Almanaque Raimundo Floriano
(Cultural, sem fins comerciais, lucrativos ou financeiros)


Raimundo Floriano de Albuquerque e Silva, Editor deste Almanaque, também conhecido como Velho Fulô, Palhaço Seu Mundinho e Mundico Trazendowski, nascido em Balsas , Maranhão, a 3 de julho de 1936, Católico Apostólico Romano, Contador, Oficial da Reserva do Exército Brasileiro, Funcionário Público aposentado da Câmara dos Deputados, Titular da Cadeira nº 10 da Academia Passa Disco da Música Nordestina, cuja patrona é a cantora Elba Ramalho, Mestre e Fundador da Banda da Capital Federal, Pesquisador da MPB, especializado em Velha Guarda, Música Militar, Carnaval e Forró, Cardeal Fundador da Igreja Sertaneja, Pioneiro de Brasília, Xerife nos Mares do Caribe, Cordelista e Glosador, Amigo do Rio das Balsas, Inventor da Descida de Boia, em julho de 1952, Amigo da Fanfarra do 1° RCG, autor dos livros O Acordo PDS/PTB, coletânea de charges, Sinais de Revisão e Regras de Pontuação, normativo, Do Jumento ao Parlamento, com episódios da vida real, De Balsas para o Mundo, centrado na navegação fluvial Balsas/Oceano Atlântico, Pétalas do Rosa, saga da Família Albuquerque e Silva, Memorial Balsense, dedicado à história de sua terra natal, e Caindo na Gandaia, humorístico apimentado, é casado, tem quatro filhos, uma nora, um genro e dois netos e reside em Brasília, Distrito Federal, desde dezembro de 1960.

Leonardo Dantas - Esquina quinta, 13 de dezembro de 2018

VEGETAIS EXÓTICOS DE PERNAMBUCO

 

 

Os jardins das ordens religiosas serviram para aclimatação de vegetais exóticos, transplantados do Oriente, da África e da própria Europa, que, depois de adaptados, passaram a dar um novo colorido à paisagem pernambucana, a exemplo do coqueiro, da bananeira, da cana-de-açúcar e de tantas outras espécies que aqui vieram misturar-se com a nossa flora nativa.

 

 

Mangueiras, coqueiros,
cajueiros em flor,
cajueiros com frutos
já bons de chupar…

Mangabas maduras,
mamões amarelos,
que amostram, molengos,
as mamas macias
pra gente mamar…

É o colorido da flora pernambucana, nos versos do poeta Ascenso Ferreira, in Trem de Alagoas, onde se misturam vegetais nativos (mangabas, cajus) com outros exóticos (mangas, mamões).

Na sua Relação das Praças Fortes do Brasil, em manuscrito datado de 1609, Diogo de Campos Moreno, assim descreve a paisagem em torno da Vila de Olinda:

Esta terra, junto a sua povoação, não tem boas águas. As melhores que bebem vêm de longe e por uma levada de uma légua se trouxe à vila com grande despesa. O rio [….] Beberibe com as invernadas de todo modo se desbarata, no inverno com cheias e no verão por mal limpo e sempre a água falta; contudo ao redor da vila não faltam umidades de fontes grossas e que criam muitas hortas de boa hortaliça e todas as sortes de frutos de espinho e das cousas do Reino, melões, pepinos, abóboras e outros legumes de toda a sorte e muito. Nela se criam e dão também toda a sorte de gados miúdos e grossos e de toda a criação de aves domésticas, de maneira que sendo Pernambuco uma escala tão grande de tantas gentes forasteiras que comem e não criam e que para o mar levam tantas cantidades, nunca falta nada do que se busca, mais ou menos caro conforme ao tempo.

A levada de uma légua a que se refere o cronista foi obra do governador-geral Diogo Botelho, ao tempo em que residia em Olinda (1602–03), estando consignada no mapa desenhado por Cornelis Sebastianszoon Golijath, cartógrafo do conde João Maurício de Nassau, em 1648.

 

Ainda no início do século XVII merece destaque a descrição de um companheiro de Daniel de la Touche, Monsieur de la Ravardière, que esteve em Pernambuco entre os meses de maio e julho de 1616, após a capitulação do Maranhão. Após sua curta temporada em Pernambuco, La Ravardière foi embarcado para Lisboa, onde esteve preso até meados de 1619. As observações desse cronista anônimo integram o “Discurso sobre o tema da tomada de Pernambuco, dedicado aos Senhores Diretores da Companhia Ocidental”. Esta “Memória”, sem assinatura ou data, foi publicada no tomo XVI do Mercure François, ou Suite de l’Histoire de nostre temps sous le Regne dus Très Catholique Roy de France et de Navarre Louys XIII, editada em Paris por Etienne Richer em 1632, p. 492–505.

