte iminente. Conforme atestam os amigos, passou desde então a viver intensamente e com urgência todos seus trabalhos, além de uma pulsão autobiográfica expressa nos livros Migo (1988), Testemunho (1990) e Confissões (1997), que escreveu “com medo-pânico de morrer antes de dizer a que vim”, confessou no prólogo e não chegou a vê-lo publicado. Esta pulsão levou-o a criar a FUNDAR-Fundação Darcy Ribeiro. “Tanta gente por aí com fundação, eu também quero uma”. Com recursos próprios, biblioteca e arquivos dele e Berta Ribeiro, foi criada no bairro de Santa Teresa, no Rio de Janeiro, em 1996. Em seguida foi concebido o Memorial Darcy Ribeiro em parceria com o Ministério da Cultura e a UnB, abrigando a biblioteca (30 mil livros) e arquivos do casal. Trata-se de uma bela edificação, “mistura de oca e disco voador”, aterrissando na praça maior da UnB, inaugurada em 2010. Como foi o criador do “sambódromo”, deu o nome de “beijódromo” ao local, para espairecer a rapaziada. Trata-se de uma “fábrica-escola” com auditório, salas de aula, gabinetes de pesquisa, galeria para exposição, cineclube, centro de documentação, café e livraria e uma representação da FUNDAR.

Darcy vem sendo lembrado em todo o País, com seu nome estampado em logradouros públicos e instituições. Em 1998, a Câmara dos Deputados instituiu o “Prêmio Darcy Ribeiro”, uma comenda anual com diploma e medalha concedida a 3 personalidades destacadas na defesa e promoção da educação brasileira. No Carnaval de 2020, foi tema-enredo da Escola de Samba Império da Uva: “Darcy Ribeiro – O Homem muito além do seu tempo!”. Biografias e ensaios biográficos transbordam na Internet, além de suas autobiografias. Mas, como vaidoso assumido, é suspeito para falar de si mesmo. Os interessados em conhecê-lo melhor podem recorrer à outras fontes, como a biografia realizada por Helena Bomeny – Darcy Ribeiro: um sociólogo indisciplinado – publicada em 2001 pela Editora da UFMG, em 2001, ou a de Toninho Vaz – Darcy Ribeiro: nomes que honram o Senado – publicada em 2005 pela Editora do Senado. Foi um dos brasileiros que mais contribuíram na busca de uma identidade nacional e latino-americana do Brasil.

Leia a primeira parte clicando aqui


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