Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Raimundo Floriano - Perfis e Crônicas quarta, 12 de julho de 2017

UM CASCUDO ME SALVOU DA ESCURIDÃO

UM CASCUDO ME SALVOU DA ESCURIDÃO

(Publicada em 16.05.2011)

Raimundo Floriano

 

Primeira Edição, 05/1992 - 44 páginas

 

                        Isso aconteceu em 1992, conforme adiante relatarei.

 

                        Lulu Santos, o grande músico, cantor e compositor, lançou, há alguns anos, seu Método Para Guitarra, cuja propaganda na TV mostrava um garotão espancando o instrumento, na maior barulheira, quando Lulu interrompia a execução e perguntava ao jovem roqueiro se gostava de tocar. O garotão, com a maior cara de convencimento, respondia que sim, e Lulu questionava:

 

                        – Por que não aprende?

 

                        A Música e a Literatura são as duas principais Artes inventadas pelo homem, estas sob inspiração divina. Em meu entender.  Absorto na leitura e ao som de boa música, não há assunto televisivo que me desvie a atenção, seja breguice matinal, programa de auditório, filme, novela, baixaria vespertina ou futebol.

 

                        No ano passado, li 85 livros! Considerando-se que, nesse período, lancei De Balsas Para o Mundo, mantive minha coluna semanal no Jornal da Besta Fubana, li o jornal diário Correio Braziliense e, aos domingos, a revista Veja, além de atender pedidos de música, partituras e informações outras que me chegam de todo o Brasil e até do Exterior, esse número constitui-se em memorável recorde, que jamais será batido. De janeiro até agora, por exemplo, só consegui ler 19.

 

                        Como vocês podem acertadamente deduzir, escritor, comigo nada na maré mansa, com casa, comida, roupa lavado e generoso estipêndio de mesada.

 

                        A partir de janeiro de 1980, passei a anotar numa agenda os títulos que lia. Até este momento, somaram 591. Em 31 anos, a média foi de 19, mais de um e meio por mês. Leve-se em conta que em grande parte desse período eu ainda me encontrava em atividade funcional.

 

                        Esse meu afinco na leitura tinha dois objetivos: primeiro, a diversão pura e simples; segundo, a esperança de que com tantos estilos, criações e ensinamentos absorvidos, também pudesse eu, algum dia, aventurar-me, no mundo da escrita, como neste momento. E aqui me vem a imagem de Lulu Santos:

 

                        – Por que não aprendeu!

 

                        Pois é!

 

                        Ao rever a velha agenda de anotações, levei o maior susto: em 1992, eu lera apenas 1 (um) livro, ou seja, aquele ano chegou perto de se constituir em completa escuridão literária, se não fosse o bem-vindo Cascudo Mauriciano, para me salvar daquela cegueira.

 

                        Para que vocês compreendam melhor essa minha inércia na leitura, passo a explicar-lhes um pouco os motivos que a causaram.

 

                        Ao aposentar-me, em fevereiro de 1991, eu já tinha todo um projeto para o aproveitamento da ociosidade, o de colocar em ordem o imenso acervo musical que amealhara por mais de três décadas, cerca de 2.400 elepês e 900 fitas cassete. Inativo, abracei integralmente a empreitada, colossal pedreira, tudo feito em fichas, com enormes arquivos metálicos ocupando o que ainda sobrava de espaço em meu espremido apartamentucho. Na era do computador, tudo isso caberia, folgado, num disquete.

 

                        Ainda nem engrenara, e tive de voltar à atividade, atendendo a insistente pedido de amigo para chefiar o Gabinete Parlamentar de filho seu, recém-eleito Deputado Federal.  Multipliquei-me por dez, para dar conta dos recados.

 

                        Agora, cabe a vocês questionarem-me. Como foi que ainda achei tempo para a leitura de A Revolta do Cascudo, infanto-juvenil que trata da vitoriosa revolução dos peixes do Rio Una, para salvá-lo da poluição causada pelo vinhoto despejado em suas águas? Mistério! Tchan-tchan-tchan-tchan!

