Eliane Cantanhêde, O Estado de S. Paulo
11 Junho 2017 | 03h00
Além do general Sergio Etchegoyen, foi o próprio presidente Michel Temer quem ligou para a presidente do Supremo, Cármen Lúcia, e desmentiu que tenha acionado a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para fazer uma devassa na vida do relator da Lava Jato, ministro Edson Fachin. Mal vencia a batalha do TSE, por um voto, Temer já batalhava para se defender numa guerra muito mais inglória, contra o próprio Judiciário.
O clima do poder, ou dos Poderes, é exatamente esse: de guerra. Executivo, Judiciário e Legislativo estão se armando até os dentes, tendo no vértice a Procuradoria-Geral da República, onde o momento é de transição, com a sucessão do procurador-geral Rodrigo Janot em setembro e a disputa entre correntes e modos de operar e de ver as coisas, ou a vida.
Temer tem origem no Judiciário, passou décadas no Legislativo e chegou ao posto máximo do Executivo, mas é o alvo principal das pressões e contrapressões dos três Poderes. Acuado, reage como fera ferida, com um fator fora de controle: a espionagem e a guerra de versões. Afinal, Janot pediu mesmo para Fachin instalar escuta ambiente no gabinete presidencial? Ele nega. E Temer determinou ou não a devassa da Abin na vida de Fachin? Ele também nega.
É nesse ambiente deteriorado, de meias-verdades, puras mentiras, vazamentos manipulados e aumento diário do nível de tensão, que Temer mantém o mandato, mas poderia se perguntar: vale a pena? A vitória no TSE projeta vida nova ou acirra os ânimos e abre espaço para múltiplas e desgastantes batalhas sem final feliz?
O bom dessa história é que, na semana de um julgamento histórico, em que estava em jogo o mandato do presidente, um ano depois do impeachment da primeira mulher eleita presidente do Brasil, o País real funcionou normalmente e até surpreendeu o silêncio das ruas. Com exceções esporádicas, nem se ouviu “Fora, Temer”. Se estridência houve, foi nas redes sociais.
Enquanto sete ministros, com retórica empolada e capas antiquadas, decidiam não só o futuro de um presidente e da história brasileira, o País seguia seu rumo, cumpria sua rotina. Os bancos abriram, as empresas funcionaram, os trabalhadores trabalharam, as igrejas realizaram seus cultos e os estudantes estudaram (exceto no Rio, onde o problema é outro...). Até os ladrões comuns continuaram roubando normalmente.
O País real anda sozinho, horrorizado com mensalões e petrolões, comemorando as prisões de figurões de bancos, empreiteiras, partidos e governos que desde sempre se sentiram acima do bem, do mal e das leis. Brasília está em chamas, com Executivo no alvo da Lava Jato, o Judiciário devassado pelas transmissões ao vivo e o Congresso com as vísceras expostas, mas o País segue em frente, enquanto os gestores da economia trabalham arduamente para recuperar confiança, investimentos e empregos.
É nesse clima que Temer sobreviveu ao TSE, mas não pode soltar fogos, nem curtir a sensação de alívio, nem mesmo baixar a guarda, porque novas batalhas virão. Não só de versões e contrainformação, mas com a PGR, o Supremo, a PF, o Congresso, a mídia ou o mais decisivo: Sua Excelência, o fato.
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