Referindo-se a Pernambuco, o memorialista faz, dentre outras, a seguinte observação:

…Ali, produz-se sempre as cousas necessárias à vida e num clima tão igual que nem os habitantes nem os estrangeiros recebem qualquer injúria do tempo, deleitando-se com o gozo da doçura e bondade do ar e com a contemplação da variedade do que a natureza produz, fato tão digno de admiração quanto agradável de narrar. Mas o que faz as cousas mais agradáveis é que agora se encontra comumente no país o que lhe era exótico no passado. Pois que a curiosidade dos portugueses, querendo todas as cousas na medida do seu gosto, levou-os a transferir para ali muitas plantas estrangeiras, tanto da Europa quanto da África; assim o trigo e a cevada desenvolvem-se muito bem e em grande abundância do Rio de Janeiro até São Vicente. As laranjas e os limões de diversas espécies são tão vulgares por todo o país, que são encontrados comumente nas matas, ultrapassando em bondade os de Portugal; os figos, as uvas e as romãs dão duas novidades por ano. As uvas são encontradas tão-somente nos pomares, pois há proibição expressa de fabricação de vinho, para não estorvar o que vem das Canárias, que é ordinariamente vendido em todo aquele país. Há, ainda, tâmaras tão boas quanto as de África, também em pomares particulares, como o dos Jesuítas de Pernambuco. Os melões frutificam todos os meses e os marmelos aí crescem naturalmente. Quanto aos frutos do país, há grande abundância deles, muito diversos dos nossos. Cultivam ordinariamente a mangaba, que é um fruto quase semelhante ao pêssego, mas sem o caroço, tendo somente algumas pequenas sementes achatadas; há, também, morguoyapero, maracujás, ananás, araticuns, todos frutos excelentes, mas a mangaba excede a todos em bondade .

Quanto aos legumes e hortaliças há couves e a beldoroega, que são comuns, as ervilhas, os feijões, as batatas [peittetes] e as abóboras de diversas espécies nos seus pomares. Como pão ordinário dispõem do milho graúdo e de uma raiz, da qual fazem a farinha, chamada de Mandioca, base e principal alimento dos índios, sem dúvida muito boa e bem sadia para comer. Tem, ainda, a árvore chamada do Caju, com o qual fazem uma espécie de vinho, muito bom, e, em certos lugares, a árvore que produz os cocos, que eu creio foi trazida de África.

Toda a costa do mar é muito piscosa, como o são também todos os rios, que produzem excelentes peixes. O peixe-boi é muito comum, principalmente para os lados do Maranhão, no rio que ali existe. Muita caça há por toda a parte, veados e javalis andam aos bandos; o javali é semelhante ao nosso, exceto que o daquele país tem um umbigo no dorso. Enfim, esta é uma terra onde não se pode morrer de fome.

O pomar sobre o qual se referia o memorialista anônimo era o do Colégio da Companhia de Jesus em Olinda, sobre o qual fizera observações o padre Fernão Cardim, em 1584, quando aqui esteve: “…é o melhor e mais alegre que vi no Brasil, se estivera em Portugal também se chamara jardim”.
O memorialista, ao que parece, também conheceu a Quinta da Madalena (1615), nas proximidades de Olinda, onde os padres cultivavam mangabeiras.

Também os franciscanos de Olinda tinham aqui o seu jardim que, a exemplo do que dispusera o Rei D. João II em Évora (1494), emendava com a horta e o pomar, já cultivados nos fins do século XVI pelo Frei Pedrinho (Frei Pedro de Mealhada). No final do século XVII, outro franciscano, Frei Antônio do Rosário (1647–1704), com base nas observações feitas em Pernambuco, escreveu no Convento Franciscano de Nossa Senhora das Neves de Olinda o livro Frutas do Brasil numa nova e ascética monarquia, publicado em Lisboa em 1702, no qual relaciona 36 árvores de frutos aqui cultivadas, algumas delas exóticas, mas perfeitamente aclimatadas.

No período holandês, o conde João Maurício de Nassau fez plantar no Recife, em 1642, um grande jardim recreio, que era também um pomar e dispunha de alguns animais vindos das mais diferentes partes. O jardim veio a servir de “laboratório” a membros de sua comitiva, notadamente o médico Willem Piso (1611–1678), o botânico, também cartógrafo e astrônomo, George Marcgrave (1610–1644) e o artista Albert Eckhout (c1610- c 1664). Os dois primeiros são autores da Historia naturalis Brasiliae etc., impressa em Amsterdam em 1648, na qual são publicados 429 desenhos, em grande parte retratando a flora e a fauna, bem como nativos, do Nordeste do Brasil.

