Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Marcos Mairton - Contos, Crônicas e Cordéis domingo, 14 de agosto de 2022

OS CARCARÁS E O POMBO

OS CARCARÁS E O POMBO

Marcos Mairton

 

No dia 25 de fevereiro de 2022, uma sexta-feira, almocei com um amigo em um restaurante que fica na margem do Lago Paranoá, na Vila Planalto, em Brasília.

Lembro bem a data porque foi no dia seguinte ao início da invasão russa à Ucrânia.

Ao sair do local, testemunhei um fato da natureza que muito me impressionou.

Aconteceu em um terreno baldio, próximo ao restaurante. Havia no local algum lixo acumulado. Um bando de pombos se alimentava ali.

A rua estava praticamente sem movimento. Eu dirigia meu carro bem lentamente, quando percebi que um daqueles pombos estava com problemas. Aparentemente, ele havia pisado em um saco plástico que continha alguma substância pegajosa. Ao tentar voar novamente, arrastou o saco grudado em seu pé.

Vendo que o pombo conseguia voar apenas por alguns metros, mas acabava arrastado novamente para o chão, pelo peso do saco de lixo preso a sua perna, parei o carro e fiquei observando, como se pressentisse que algo aconteceria ali.

E aconteceu mesmo. De repente, surgiram dois carcarás.

Pela maneira como surgiram, desde o alto, voando em círculos até se aproximar do solo, parece que passavam por ali e perceberam — assim como eu percebi — a dificuldade de locomoção do pombo.

Segundos depois, um dos carcarás já estava pousado no chão, com a cabeça do pombo sob suas garras. O outro pousou em seguida. Mais alguns segundos e as duas aves de rapina já estraçalhavam o pombo com seus bicos poderosos.

Demorei ainda alguns minutos com o carro parado, assistindo àquela cena selvagem. Literalmente, selvagem, em plena paisagem urbana.

Depois, enquanto dirigia a caminho de casa, fui refletindo sobre como a nossa vida de humanos têm situações como aquela.

Porque nós, seres humanos, temos a peculiaridade de, durante milhares (talvez milhões) de anos, termos sido presas, mas depois nos tornado grandes predadores. Talvez por isso, tanto na natureza como nas relações sociais, algumas vezes nos comportemos como presas, outras vezes como predadores.

Certamente influenciado pela invasão da Rússia contra a Ucrânia – iniciada no dia anterior àquele episódio, como já referi – pensei no quanto é perigoso um país abrir mão de sua defesa militar, ficando sem condições de reagir adequadamente a um ataque externo.

Refiro-me ao acordo feito pela Ucrânia, em 1990, em razão do qual o país abriu mão das armas nucleares então instaladas em seu território, em troca de segurança e reconhecimento como país independente.

Mas também pensei no assaltante, que, tendo a certeza de que o cidadão não tem uma arma em sua residência, entra nela e anuncia o assalto, seguro de que não haverá resistência.

Nessa segunda hipótese, alguns dirão que nossa defesa cabe à polícia. Que o Estado deve prover a segurança coletiva.

Realmente. Mas, se nossa segurança compete exclusivamente à polícia, por que existem empresas de segurança armada? Deve a lei permitir a uns que contratem seguranças armados mas a outros (exatamente aqueles que não podem pagar seguranças armados) proibir a posse de uma arma de fogo?

Aqui, é preciso diferenciar a segurança pública, coletiva, do direito à autodefesa.

É evidente que o Estado deve cuidar da segurança coletiva. Mas não se deve por isso privar o cidadão de sua defesa individual. É direito de cada indivíduo defender a si mesmo. E defender outra pessoa também, conforme as circunstâncias. A Constituição Brasileira prevê o direito à vida (art. 5º, caput), enquanto o nosso Código Penal exclui do rol de condutas criminosas a conduta praticada em legítima defesa, de si e de terceiros (arts. 23 e 25).

É justo a lei reconhecer o direito de defender a própria vida, e, ao mesmo tempo, tirar do cidadão os meios para exercê-lo? Penso que não.

A esse pensamento costuma-se opor o argumento, de ordem prática, de que armas, munição e treinamento também são caros, logo, inacessíveis a boa parte da população. Mas entre os que podem contratar empresas de segurança e os que não terão condições financeiras de comprar e manter uma arma existe muita gente, não? Deve-se negar a esses o acesso a uma arma? Responder positivamente é aceitar que o direito à autodefesa seria um privilégio de pessoas ricas.

Alega-se ainda que assaltantes sempre poderão estar mais bem armados que o cidadão, além de contar com o elemento surpresa. É verdade. Mas, se formos por esse caminho, deveremos considerar que, estando o cidadão desarmado, a superioridade bélica do assaltante já não será uma dúvida, e sim uma certeza. Com tal superioridade, sequer precisará do elemento surpresa.

Dito isto, volto ao pombo cuja única defesa contra os carcarás seria voar mais rápido que eles. Sem meios para se defender, virou presa fácil de seus algozes.

Os que discordam do meu ponto de vista aproveitarão esse encerramento para lembrar que voar rápido é uma característica natural dos pombos. Ao contrário das armas de fogo, construídas pela mão humana.

Meus amigos! Facas, martelos, bicicletas e automóveis também são construídos pela mão humana, e fazem parte das nossas vidas! A única característica que diferencia esses objetos das armas de fogo é que eles apenas acidentalmente nos causam ferimentos. Já as armas de fogo são feitas para isso.

Mas é exatamente pela possibilidade de causar ferimentos que as armas têm o poder de inibir – ou mesmo interromper – ataques injustos. Às vezes isso é necessário.

Em tempo: ao mesmo tempo em que considero justo que todo cidadão tenha direito à posse de uma arma de fogo, para sua defesa, reconheço que o seu uso exige habilidade, cautela e treinamento.


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