Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Fernando Antônio Gonçalves - Sempre a Matutar segunda, 21 de maio de 2018

RELADO IMORREDOURO - OS MENINOS QUE ENGANAVAM NAZISTAS

 

 

Os livros não técnicos, eu os costumo dividir entre os deletáveis da memória e os que permanecem ao longo do tempo, sempre a estimular uma nova “espiadinha”, pelo conteúdo e pelo estilo sedutor do autor. Para quem gosta como eu de acontecimentos históricos vinculados à Segunda Guerra Mundial, indico com densa emoção um lançamento recente: Os meninos que enganavam nazistas, Joseph Joffo, São Paulo, Vestígio, 2018, 284 p. Uma narração sobre dois ainda não adolescentes, Joseph e Maurice Joffo, 10 e 12 anos respetivamente, judeus, que perambularam sozinhos por várias estradas fugindo da morte, buscando uma zona livre das atrocidades nazistas impostas pelos seguidores alemães e não alemães do assassino psicopata Adolfo Hitler, que imaginava um império de raça ariana pura por mais de mil anos.

Incentivados pelo pai judeu barbeiro, que tinha um conceituado salão num dos bairros da capital francesa, os garotos resolveram seguir os irmãos mais velhos, que já tinham partido poucos meses antes em busca da liberdade.

Antes que fosse tarde demais, o pai dos garotos, ouvindo o relato dos meninos sobre os insultos e agressões sofridos desde quando foram obrigados a usar uma estrela amarela no casaco, reuniu os dois irmãos à beira da cama e principiou uma sincera conversa de despedida: “- Não é uma conversa muito interessante e não teria fascinado vocês por muitas noites, mas vou contar o essencial. Quando era pequeno, bem menor que vocês, eu vivia da Rússia, e na Rússia havia um chefe todo-poderoso chamado tzar. Esse tzar era como os alemães de hoje, gostava de fazer a guerra e tinha imaginado o seguinte esquema: enviava emissários…” E ele complementou, depois de explicar aos meninos o que seriam emissários: “- Ele enviava emissários às cidadezinhas, e, lá, eles reuniam meninos como eu e os levavam para campos onde se tornavam soldados. Davam-lhes uniformes, ensinavam-nos a marchar, a obedecer ordens sem discutir e a matar inimigos. Então, quando atingi a idade que poderia ser pego por esse emissários, meu pai falou comigo como estou fazendo com vocês hoje… Ganhei minha vida, aos 7 anos, escapando dos russos, e podem crer que nem sempre foi fácil. Fiz de tudo um pouco. Juntei neve por um pedaço de pão com uma pá que era o dobro do meu tamanho. Encontrei pessoas boas que me ajudaram e outras que eram ruins. Aprendi a usar tesouras e me tornei cabeleireiro. Andei mundo afora. A mãe de vocês tem uma história parecida com a minha. Todo dinheiro que ganhei foi com meu suor...”

E com a voz embargada complementou: “- Vocês sabem que não podem voltar para a casa todos os dias nesse estado. Sei que sabem se defender e que não têm medo, mas precisam entender uma coisa: quando não se é mais forte, quando se é apenas dois contra 10, 20 ou 100, a verdadeira coragem é deixar o orgulho de lado e dar o fora. Vocês notaram que os alemães estão ficando cada vez mais duros com a gente. Já teve o recenseamento, o aviso no salão, as revistas, hoje a estrela amarela, amanhã seremos presos.” E concluiu, sem perder a calma aparente: “- Agora, vocês vão guardar bem o que vou lhes dizer. Vão partir esta noite. Vão pegar o trem até a estação de Austerlitz, e lá conseguirão uma passagem para Dax. Em Dax, terão de atravessar a linha. É claro, não terão documentos para passar, terão de se virar… Finalmente, precisam saber de uma coisa. Vocês são judeus, mas nunca admitam isso. Entenderam? NUNCA!

E foi então que aconteceu o último teste. O pai chamou Joseph e indagou dele se ele era judeu. Ouvindo um “não” de resposta, estapeou fortemente o rosto do menino, embora nunca tivesse batido neles antes. E esbravejou: – Não minta! Você é judeu, Joseph? E diante de uma contundente nova resposta “não”, o pai declarou emocionado, alto e bom som: “- É isso. Acho que está tudo claro agora.” E foi então que as duas crianças, Joseph e Maurice, perceberam que suas infâncias estariam terminadas daquela noite em diante.

O que se segue, peripécias mil, bondades recebidas e artimanhas arquitetadas, além de mil e uma firulas para sobrepujar as sacanagens engendradas pelos “sabidos”, torna a leitura do livro inesquecível, favorecendo a nossa convicção de uma existência de uma solidariedade universal surge de onde menos se espera, favorecendo o caminhar da humanidade para uma fraternidade que consolidará definitivamente a Criação.

Seguramente, uma autobiografia repleta de muita espontaneidade, gigantesca ternura desfricotada e um humor judaico que bem comprova a superação dos momentos mais sombrios, quando se está a exigir ponderações dos mais variados calibres, inclusive uma fé inquebrantável nos destinos redentores do Ser Humano.

Vale a pena dar uma espiadinha leitural cidadanizadora. Para melhor entender a supimpa advertência do romancista francês Victor Hugo, autor do famoso romance Os Miseráveis: “Quem poupa o lobo, sacrifica a ovelha”.

 

 

 


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