De Albert Eckhout são a maioria dos desenhos reunidos nos quatro volumes que compõem o Theatrum Rerum Naturalium Brasiliae. Coleção de desenhos policromados, em sua maioria, de autoria dos artistas da comitiva do conde João Maurício de Nassau, enfocando elementos de história natural, atualmente encontrados na Biblioteca Jagelônica de Cracóvia (Polônia), ainda não publicados em sua totalidade. O conjunto é formado por 417 desenhos, em sua maioria aquarelados, retratando animais aquáticos, aves, mamíferos, répteis, insetos, aranhas, plantas, flores, frutos e catorze figuras humanas.

Aos quatro volumes do Theatrum, sob os títulos, Icones Aquatilium, Icones Volatilium, Icones Animalium e Icones Vegetabilium, somam-se dois outros, conhecidos como “Manuais”, com desenhos (peixes, aves, animais) atribuídos a George Marcgrave, e um terceiro, Miscellanea Cleyeri, com seus desenhos (pessoas, animais, aves e plantas) atribuídos a Albert Eckhout. Sobre o tema Petronella Albertin publicou sua tese de mestrado em História da Arte, apresentada junto à Vrije Universiteit Amsterdam (1981), sob o título: “Arte e Ciência no Brasil Holandês. Theatri Rerum Naturalium Brasiliae: Um estudo dos desenhos”.

Na descrição de um contemporâneo, Frei Manuel Calado, in O Valeroso Lucideno, publicado em Lisboa em 1648,

No o meio daquele areal estéril, e infrutuoso plantou um jardim, e todas as castas de árvores de fruto que se dão no Brasil, e ainda muitas que lhe vinham de diferentes partes, e a força de muita outra terra frutífera, trazida de fora e barcas rasteiras, e muita soma de esterco, fez o sítio tão bem acondicionado como a melhor terra frutífera; pôs neste jardim dois mil coqueiros, trazendo-os ali de outros lugares, porque os pedia aos moradores, e eles lh’os mandavam trazer em carros, e deles fez umas carreiras compridas, e vistosas, a modo da alameda de Aranjués e por outras partes muitos parreirais e tabuleiros de hortaliças e de flores, com algumas casas de jogos, e entretenimentos, aonde iriam as damas, e seus afeiçoados a passar as festas no verão, e a ter seus regalos, e fazer suas merendas, e beberetes, como se usa em Holanda, com seus acordes instrumentos ( … ). Também ali trazia todas as castas de aves, e animais que pôde achar, e como os moradores da terra que lhe conheceram a condição e o apetite, cada um lhe trazia a ave ou o animal esquisito que podia achar no sertão, ali trazia os papagaios, as araras, os jacis, os canindés, os jabutis, os mutuns, as galinhas de Guiné, os patos, os cisnes, os pavões, os perus e galinhas grande número, tantas pombas, que não se podia contar, ali tinha os tigres, a onça, a suçuarana, o tamanduá, o búgio, o quati, o sagüim, o apeteá, as cabras do Cabo Verde, os carneiros de Angola, a cutia, a paca, a anta, o porco javali, grande multidão de coelhos, e finalmente não havia coisa curiosa no Brasil que ali não tivesse, porque os moradores lh’as mandavam de boa vontade.

A partir da segunda metade do século XVII, foram introduzidos no Brasil alguns vegetais exóticos transplantados do Oriente.

É conhecida a Ordem Régia de 1677 determinando ao Vice-Rei da Índia a remessa para o Brasil de plantas, estacas e sementes, de canela, cravo, pimenta, noz-moscada e gengibre, dada ao conhecimento ao governador de Pernambuco, Aires de Souza Castro, em 1678. Com esses vegetais vieram as mangueiras e as jaqueiras, em 1682, seguindo-se de outras plantas hoje integradas à nossa paisagem. Em 1797 e 1798, o Conde de Linhares, D. Rodrigo de Souza Coutinho, ministro português, empenhava-se na introdução de novos vegetais, que contribuíssem para o desenvolvimento da agricultura, recomendando estabelecer, com a menor despesa possível, um Jardim Botânico em que se cultivassem plantas “assim indígenas como exóticas”, segundo assinala José Antônio Gonsalves de Mello.

Entretanto, somente em 1811 viria esse Jardim Botânico a ser estabelecido, quando para aqui veio encaminhada grande quantidade de vegetais recolhidos da Guiana Francesa, que o governo português conquistara como represália à invasão de Portugal pelas tropas de Napoleão.