 

                        Satisfarei a curiosidade de todos.

 

                        No dia 08.04.11, no JBF, o autor, Maurício Melo Junior, em sua coluna Canto do Arribado, publicou matéria com o título Aventuras de Um Quase Sacerdote Voluntário, da qual pincei o que adiante transcrevo:

 

Por esta época conheci Luiz Berto, que ainda não era Papa – vejam como essa história é antiga. A verdade é que desandamos a falar de literatura e até hoje este é o nosso assunto. Ele, junto com um bando de outros irresponsáveis (Orlando Tejo entre eles), apadrinhou meu casamento com a morena que ficou encantada com a minha conversa sobre o colombiano.”

 

                        A época referida por Maurício gira em torno de 1984, quando ele, Orlando Tejo, Luiz Berto e eu formávamos uma quase inseparável quadrilha, uns encambados nos outros. Viamo-nos todos os dias no Congresso Nacional e, nos finais de semana, reuníamo-nos na casa, ora de um, ora de outro, em regabofes tocados a comida, cerveja, refrigerante, cachaça e muita conversa furada.

 

                        E por que o Maurício não me citou, mesmo entre parênteses? – inquirirão vocês novamente. Mistério! Tchan-tchan-tchan-tchan!

 

                        Foi num tempo em que estávamos mergulhados na Literatura, na Cultura em geral, de ponta-cabeça. Orlando Tejo, nacionalmente consagrado com sua obra-prima, Zé Limeira, o Poeta do Absurdo, era nosso guru; Luiz Berto, já firme no mercado editorial, lançava o depois premiadíssimo O Romance da Besta Fubana, que lhe proporcionou até viagens aos Estados Unidos e ao Canadá; Maurício, o mais novo de nós, iniciava sua gloriosa carreira como escritor, cronista e crítico literário. E eu, quem era? E eu quem era? Pois bem, ou lhes direi. Andava com eles porque os admirada, e, devido a carregar sempre um livro comigo e usar óculos, o trio achou-me alguma parecença com um intelectual qualquer e me deu a função de revisar seus trabalhos. Sendo assim, eu não contava. Literalmente, porque não escrevia porra alguma, e numericamente, porque revisor, eruditamente falando, é gente de segunda classe, de casta inferior, come na cozinha, das panelas, jamais na sala, das terrinas dos maiorais.

 

                        E como foi, então, que você encontrou uma brechinha de tempo para ler o Cascudo? E qual o argumento usado pelo Maurício para conseguir tal exceção? Hão de perguntar-me! Sem piscar, respondo-lhes! Prevaleceu no fragor dos acontecimentos, um componente maior, por vezes já não muito valorizado nos dias atuais: a amizade!

 

                        Estávamos em 1992. Maurício procurou-me no meu Gabinete do Anexo IV da Câmara dos Deputados para dar uma vasculhada nos originais do Cascudo. Não se configurava isso em revisão, pois ele, já escritor famoso, produzia para editora fixa, a Bagaço, cujos funcionários se encarregariam do texto para colocá-lo em condições de ir ao prelo. Por conseguinte, meu nome nem saiu nos créditos, conforme acontecera em livros anteriores de Maurício nos anos 1980.

 

                        Afortunadamente, o Cascudo me salvou de duas escuridões, a literária, porque não passei o ano de 1992 na cegueira absoluta, e a intelectual, eis que, ao terminar a vasculhada, descobri-me incapaz de revisar qualquer tipo de texto, por menor que fosse, um selo sequer. E danei-me a estudar Gramática, particularmente a análise sintática, e, nesta, o período composto, no qual eu me considerava em extrema penúria. Pronto, lá vem o Lulu Santos de novo, pra cortar meu barato:

 

                        – E por que não aprendeu?

 


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