Do jardim daquela possessão, chamada de “La Gabrielle”, vieram para Pernambuco e foram plantadas em Olinda variedades de plantas, algumas já aqui existentes, como a caneleira, a pimenteira, o girofleiro, e outras desconhecidas, como a fruta-pão, a caramboleira, o sapotizeiro, a pinheira, a groselheira da Índia, a nogueira de Bancur, a cássia amarga, a jalapa.

O Jardim Botânico de Olinda teve importante papel na divulgação desses vegetais e de outros que nele foram sendo introduzidos desde 1811, quando ele teve início. Em 1817 Tollenare viu aí mudas de cacau e cana-de-açúcar de Caiena (ou caiana, como é vulgarmente conhecida). Sem referência específica de quando foram plantados no Jardim, consta contudo em 1839 e 1840 que já ali eram distribuídas mudas de palmeira-real, cipreste, chá-da-Índia, fruta-pão, de massa e de caroço (este último difícil hoje de se encontrar), e outras. Dessa distribuição beneficiaram-se muitos sítios recifenses e propriedades rurais diversas de Pernambuco (…) – além das mudas remetidas para outras províncias brasileiras e para fora do Brasil.

Nesse Jardim funcionou um curso de Botânica e de Agricultura (1829), do qual era professor o cirurgião pernambucano Joaquim Jerônimo Serpa, no qual se inscreveriam muitos estudantes do Curso Jurídico de Olinda.

Em 1845 foi ele mandado extinguir, sendo o seu terreno a princípio alugado e mais tarde vendido.

A importância do Jardim Botânico de Olinda foi depois ressaltada por Filipe Mena Calado da Fonseca que, em carta ao Diario de Pernambuco, publicada na edição de 7 de novembro de 1854, chama a atenção para a divulgação entre nós da “grama de Angola”, popularmente conhecida como “capim de planta”, que fora transportada das margens do Rio Bango (Angola) para o Brasil em 1811. Além desta, outras espécies foram vulgarizadas entre nós, como a pimenta da Índia, o fruta-pão, a tamareira, o bilimbi, a carambola, o sagu, o sapoti, dentre outras.

Ainda sobre a importância dos jardins de aclimatação, vale lembrar a publicação do naturalista Manuel Arruda da Câmara (c 1752–1811), Discurso sobre a utilidade de jardins nas principais Províncias do Brasil (Rio de Janeiro: Impressão Régia, 1810).

Em sua publicação Arruda da Câmara apresenta uma “lista das plantas que merecem ser transplantadas e cultivadas”. Da Ásia: árvore do pão, salepo, sagu, chá, sene, ruibarbo, escamônea, batatas do Japão, gota gama, loureiro, cássia, verniz da China, verniz do Japão, Khola buu, peônia, évano, bambu, árvore das camisas, sangue de dragão, santalino, árvore do sebo, laca. Da África: baobá, tamareira, matiboeira, pau escarlate, tacula, canume-nume, imbondeiro, agraiá, grama de Guiné [destinada à alimentação do gado na zona do semi-árido]. Da Europa: oliveira, castanheiro, nogueira, pinheiro, pinheiro manso, morangos, ameixeiras, damasqueiro ou abricó, cerejeira, ruiva dos tintureiros, rapa língua, didadeira, malva, verbasco. Da América Sententrional: falva cássia, magnólia maior, árvore da cera, palmeira real. Do México: jalapa. Da Nova Holanda (Guiana Holandesa): mahogani [eucalipto]. De Caiena: árvore do pão, cravo da Índia, pimenta Zeilônica, noz moscada. Do Pará e Maranhão: cravo do Maranhão, castanhas do Maranhão, pixurim, abacate, bacuri, bacaba, abacaxi [bromélia cultivada pelo autor em Goiana-PE e difundida por todo Brasil], maracujá-mamão. Do Ceará: piqui, buriti, maracujá-suspiro, mandapuçá, coco naia, mamangaba. De Pernambuco: carapitaia, bilros, canela do mato, catinga branca, carnaúba ou carnaíba, anil de Pernambuco, anil trepador, erva lombrigueira ou arapabaca, urucu, pitombeira, macaíba ou macaúba, imbuzeiro, piranga, caroá, caroatá, umari, ipepacuanha preta, ipepacuanha branca, contra-erva, contra-erva de folha longana, angelim, batata de Purga, papo de peru, parreira brava ou abutua, mangabeira, oiti coroia [coró], oiti da praia, oiticica ou catingueira, gengiroba ou andiroba, caroba, caroba miúda ou casco de cavalo, barbatimão, almécega.


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